2. Mel

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É sexta-feira. O dia da minha exposição. O meu dia. E cá estou eu, em frente a clínica em que minha irmã está internada. Visitar Sarah é sempre exaustivo. Não me faz bem. Sempre saio péssima após esses encontros. Mas ela é minha irmã e eu não posso abandoná-la. Nosso relacionamento nunca foi bom e só se deteriorou com o tempo. Respiro profundamente para encontrar coragem e entro na clínica.

A clínica fica no subúrbio de Nova York. O local é agradável. Um campo aberto com algumas árvores e um lago artificial no centro. É dia de visitas e os pacientes estão na área externa, mas Sarah nunca está ali. Ela sempre está em seu quarto.

Cumprimento algumas pessoas no percurso até o quarto de Sarah. Abro a porta devagar e ela está, como sempre, numa cadeira em frente à janela com seu olhar perdido.

- Bom dia, Sarah. - já chego expansiva e com meu melhor sorriso, mas ela apenas me olha de soslaio e volta seu olhar para a janela. - Trouxe coisas deliciosas pra você. - continuo e vou em direção a pequena mesa de seu quarto. - Olha só. Tiramisu, seu doce preferido. - tiro a torta da sacola, mas ela nem se digna a olhar. - Tem também aquele doce de mel que você ama. - puxo uma cadeira e me sento ao seu lado. - Sabe, hoje é minha exposição. Lembra que eu te falei sobre aquela galeria em Manhattan que me convidou pra expor meus trabalhos lá? - ela não esboça nada, mas não me deixo abater, prossigo. - Estou tão feliz. Pena que nem o tio nem você poderão estar lá. Sinto tanta falta dos nossos pais, Sarah. Tenho certeza que eles estariam tão orgulhosos de mim. - falo melancolicamente. - Como você está, Sarah? - enfim ela me olha, mas seus olhos são tão frios que arrepiam até minha alma.

- Você vai fazer o que eu pedi? - a voz é igualmente fria.

- Não, Sarah. - digo após um suspiro.

- Então eu não sei o que você vem fazer aqui. - ela diz com raiva.

- Eu sou sua irmã, Sarah e eu amo você.

- Se me amasse de verdade faria o que estou pedindo há meses.- sua raiva continua transbordando por sua alma atormentada.

- Você tem que esquecer o que passou, Sarah. Isso não te faz bem. Você não quer sair daqui? - ela não fala nada. - Então, minha irmã. Para o seu próprio bem esqueça o que passou e siga em frente.

De repente ela dá um sorriso cínico, maldoso e eu sei que ela vai me ofender.

- Desculpe, pequena Melody. - ela fala com o desdém de quando falava quando éramos adolescentes. - Desculpe pedir algo que você jamais conseguiria, não é mesmo? Olhe pra você, se conhece melhor que eu. Você não é bonita como eu, jamais conseguiria seduzir um homem e deixá-lo aos seus pés. - sempre as mesmas palavras. - Mas não se preocupe, eu vou conseguir me vingar dele. - seus olhos se tornam mais vis. - De qualquer jeito. Eu não preciso de você. Nunca precisei, não é? Não é agora que vou querer ajuda de uma insipida como você.

Eu me levanto devagar e ela volta a olhar pela janela.

- Bem, eu já vou. - digo como se o que ela falou não me afetasse em nada. - Já está tarde e eu preciso chegar cedo à galeria.

Pego minha bolsa que deixei na mesa e coloco no ombro.

- Tchau, Sarah. Até próxima sexta.

- Não precisa voltar se não for fazer o que pedi a você. - fala sem ao menos me olhar.

Resignada, saio daquele quarto pior do que cheguei ali.

A tarde passa lentamente, acho que devido a minha ansiedade. Sempre expus meus trabalhos, mas nunca numa renomada galeria. A exposição está marcada para as dezoito horas e eu chego lá bem antes disso. Estou vestindo um vestido preto de magas longas e que vai até os joelhos. É sóbrio, mas que adere ao meu corpo com perfeição. Em meus pés saltos altos que matariam qualquer mulher, inclusive eu. Mas era a minha noite e eu me permiti. Deixei meus longos cabelos escuros soltos e fiz uma maquiagem leve.

Amor em chamas (EM hiato)Onde histórias criam vida. Descubra agora