O conto da Supernova (e-book à venda na Amazon)

Sussurro

Na manhã seguinte estavam todos diante da Biblioteca. Todos os habitantes da ilha de Creta. Não havia proibição para presença de civis durante a cerimônia que aconteceria. O papiro com o relato seria apresentado a todos depois que o óleo da árvore mais sagrada daquele povo rompesse o lacre que guardava todas as palavras que lá estão escritas.

Um sol brilha para todos, sem distinção, e por isso após a quebra do selo o que estava ali em palavras solares chegaria ao conhecimento de todos em forma de livro.Não havia lei ou tradição que impusesse isso, era apenas o correto e o justo a ser feito.

Estavam todos ali diante da escadaria branca de Creta aguardando a hora exata que tudo teria início. Quando o sol daquele mundo atingiu o zênite, que é o ápice de sua posição no céu, seguindo o que havia de maior tradição de desvelamento de pergaminhos de estrelas, iniciou-se a preparação do lacre. Sofia, a mais importante anciã de todos os sábios, em uma vestimenta branca com fios dourados, trouxe em suas mãos um jarro de cerâmica branca com desenhos gregos em alto relevo. Era nele que repousava o azeite de oliveira especialmente preparado para a ocasião e que banha todo o papiro de estrela para que o lacre que o guarda seja quebrado, dando acesso à escrita que mora ali. Mas para o papiro que guarda o relato de um sol o procedimento era um pouco diferente: para quebrar seu selo bastava apenas um pingo do azeite. Um sol não pede por grandes formalidades.

Aurora acompanhou cada passo daquela cerimônia com muita atenção. Desde o momento que Sofia saiu por entre uma das pilastras no topo da escada branca até o início do equilibrar da gota solitário do óleo de oliveira lembrou dos momentos em que passava pelo hall de entrada da biblioteca e parava diante do papiro para observar o lacre com a letra helênica, Ω. Ela era apenas uma das pessoas que se perguntavam o significado da daquele símbolo no lacre.

Finalmente saberei o que significa esse Ω. Não aguento mais carregar tanta curiosidade.

O pensamento de Aurora tinha um fundamento: a quebra do selo revela o significado da letra que o guarda. Mas tudo tem uma exceção.

A gota do óleo toca o lacre e o pergaminho todo entra em combustão, tendo inicialmente algo que lembrava uma pequena explosão, e o fogo aumentava cada vez mais, criando uma gigantesca bola de fogo que queimava mas não causava calor. O brilho intenso quase cegou Aurora que, no meio da multidão, estava olhando fixamente para o papiro aguardando ansiosa pela revelação da letra Ω.

Os sábios esperavam por isso. O tutor de Aurora a procurou no meio na multidão com os olhos, mas tudo que sua visão alcançava o brilho incandescente do papiro.

Os segundos daquela combustão pareciam eternos. Havia uma noção de tempo diferente trazida pela quebra daquele selo e, diante da combustão, toda a ilha de Creta foipara um tempo fora da roda do tempo.

Aurora viu quando o papiro flamejou, e logo seus ouvidos receberam o som dos primórdios do universo: era como ouvir o mundo começando, nascendo, rasgando asas e preparando-se para voar. Levou as mãos às orelhas para proteger-se do som, sem obter êxito. Podia ouvi-lo mesmo assim e ele a rasgava por dentro.

Sentiu o coração subir à garganta, enquanto o mais importante papiro da história dos escribas dos homens abria-se para a revelação. Por um segundo acreditou que estaria a beira da morte devido o nível do acelerar de seus batimentos cardíacos.

Aos poucos, o papiro foi deixando de arder, seu fogo diminuindo na mesma proporção em que a pupila de Aurora acostumava-se às chamas.

O próprio ambiente pareceu começar a engolir o som de combustão, como uma mãe a acolher um recém-nascido em seus braços e essa mãe mostrou-se em um sol prateado que girou em si mesma antes de partir. E ali, naquele mesmo momento em que tudo se foi, o som mais aguardado por toda a Alocse reverberou juntamente com o som de algo pesado caindo no chão do púlpito.