"Não estou inválido Emmaline"

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“Eu tenho cancro :( “

O meu olhar arregalou-se perante aquela mensagem. Era nestas alturas que gostava de falar e repreender o senhor que se encontrava ao meu lado. Senhor? Sim, eu tratava-o por Mr. Hemmings mas, na verdade, se ele não fosse meu professor, diria que ele era um estudante universitário.

“Tem cancro e continua a fumar? Quer morrer Mr. Hemmings? É isso que me quer dizer?”

“Não Emmaline. Sabe… a morte não me assusta. Nós todos vamos morrer e a vida é só um intervalo entre a nascença e a morte.”

“Há quanto tempo? Vai morrer? Já está a efectuar os tratamentos?”

“Nunca pensei que a menina fosse tão curiosa. Mas bem, diagnosticaram-me cancro dias depois de ter conseguido entrar aqui no reformatório. Eu sabia que se dissesse à directora que estava doente, eu não conseguiria este emprego e tinha de ficar dias e dias a fio deitado numa cama. Sim, eu já iniciei os tratamentos e não Emmaline, eu não vou morrer.”

“E não Emmaline, eu não vou morrer”. Aquelas palavras tinham-me marcado bastante. Mr. Hemmings pode ser meu professor mas, não deixa de ser um ser humano com sentimentos e não merece estar a passar por isto tudo sozinho.

“Acho que não devia estar aqui.”

“Porquê?”

“Trabalha demasiado, para uma pessoa com cancro.”

“Não estou inválido Emmaline”

Sim – Revirei os meus olhos de tonalidade acastanhada e acabei por deixar escapar um pequeno riso- Eu sei disso mas, devia estar em casa. Com a sua família.”

Fixei o meu olhar na figura masculina que rapidamente ficou tensa e a sua expressão passou de descontraída para fria. Distante. O que me assustava, profundamente. Ele levantou-se frustradamente e começou a caminhar em direcção ao interior. Eu queria gritar. Gritar por ele e pedir-lhe que me contasse o que se passava mas… era impossível. Levantei me num movimento rápido e ainda consegui alcançar o seu braço mas ele simplesmente ignorou e como a sua força era maior que a minha, a minha mão foi obrigada a largar o seu braço e o meu campo de visão limitou se a observar um copo caminhar pelo extenso corredor, sem pronunciar uma única palavra. Eu sentia-me tão triste. Tão mal. Tinha acabado de tocar numa das feridas, para não dizer a maior ferida, do meu professor de Literatura. Com isto tudo, tinha perdido toda a vontade de dormir e por isso, decidi subir até à biblioteca. Subi os degraus silenciosamente e aproximei-me da porta aberta entrando mais tarde na grande divisão rodeada de estantes e mesas, com livros de todos os tipos e feitios. Dirigi me à estante do drama e peguei em três, quatro livros transportando-os comigo até uma mesa. Pousei os livros em cima da superfície castanha escura já com algumas marcas e sentei me numa cadeira. Abri o livro e comecei a folhear o mesmo, rendendo-me aos encantos de todas aquelas histórias passando assim a minha noite.

****

“Menina Emmaline, acorde!”

Revirei os olhos rapidamente após sentir o meu corpo ser abanado.

“Acorde!”

Mrs. Marie voltou a repetir mas, desta vez num tom de voz mais elevado e tive então de me levantar. Observei cuidadosamente o espaço que me rodeava e estava… Na biblioteca? Sim, isso mesmo. Tinha adormecido em cima de todos aqueles livros a noite passada. O meu olhar foi focado no relógio que transportava comigo no pulso esquerdo desde a noite passada e rapidamente entrei “em pânico” visto que o relógio marcava as 8.15pm. As minhas aulas começavam às 8.00pm mas, todos os professores davam obrigatoriamente 20 minutos de tolerância e se não me despachasse, eu iria no final das aulas ter uma conversa com a directora. Corri então até ao meu quarto e só tive tempo de pegar na pasta já pronta para o dia de hoje, e apanhei o meu cabelo num coque, muito longe de ser perfeito. Andei em passo apressados até à sala onde iria ter a minha aula de Biologia e após bater à porta e ter a permissão para me entrar engasgo-me com a minha própria saliva ao ver Mr. Hemmings à minha frente com um caderno e uma esferográfica e o manual de Biologia. Sentei me no meu lugar habitual e copiei as indicações que estavam no quadro enquanto as outras raparigas se dirigiam ao exterior visto que hoje íamos analisar plantas no jardim. Após ter tudo copiado, coloquei o estojo e o caderno contra o peito e dirigi-me à saída indo mais tarde para o jardim.

***

Mais uma manhã de aulas completa. Saí do laboratório calmamente e dirigi me ao piso superior para ir ao meu cacifo. Abro a pequena porta e reparo que na mesma está um bilhete e um malmequer. Peguei cuidadosamente no envelope e levei o malmequer ao nariz inalando o seu perfume. Provavelmente era uma carta da minha mãe.

Angel || l.h.Onde histórias criam vida. Descubra agora