Capítulo I

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Barreiras, Oeste da Bahia, Brasil, 2010.

 

I

Naquela manhã os corpos encontrados chamavam a atenção. Dois homens foram atacados — aparentemente — por algum animal de grande porte. A análise preliminar, feita por quem chegou primeiro ao local, indicava que houve alguns disparos, mas de nada adiantou para deter o assassino, que os atacou com brutalidade, matando-os com golpes mortais, estripando-os e mutilando-os.

A polícia examinou o local antes, durante e após isolá-lo.

Descobriu-se os pedaços espalhados das vítimas, dois ladrões que há um bom tempo davam um trabalho para serem capturados. Era uma cena horrível de ser ver: braços, pernas, cabeças, vísceras, roupas rasgadas e ensaguentadas, tudo distribuído pelo perímetro de maneira macabra, atestando a barbaridade do ataque.

Foram encontradas pegadas de um animal de porte avantajado, contudo de espécie desconhecida. Assemelhava-se com as patas de um cão, embora possuísse um tamanho que mais lembrava as de um felino de grande porte, como uma onça. Claro que logo o mistério se intensificou quando fora percebida a singularidade das pegadas, pois eram mais semelhantes a de um homem descalço, com leves traços caninos, do que de um animal quadrúpede.

Alguns veterinários foram chamados, além dos peritos de criminalística, e eles apontaram os mesmos detalhes, destacando, porém, algumas características curiosas sobre a fera assassina.

Segundo os especialistas, o animal pesava entre oitenta a cem quilos, a julgar pela facilidade com que destroçara os dois criminosos; deveria, também, medir de um metro e oitenta a dois metros — ou mais — para conseguir uma proeza como aquela, afinal um dos assassinados era muito robusto, representando certo obstáculo para ser vencido, ainda mais armado. Ainda na cena do crime, foi possível identificar traços da presença de um grande lobo, de pelagem escurecida, o que ficou evidente no exame das mordidas.

Os veterinários e os peritos concordaram neste ponto: o assassino era um lobo ou algum canídeo de grande porte, inexistente naquela região, provavelmente fugitivo de algum circo ou cativeiro, ou algo parecido, e ao ficar faminto, atacou aqueles bandidos com grande fúria e agressividade.

Durante alguns dias investigou-se sobre possíveis lugares que poderiam ter sido do animal canídeo. A população, neste período, mostrou-se assustada e supersticiosa, evitando a qualquer custo andar pelas ruas depois das dez horas da noite; todos evitavam os arredores da mata, das fazendas, dos cemitérios; quem morava na zona rural vivia sempre alarmado e cercavam-se de armas, cães bravos e cuidados contra o sobrenatural.

O prefeito ainda tentava tranquilizar a cidade, prometendo melhoras na segurança pública, afinal em ano de eleição aquele perigo desconhecido poderia lhe custar votos para seu segundo mandato. E ele realmente cumpriu o que prometera, aumentando o número de policiais e de guardas civis.

O tempo foi passando e já se corria um mês e meio desde o ataque do Lobo de Barreiras, como ficou conhecido. Pouco a pouco o medo geral foi se extinguindo e a vida começou a seguir seu curso normalmente. Ora ou outra alguém se recordava do caso e ria, achando graça daquela superstição boba e inadequada para uma cidade tão grande como aquela.

Talvez pelo marasmo da crença naquilo que outrora se temia ou por outro fator desconhecido, mas um segundo ataque, agora mais cruel e sanguinário ocorreu.

A cidade entrou em choque quando corpos foram encontrados no cemitério, totalmente esfolados numa poça imensa de sangue enegrecido. Em volta, num círculo perfeito, treze velas vermelhas ardiam inalteráveis, produzindo uma chama quase negra. Alguns túmulos foram abertos e os cadáveres, muito recém enterrados, tinham parte do corpo em decomposição para fora, como se tivessem sido trazidos para o exterior ou se erguido das tumbas.

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