Como tudo começou

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Era verão, fim de tarde do segundo dia de dezembro de 2016, minha mãe parou na porta do meu quarto e sem falar nada ficou ali, apenas nos observando, eu estava com meus irmãos e estavamos jogando video-game, olhei pra ela e pela primeira vez eu perguntei pra onde ela estava indo e pela primeira vez ela não disse onde estava indo tão arrumada, nós dois não sabiamos que aquela seria nossa última conversa, e que ela não voltaria a pisar aquela casa. Foi uma noite curta, aquele olhar tinha uma mensagem e eu não soube decifrar, que aquele anjo que Deus colocou em minha vida seu tempo na terra havia se esgotado.
Na manhã do dia 3 de dezembro de 2016, primeiro domingo do mês, minha avó chorava, é desconfortável escutar alguém que tanto amo chorar daquela maneira, mas eu não sabia o que fazer e nem sabia o que estava acontecendo, era suposto todos estarem se preparando para ir a igreja, não chorar, eu tentava entender e foi quando minha tia chegou que eu juntei os pontos e fiquei sentado no meu quarto tentando assimilar da melhor forma, afinal não é uma coisa simples aceitar o desaparecimento físico de quem você queria por perto pra sempre, em pouco tempo nossa casa ficou cheia de vizinhos e de vários outros amigos e conhecidos, mensagens circularam e em pouco tempo toda família se encontrava chorando independentemente do lugar que se encontrasse, e várias mensagens de consolo chegavam, foi o dia mais triste da minha vida, cheguei a me amaldiçoar por não ter deixado cair uma única lágrima, meus amigos falavam pra eu ser forte, e eu tentava, eu ia acomulando e comprimindo aquelas palavras tristes que ao contrário de me ajudar a últrapassar estavam apenas abrindo um burraco no meu Coração.
Eram ferídas que não tinham uma previsão pra cicatrizar, e esse era o maior dos meus problemas, eu estava alí calado sem dizer nada enquanto minha alma queria gritar e meu prando rolar, oh meu Deus perdoai-me se algum dia não honrei minha mãe
foi isso que aconteceu, a culpa, eu sentia tanta vergonha de mim mesmo que não parava de me culpar, me culpar por não ter ficado mais tempo, por não ter aproveitado cada segundo, por não ter dito o quanto a amava enquanto as palavras tinham certo poder e valor. Não fiz por mal eu acho, só não sabia como reagir perante uma cituação tão frustrante como aquela e pra falar a verdade ainda não sei e não sei se algum dia eu estarei.
3 coisas fizeram meu Coração sangrar no dia do entero e em 3 momentos diferentes
Começando pelo velório, o sofrimento eu olhei pra tudo quanto era canto e estava cheio meu primeiro momento de desgosto e desapontamento se aproximava, pediram que a família em primeiro se aproximasse para ver e gravar em sua memória a última imagem, quando foi minha vez, a ficha caíu quando percebí que realmente era minha mãe que se encontrava naquele pedaço de madeira que chamamos caixão, e a flexada no peito eu recebí quando fiquei ainda algum tempo tentando não acreditar e percebí no mesmo instante que minha mãe sofreu antes de morrer, minha mente até hoje cria imagens de um carro capotando e apenas uma pessoa fazendo a transição desta vida para a vida sem fim.
O segundo momento os comentários de aceitar aquela triste realidade, ouvir algumas pessoas dizendo que eu era insensível e que parecia não ter um Coração por não deramar uma única lágrima foi mesmo atordoador, tudo que eu mais queria naquele momento era rasgar o peito e deixar todos os sentimentos suprimidos aqui dentro sirem, tudo que eu queria era chorar e naquele momento me era negado esse direito, e as pessoas ficavam me julgando, fazendo comentários indiscretos como se eu estivesse gostando daquilo, meus irmãos também não choravam, com excessão de minha irmã cassula. Doi quando lhe é negado o benefício da dúvida e doeu mais em mim o choro de minha irmã, não suporto que gente que eu amo chore.
O  terceiro momento a mensagem lída pelo meu irmão (meio irmão da parte do pai, mas isso não muda nada) longa e quase uma forma de tortura por ter palavras de amor que não serão mais valorizadas, e cheia de pedidos de desculpas e arrependimentos, aí até o murro de Berlim cairia. Juntando esses 3 momentos acredito que vocês imaginem a dor que eu estava sentindo e foi aí que eu chorei
Então vocês já sabem essa é a origem da minha depressão.
Alguns meses se passaram e eu continuava sorrindo pra não chorar, sentindo cada noite a falta que meu anjo na terra fazia, foi o ínicio do momento mais crítico da minha doença, foi o momento que a depressão piorou, trazendo consigo os seus principais sintomas, a senssassão de vazio mesmo que o dia tenha sido bom e aparentemente produtivo, eu chegava em casa e me isolava, me escondia do mundo, ninguém da família sabia, eu não compartilhava isso com ninguém, eu acho que esse é um problema comum para pessoas que sofrem de depressão, o uso do negativismo, tudo dando errado, mesmo quando era um empecilho muito pequeno, no fim do dia era tudo levado ao negativismo, e pensamentos que me atormentavam não paravam de chegar, aquela voz que você escuta quando está sozinho e que as vezes te conta piadas chegou, e veio pra ficar. Eu não podia ficar chateado que logo pensava em me matar e graças a Deus eu tirei a corda do pescoço sempre antes da sentença da voz que sunssurava no meu ouvido dia e noite.
Mas pra eu conseguir sobreviver nos Primeiros anos foi graças a minha irmã mais nova que sempre que eu tentava usar essa saída me lembrava que não teria volta e ela estaria desprotegida, e isso tudo acontecia dentro de minha mente, tornando minha irmã a minha primeira âncora.
Mas os ataques não paravam por aí e pra piorar eu não procurava ajuda, depressão é uma doença pouco falada e em Moçambique poucos a conhecem e dos poucos a quantidade que dá a devida atenção a ela é menor ainda.

A força pra SobreviverOnde histórias criam vida. Descubra agora