8 • Para Cosmo Brown Jr, que sempre soube a coisa certa a dizer [FINAL]

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Caro Sr. Brown,

Primeiro, gostaria de relevar que, apesar de meu corpo beirar ao perecimento, minha vontade de dizer as coisas certas permanece viva enquanto meu espírito permanece agitado sob minha pele. Não surpreendentemente, o senhor me parece se sentir da mesma forma. Entende-se que, a partir disso, escreveria mais se pudesse. Enviaria mais cartas. Há muitas coisas que eu gostaria de fazer se pudesse, para ser franco. Faria, não farei. Engana-se quem pensa que minhas limitações se encontram na sombra do iminente pesar de minha essência. Mas, de fato, trata-se de tempo. Não das migalhas de futuro que me são como sementes infrutíferas, mas no assobio das águas frias que afogam o passado. 

Mas não há sentido algum em lhe dizer isso, afinal, não é você quem compartilha dos mesmos ressentimentos que este vulto de vida carrega? Portanto, contar-lhe das coisas de que não sabe seria uma maneira mais produtiva de passar o tempo entre a queda das últimas gotas de espírito que escorrem dessa cascata defunta. 

Sr. Cosmo Brown Jr, o homem que sempre sabia as coisas certas a serem ditas. Mas, sabia ele das coisas certas a serem feitas? Não se trata de um homem vadio, de popularidade infame. Tampouco fora conhecido como uma figura corretíssima. Cosmo Brown Jr era ninguém mais, ninguém menos. A borda da moeda. O zero à esquerda. Abandonado pela mulher que amava, fora-lhe inútil em seus momentos de tristeza. Sabia amar para si, nada mais, nada menos. Não a soube amar de fato. Esquecido pelos filhos. Evitado pelos amigos. Ouvido por uma minguada multidão. Avistado por olhos semicerrados. Sr. Cosmo Brown Jr não acredita ter feito qualquer diferença no mundo como sonhara. 

Apesar disso, deita-se numa cama de hospital como um fraco sorriso que resiste entre a dor e a conformidade. A dor de alguém cujo coração desfalece. E a aceitação de quem não repele o destino. Degusta o sabor amargo de suas decisões como um incandescente vinho que percorre a garganta em gotas flamejantes. Cosmo Brown Jr não é ninguém mais do que Cosmo Brown Jr. O infeliz, o mequetrefe e, ao mesmo instante, reservado. 

Nós buscamos fazer o nosso melhor para fazer a diferença no mundo, para as pessoas que nos foram apresentadas. Aproveitamos os caminhos cruzados quando deveríamos seguir as tortuosas faixas que lideravam às novas descobertas. Se tivéssemos, ao menos, aprendido a amar propriamente. A, pelo menos, buscar pelas felicidades propriamente ditas em vez de viver nas entrelinhas a buscar a extravagância na simplicidade. 

Deslumbramos as luzes das metrópoles crescentes sob nossos olhos, não por sabedoria ou mero inclinamento poético, mas por sermos demasiado hesitantes para permitir que nossas mentes alcançassem as estrelas no céu.

Cosmo Brown Jr. aproveitou todas as coisas pequenas, sem nunca se permitir ver a si mesmo como merecedor de desfrutar a vida como ela é. Não era, pois, humilde, mas covarde demais para viver. Corajoso o suficiente para existir. 

A quem quer que venha a me conhecer por meio desta escrita, peço que não me veja com olhos penosos. Não é por sentir pena de minha solidão que me desfaço em metáforas, mas por mero reconhecimento do meu próprio ser. Ser como sou, feito de carne, ossos e desejos, foi, para mim, melhor do que seria me esvaziar de mim para me preencher as lacunas com receios e arrependimentos.

Liberto meu espírito insensato e dolorido sob a paradoxa tranquilidade luminosa. 

Com todos os despedaços de mim,

Cosmo Brown Jr.

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