Brasileiro

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   " irmã minha, sangue do meu sangue, mande lembranças ao papa, diga que estou indo muito bem nas provas aqui em Lisboa, fiz algumas amizades, um pintor brasileiro mui lindo por sinal, veio de Minas Gerais, as obras dele são belíssimas e geniais, ele retrata os montes curvos e dançantes da terra natal, e uma música belíssima aqui de Lisboa, Aline a graça dela uma menina amável uma preta linda com uns cachos caídos que quando ela toca eles parecem dançar junto.
    Ah irmã, a vida na cidade grande tem sido cada dia um desafio cada vez maior, tenho de dizer:
_Ana Lúcia, os preços aqui na capital são altos e a vida aqui ferve o samba nos pés, é belo mas a correria me chama, mande lembranças a todos."

   "[...] pois é um dia a gente levanta da cama e quer dançar e o no outro parece que estamos prestes a construir nosso túmulo, como já dizia nossa mãe: 'há dias na terra que quem nos pisa são as pedras' [...]"

   "Ana Lúcia, se possível mande-me 45 euros, estou em divida com a livraria da rua de casa, tenho tido insônia e só esses livros de romances clichês pra me salvar, se puder me mandar essa ajuda já te recompenso logo na próxima carta que te mandarei. Mande lembranças ao papa e que bom que ele já está melhor e ja pode cuidar do nosso jardim, espero ver as primaveras e as rosas floridas quando chegar ai. Com amor sua irmã Maria."

   " e la corre a menina com os livros na mão
E la corre a menina com o violão
Os portões do colégio escancarados ali a nossa frente
Nem se lembra do nome de cada ser que se passa ali
Uns em busca de conhecimento
Uns de alto conhecimento
Um só de reconhecimento
E eu aqui
Uma menina de interior
Eles com tantos 'entos'
E eu só com um sonho nos dedos"

Cartas de Maria José Sertão Sá escritas e mandadas para sua irmã Ana Lúcia, 1964.

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