Hermann Balan, o amigo que descobriu a relação entre Emil e Xaver no ensino médio. Hermann Balan, o culpado de que Herr Muler enviou seu filho a Munique só para afastá-lo de Xaver para sempre.
Mas o que ele tem a ver com o túmulo memorial? Qual papel você desempenhou nessa história, Hermann?
O amigo de infância de Emil e Xaver nunca perdoou a dor que ele desencadeara com sua indiscrição. O sentimento de culpa pela morte desumana que ambos sofreram acompanhou-o ao longo de toda a sua vida.
Passou uma década antes que ele pudesse se redimir. Em 1928, a Romênia celebrou o décimo aniversário do armistício e da fundação do Estado Romeno, com a anexação, entre outros territórios, da Transilvânia, incluindo Sighisoara.
Muitas cidades decidiram construir memoriais para comemorar a data e homenagear os soldados que morreram. A prefeitura de Sighisoara foi uma delas.
E a pessoa encarregada de planejar tudo isso foi um alto funcionário que acabara de entrar no consistório chamado Hermann Balan.
Essa foi uma das primeiras obras de Hermann na prefeitura de Sighisoara, onde acabou virando prefeito após a Segunda Guerra Mundial.
A primeira coisa que Hermann teve que fazer foi obter permissão das famílias dos mortos para levar os corpos para o novo local.
Não demorou muito para obter a autorização de exumação Emil. Para seu pai, o velho oficial, seria uma grande honra para seu filho descansar em um monumento nacional.
E em 1º de dezembro, no Dia Nacional da Romênia, o memorial foi inaugurado em uma cerimônia civil. A cidade inteira foi homenagear seus mortos novamente, com Herr Muler à frente, vestido para a ocasião com todas as suas medalhas.O que ele não imaginava é que seu filho não estaria sozinho naquela sepultura.
Hermann moveu o céu e a terra para localizar o corpo de Xaver em Oradea, por isso ele tinha o atestado de óbito em húngaro. Desde o primeiro momento ele queria enterrá-lo com o homem que amava para que pudessem descansar juntos por toda a eternidade.
Obviamente, ele manteve seu plano em segredo para que ninguém pudesse detê-lo.
Ao ver aquilo, Herr Muler ficou furioso e confrontou Hermann gritando na frente de todos. Como ele tinha sido capaz? Como se atreve ele a manchar a honra de sua família dessa maneira? O homem estava fora de si.
Foi por isso que Hermann o derrubou com um soco, como Xaver fizera com ele dez anos antes.
— Quinze anos atrás cometi um erro imperdoável - cuspiu Hermann ao velho oficial. — Eu matei meus melhores amigos muito antes dessa guerra horrível. E você foi cúmplice disso. Vocês todos eram.
Os vizinhos de Sighisoara abaixaram as cabeças, envergonhados com as palavras de Hermann:
— É hora de deixar que descansem em paz, juntos como deveriam ter vivido, e como heróis de algo muito mais valioso do que uma guerra.E assim tem sido até hoje.
Dorothea está tão surpresa quanto eu. Alina nunca lhe contou sobre aquele episódio de seu bisavô. Nem a família dela... Pela primeira vez eu a vejo chateada.E isso não é surpreendente. Herr Muler deixou o cemitério com o rabo entre as pernas e nunca mais falou de Emil em sua casa. Ele colocou todas as coisas de seu filho em uma mala e trancou-o em um armário.
Herr Muler não pôde enterrar seu filho onde ele queria, mas tentou enterrar sua memória. Uma lembrança que hoje, finalmente, vem à tona, para sua neta, para mim e para todos vocês.
O relógio da sala mostra doze horas. É hora de ir. Eu me despeço de Alina e ela me dá um abraço que cheira a donuts e conhaque. Espero com todo o coração que nos vejamos novamente um dia.
Uma vez na rua, Dorothea se oferece para me acompanhar até a rodoviária, mas eu rejeito o convite. Eu tenho algo importante para fazer antes. E eu preciso fazer isso sozinho. Eu digo adeus a ela com um beijo na bochecha e ela cora.
Eu caminho para o túnel de escadas que leva à Igreja da Colina. Eu subo as escadas. Passo pelo instituto e tenho a sensação de que muitos fantasmas estão me observando de suas janelas.Não demora e já estou no memorial.
Eu fico em frente ao túmulo de Emil e Xaver de uma maneira quase cerimonial. Acho difícil acreditar que estive lá no dia anterior. Parece que um século se passou.
Eu respiro profundamente.
Eu olho para a lápide.
Eu leio seus nomes de novo e de novo.
Emil e Xaver.
Xaver e Emil.Eu olho em volta de mim.
Nada mudou, mas nada é igual.Eu fico em silêncio por um longo tempo.
Mas o silêncio não é assim.
O vento dos séculos sussurra segredos no meu ouvido.
E eu pareço ouvir o riso de duas crianças de 16 anos que fugiram da aula. Que se escondem atrás de lápides no cemitério para fumar um cigarro. Que aquecem as mãos com a respiração um do outro. Que se olham nos olhos para descobrir neles uma explosão de esperança.
Que dão seu primeiro beijo. Um beijo que contém toda a felicidade de que sonhos compartilhados são feitos. Um beijo que entrelaça suas almas para sempre. Um beijo cheio de um amor que, por um momento, faz com que se sintam imortais.
Naquele momento, coloquei minha mão na pedra congelada.
E com um fio de voz, quase como numa oração, eu digo:
— A história de vocês foi contada.FIM
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Emil e Xaver
Teen FictionUma história sobre o mistério que está por trás de uma lápide onde jazem dois soldados do Império Austro-Húngaro que lutaram e morreram na Primeira Guerra Mundial... E que foram enterrados juntos. Essa história é do Guillem Clua, traduzida no twitt...