NÃO CONSIGO lembrar qual é a definição de Sol. Tento, mas é impossível. Enquanto meus pés descem as escadas da varanda e a madeira range com o peso, olho para a bola de fogo brilhante no céu e ela não faz qualquer sentido. Nada faz. Nem o ar, nem as nuvens, nem a minha garganta seca e o gosto ruim que sinto na boca.
— Você está bem?
Tem uma mulher no fim dos degraus, inclinada sobre o corrimão. Descabelada e de pijama, me olha com desespero. Quero responder que sim, mas não sei se é verdade. Esqueci meu nome, de onde sou e se estou bem.
No último degrau, escorrego e caio. Sinto o impacto da madeira contra as minhas costas e as palmas das minhas mãos ralando, absorvendo farpas. A dor física é bem vinda. Me faz acordar.
— Levanta, tá tudo bem.
Ela me ajuda a ficar de pé. Só agora percebo que a mulher é real. Não é como o Sol, sem sentido. Ela é uma pessoa e está aqui. Como eu. Como...
— Onde ele está? — Pergunto eufórica.
A mulher me olha com preocupação. Seus lábios estão contraídos, o maxilar trincado. As mãos em meus ombros, tentando criar alguma direção, evitam tocar o sangue seco na minha camiseta.
— Você precisa ir a um hospital. Ele deve estar lá.
Sua voz é calma. Ela me olha com ternura e cuidado. E medo. Como se eu fosse perigosa ou radioativa. Fecho os olhos e tento me concentrar, as lembranças da noite passada confusas demais para fazerem qualquer sentido.
Me sinto vazia.
Não sei meu nome, de onde sou ou se estou bem, mas sei que, depois de ontem, a minha vida nunca mais será a mesma.
Posso sentir.
Como sinto o sol em minha pele.
🦋
CONTINUA
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O Som Das Cores
RomanceElizabeth Taylor tem mais de cem cadernos cheios de palavras aleatórias e seus significados. Ela ama cada um deles e, principalmente, conhecer novos. Mas, quando uma terrível tragédia dá à vida de Elizabeth um significado ruim, ela muda completament...