NÃO QUERO IR PARA A REUNIÃO.
Estou sentada na minha cama, tentando não parecer muito ansiosa enquanto Maya se arruma. Meu coração dá um pulo toda vez que começo a pensar em desculpas para ficar, mas sei que qualquer coisa que eu diga fará com que ela me odeie. Em seu lugar, também ficaria decepcionada e pensaria ter a pior colega de quarto do mundo.
Mas não posso sair.
Não quero sair.
Minhas mãos tremem quando penso em encontrar outras pessoas. Não quero precisar sorrir ou conversar, e não quero ficar sentada em um canto enquanto o tempo passa, esperando o momento em que vou poder ir embora sem decepcionar alguém. É muito mais fácil simplesmente não sair deste quarto.
Escuto-a falar enquanto Maya penteia os cabelos e escolhe uma roupa quente. Ela não para de repetir que ama essas noites, e eu apenas concordo cegamente. Pelo menos alguém está feliz — mesmo que eu vá estragar essa felicidade em alguns minutos. Sei que sequer conseguirei explicar os motivos que cercam minha falta de vontade de ir a esse encontro; eu não conseguiria, nem se tentasse. Nem mesmo entendo quais são. Só sei que prefiro dormir e ficar sozinha a noite inteira.
— Leva uma blusa — diz enquanto dá uma última checada no espelho. — Costuma ventar muito durante a noite.
Maya não é muito confiante, mas também não é tímida. Ela é tão normal que me assusta. Suas roupas são tão jovens quanto antiquadas e há maquiagem o suficiente para deixá-la bonita, mas não exuberante. Sinto inveja dessa simplicidade toda. Se apenas a ideia de sair desse quarto me assusta, nem imagino o que aconteceria se eu decidisse me arrumar. Sempre fui vaidosa, mas acabei deixando a maioria dos meus costumes de lado. A única coisa que me permiti nos últimos três meses fora as tranças, um presente da minha avó após o incidente. Na época pareceu fútil me preocupar com o cabelo, mas hoje entendo que aquela mudança, aquele gesto, o simples fato de ver algo diferente sobre mim, salvou um pedaço da minha alma. Se eu tivesse passado os últimos meses com os fios crespos cortados rente ao ombro que usava quando tudo aconteceu, teria sido muito mais difícil de esquecer a tragédia. Uma das lembranças mais fortes daquela noite, que me traz pesadelos, foi o momento em que percebi que era real, mas que estava segura mesmo que meus amigos estivessem mortos; eu entrei naquela casa e vaguei pela sala até quase bater em um espelho e, quando olhei para o meu reflexo, vi pela primeira vez a fuligem em meu rosto e os cabelos cobertos de sangue. Lembro de tentar limpar e não conseguir e, então, começar a arrancar tufos com as mãos. Depois disso, em casa, sempre que eu me olhava no espelho acabava voltando para aquele momento, mas as tranças foram um aspecto completamente novo na minha vida, uma coisa boa que não está relacionada ao que passei.
Mas nem mesmo as tranças me dão coragem para sair ou me arrumar. Eu gostaria de conseguir fazer isso. Sem pânico. Sem hiperventilação. Só... sair. E pronto.
Maya vai até a porta e olha para os dois lados do corredor. Então se vira na minha direção e sorri tristemente.
— Se vai ficar aqui, tenta pelo menos não chamar a atenção do Mitchell.
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O Som Das Cores
RomanceElizabeth Taylor tem mais de cem cadernos cheios de palavras aleatórias e seus significados. Ela ama cada um deles e, principalmente, conhecer novos. Mas, quando uma terrível tragédia dá à vida de Elizabeth um significado ruim, ela muda completament...