Capítulo 2

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Abby

No início do verão em que Grace foi embora, passei para a UCLA, na Califórnia. Ela estava chateada por Colin e focada em fazer veterinária, e foi para o Wisconsin estudar e lamber suas feridas. Ela teve uma festa surpresa em que dançamos e cantamos em sua sala, na fazenda, e pela manhã, comigo ainda de pijama, ela partiu. Quando cheguei em casa, chorei achando que nada seria como antes, mas eu deveria saber que se Grace Lynn jurou que ia ser minha melhor amiga aos 11 anos de idade, nem mesmo muitos quilômetros de distância a impediria. Ela me mandava mensagem todo dia, fazia chamadas de vídeo, me fez conhecer o Wisconsin e a levei para a Califórnia. Em uma de nossas férias juntas, conhecemos Nova York.

Mas coisas tristes aconteceram neste verão antes de eu partir. Três semanas depois que Grace foi embora, levantei de manhã, bem cedo, para fazer meu café. Me arrastava pela sala ainda coçando os olhos quando vi o pequeno vulto no chão. Os pelos do meu braço se arrepiaram quando encarei a cena e corri.

Ali, encolhida no chão frio, vovó não respirava mais. Balancei, gritei, tentei respiração boca a boca como aprendi na escola. O barulho acordou meus pais e mamãe, ao ver a cena, colocou a mão no rosto e soltou um grito que jamais vou esquecer. Ela tinha morrido durante a noite. Começou a sentir dor, levantou para pedir ajuda mas o infarto não a deixou dar mais passos. Ela tinha 67 anos mas não aparentava nenhum deles. Era uma mulher doce, que cozinhava, cuidava de sua livraria e era amada pelas pessoas locais. Aquilo me machucou como poucas coisas: vovó não esteve comigo até nos mudarmos em Ohio, mas era parte fundamental da minha vida.

Tudo passou como uma neblina, com o médico legista, a funerária, ligar para pessoas. Só chorei algumas horas depois, no meu quarto, quando liguei para Grace. Foi quando minha ficha caiu e permaneceu desse jeito madrugada adentro, com meu peito desgarrado enquanto já não tinha lágrimas para derramar. No meio da noite, me deitei entre meu pai e minha mãe, procurando um conforto que não buscava desde antes de nos mudarmos para o Texas. Minha mãe me abraçou e brincou com meus cabelos até dormir e então despertei para o dia mais difícil da minha vida.

Com um vestido preto simples e de mãos dadas com minha mãe, fomos para o cemitério. De longe e meio anestesiada, via as pessoas prestarem homenagens e nos cumprimentar com acenos de cabeça e pequenos toques no braço. Vi ao longe quando Miranda chegou com Colin e Jared e ela me abraçou, com esse jeito de Grace e o afago que minha amiga queria me dar mas não podia, já que estava no meio de um curso antes da universidade e não poderia voltar. Fiquei lá, entre Miranda e minha mãe até o caixão descer e me despedir com carinho jogando terra sob sua lápide. Sentia tantas saudades!

Ainda no meio à confusão, fomos para casa, onde as pessoas apareceram com comida e começaram a contar histórias sobre minha avó. Era agridoce demais ouvir, então apenas me levantei e sentei nas escadas, na entrada da casa.

Nós morávamos no segundo andar da livraria. A casa era pequena, mas as pessoas fizeram um esforço para estar lá. Entre a porta e a livraria, uma pequena varanda dava para a rua, onde me sentei, olhando a paisagem. Por mais que quisesse apreciar o gesto das pessoas, queria ficar sozinha nesse momento, sem os risos, os abraços e todo o mais.

- Como você está? – ouvi a voz ao meu lado, grossa e aveludada e conhecia bem seu dono. Jared tirou o chapéu, penteando o cabelo com os dedos e me encarou antes de sentar a meu lado – você sabe que a pergunta não é essa... mas você está bem?

Eu ri da sua expressão e o encarei. Ele parecia preocupado, me encarando de forma tão profunda.

- O mais que poderia estar. Ela era tão importante para mim, Jared...

- Sinto muito, pequena.

- Obrigada. É bom saber que amavam minha avó.

- Fica mais fácil com o tempo, mas nunca sara totalmente. Perdi meu pai muito cedo e gostaria de ter alguns minutos de volta com ele todo o tempo.

O Coração do Cafajeste - DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora