PARTE 1 - PRIMÓRDIO

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Sexta-feira, 6:45 da manhã.


Acordei com o nada discreto toque estridente do despertador. Na verdade acordei pela terceira vez porque ele toca às seis e vinte e o Tino me acorda nas outras duas primeiras vezes, ou seja, estou atrasada, pela quinta vez esta semana e pela vigésima este mês.

Me levanto desesperada e sem enxergar nada. Abri a janela e lá fora estava ele novamente, sempre lindo e brilhante, me revigorando, como em todas as manhãs...eu amo meu cachorro.

- Meu deus! O que eu estou fazendo aqui parada??

Corri em direção ao banheiro, tirei a minha calcinha de ursinhos que tenho desde os dez anos, a blusa larga dos Beatles e entrei no box. Abri o chuveiro e foi tão gelado que parecia que minha alma tinha se renovado no instante em que a água caiu sobre as minhas costas.

Terminei o banho, e enquanto pegava a toalha para me secar, escuto meu celular tocando. Minha mãe com certeza, ela me liga todos os dias às sete, que fofa.

-P****, às sete!!!

Saí do banheiro correndo parecendo uma louca pelada e atendi o celular:

- Oi mãe. – Falei ofegante e tentando parecer calma.

- Oi filhota, já está pronta? Não vai se atrasar de novo hein?

- Não mãe, hoje não, mas estou bem ocupada agora, te ligo assim que puder, te amo! – Eu disse enquanto vestia a primeira calça amarrotada que vi na minha frente.

- Certo, tenha um ótimo dia querida, beijos!

Eu desliguei o telefone e corri para o guarda-roupas. Peguei uma calcinha, vesti minha blusa de algodão cinza e meu casaco preto, caucei o tênis e saí em busca do meu óculos. Não encontrei ele, acabei só pegando a bolsa, comendo uma barrinha de cereais e dando um beijinho no Tino. Desci as escadas correndo, passei pela portaria e escutei:

- Bom dia senhorita Hermann!

Era o porteiro, Nestor, ele me chama pelo sobrenome que herdei do meu pai.

- Bom dia Sr. Nestor! – Respondi como sempre respondo todos os dias, correndo e já no final do corredor.

Bem, são sete e meia, meu horário de trabalho começa às sete e meia também, que coincidência não é mesmo? Parece que alguém está atrasada de novo.

Cheguei no ponto de ônibus, ainda dá pra ouvir o canto dos pássaros enquanto aguardo até as sete e quarenta. Vou demorar uns quinze minutos até o trabalho e lá vou ouvir a Dona Mercedes me dizendo novamente: "Ariel, está atrasada, de novo. Esta será a última vez, entendido?". A verdade é que ela fala isso desde que eu entrei no restaurante a uns oito meses atrás. Me sinto culpada as vezes por ela ter tanta paciência comigo, e sei que o motivo de eu ainda estar lá é ela ser prima do meu pai.

O ônibus chegou. Entro sem dar uma única palavra, mostro o bilhete ao motorista e sento no mesmo banco que me sento diariamente: penúltima fileira da esquerda, lado da janela. Isso porque eu amo olhar as mesmas vegetações, montanhas, árvores e lagos que vejo todos os dias. Inclusive minha cidade é cercada disso, moro em Interlaken, na Suíça. Me mudei há um ano com meus pais, e esse lugar ainda consegue me arrancar suspiros.

Peguei meu celular, meus fones de ouvido e relaxei. Afinal, logo terei um lindo e maravilhoso dia de sexta -feira, servindo café.

NÍNIVE'Where stories live. Discover now