CAPÍTULO 4 - UMA PARTIDA INESPERADA

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Anastácia nunca conseguia passar um dia inteiro trancada na cabana fedorenta de Valentim, por isso ela sempre precisava dar uma volta pela cidade para não enlouquecer.

Naquele fim de tarde, quando já estava voltando de uma de suas caminhadas, Anastácia se deparou com uma estranha cena, assim que chegou aos arredores do chalé. O mestre Valentim estava bem em frente à porta de entrada, segurando um pedaço de madeira que pegava fogo (mais tarde Anastácia reconheceu o pedaço de madeira como sendo um dos pés da mesa da cozinha). O mestre agitava a madeira para todos os lados, e Anastácia chegou a pensar que aquilo poderia ser uma nova forma de se realizar feitiços. Mas assim que Valentim pôs os olhos em cima dela, ele começou a berrar.

– Ah, você está aí sua diabinha terrível! Anastácia, assim que me livrar desses demônios você vai receber uma lição!

O mestre começou a saltar para todos os lados, com a tocha à sua frente como se fosse um escudo. Então Anastácia entendeu o que estava acontecendo e não deu mais um passo.

De tempos em tempos, os demônios do pântano tentavam invadir o casebre. Eles tinham a forma de gosmas esverdeadas, um pouco parecidas com mofo, mas grudentas. Aliás, diversas vezes eles já haviam se disfarçado de mofo nas paredes para tentarem tomar a casa de volta. Os demônios (não só os do pântano, mas de qualquer espécie) podiam tomar a forma de qualquer objeto, desde mofo nas paredes a gaiolas douradas para pássaros.

Como estava escuro, Anastácia não conseguiu ver os demônios logo que chegou, mas agora ela já os reconhecia, se transformando em estátuas de anões de jardim e avançando para cima do mestre. Eram quase vinte anões tentando invadir a casa.

Os demônios do pântano não eram criaturas terríveis às quais as pessoas devessem temer, eles eram até bem inofensivos. Mas não seria nada agradável se eles conseguissem invadir a casa e ela voltasse a ser como era, antes do mestre e Anastácia se mudarem para lá. Na primeira vez que entraram no casebre, o lugar estava repleto de objetos, de guarda-roupas à bengalas élficas, era um lugar realmente esquisito. Tão esquisito que Valentim, mesmo com toda sua dor e desgosto pela perda do seu castelo, leu o feitiço de revelar demônios e imediatamente a gosma verde tomou conta de tudo. No andar de cima ela se espalhou pela parede e pelo teto e no primeiro andar ela alcançava a altura dos joelhos de Anastácia. Era nojento, mais nojento que pisar num sapo sem sapatos. E é claro que foi Anastácia quem teve de pôr tudo para fora.

De tempos em tempos o mestre Valentim lia o feitiço e algum objeto num canto escuro do casebre explodia em gosma. Às vezes os demônios conseguiam entrar em grupos, fazendo-se de alfinetes, mas mais cedo ou mais tarde Valentim os revelava.

– Mestre, – Anastácia gritou, saltando para trás – faça o feitiço!

– Mas é exatamente esse o problema! – Valentim berrou, enquanto um anão lhe deu um chute na canela e entrou correndo na casa – Você, sua... sua aprendiz de percevejo! Mexeu nos meus feitiços e agora eu não o encontro!

– Eu não mexo nos seus feitiços! – Anastácia gritou de volta, sentindo-se profundamente ofendida.

Mestre Valentim caiu de quatro e um dos anões deu um berro, erguendo o braço direito. Todos eles fizeram uma fila e começaram a saltar na cabeça do mestre, escorregando pelas costas e caindo no corredor de entrada, ganhando terreno.

– E lá vão eles! Malditos! – o mestre exclamou assim que conseguiu se levantar – Oh, e agora? Já devem estar se transformando em fuligem e nunca mais os pegaremos... Essa lareira sempre esteve aqui?

Anastácia deu um suspiro e correu para junto do mestre.

– Se você não sabe onde meteu aquele feitiço e nem lembra as palavras, vamos ter de pegá-los um por um!

O Demônio, a Bruxa (e a irmã dela) [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora