Capítulo quatro

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Mamãe chegou cinco minutos depois e me liberou para conseguir sair da escola. Respirei aliviado ao chegar em casa e correr para dentro do quarto. Ela me seguiu e bateu na porta, pedindo para saber o que eu estava sentindo, mas menti e falei que a secretária tinha me dado um remédio para me ajudar na dor de barriga.

— Eu preciso ficar sozinho agora, mãe. Estou morrendo de sono — acrescentei.

Ela só me deixou em paz quando prometi que depois iria explicar para ela sobre o que aconteceu. Ela devia ter percebido minha mentira, afinal, eu nunca tinha o costume de sair mais cedo da escola. Escondi o rosto embaixo do travesseiro e fiquei deitado, com os pensamentos a mil por hora, até que o sono finalmente me levasse embora. Acordei muitas horas depois com a barriga roncando e ouvindo a voz alta de Ágata vindo de seu quarto. Massageei minhas têmporas e desci as escadas para pegar uma maça na geladeira. Eu queria que tudo tivesse sido um pesadelo que não se tornou realidade. Seria muito mais fácil fingir que tudo não havia acontecido e assim, eu conseguiria seguir com minha vida. 

Suspirei e parei na porta do escritório da minha mãe. Ela estava escrevendo em silêncio, e eu fiquei por alguns segundos cogitando se eu entrava ou não. Não queria mais atrasar seus prazos, mas eu precisava dela. Tinha que falar com alguém antes da minha cabeça explodir.

Ela levantou os olhos do computador antes que eu pudesse bater na porta.

— Você vai me dizer o que realmente aconteceu? — disse ela sem rodeios.

Entrei mais para dentro de sua sala e sentei em uma cadeira que tinha perto da janela. O ambiente estava com cheiro de incenso.

Não a encarei. Não queria que ela visse minha tristeza.

— Vinícius me deu o pior presente de todos! Mãe, ele me deu uma blusa feia demais e duas cenouras! Foi humilhante!

Ela sabia o que eu dei a ele. Foi ela que pagou parte do presente, já que eu não tinha condições de pagar tudo sozinho com o pouco dinheiro que tenho guardado — e que juntei há tantos anos. Gastei todo o dinheiro que eu tinha para uma pessoa que não estava nem aí para mim. Eu era mesmo trouxa, Ágata estava certa.

Mamãe levantou da cadeira e foi até minha direção. O cabelo castanho dela estava todo bagunçado e preso em um rabo de cavalo desarrumado. Os olhos dela pareciam muito cansados com as várias horas escrevendo. E eu estava atrapalhando seu momento.

— Mãe pode voltar a trabalhar, eu não quero...

— Você não está atrapalhando. Agora quero que você me conte toda essa história direito.

Eu não estava ligando, mas contei toda a história para ela. Eu contei tudo até tirar o que estava entalado na minha garganta.

Minha mãe era também minha melhor amiga e eu sabia que poderia contar tudo para ela. Tive que contar e quando parei de falar, senti meu corpo mais leve. Ela deu um sorriso reconfortante para mim o que já me dizia mil coisas. Era tão bom ter alguém como ela. Por que eu não disse isso tudo antes? Não foi tão difícil falar.

Ela abriu a boca para dizer algo, quando um som impediu que ela continuasse. Era a campainha.

Ela deu tapinhas em meu ombro.

— Deve ser o varejão trazendo minhas frutas. Vou lá resolver isso e depois voltamos a conversar. Nem pense em sair daqui.

Assenti e fiquei sentado olhando pela janela quando ela abria a porta e eu ouvia as vozes ao longe. Abracei as pernas para próximo do peito. Os carros do lado de fora estavam buzinando muito e os prédios pareciam monumentos ao meu redor.

Com amor, seu bruxoOnde histórias criam vida. Descubra agora