fire on my heart

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March🥀

Foi tudo a merda de um sonho, eu sei que foi.

Acordei com a luz do sol entrando agressivamente pela janela do meu quarto. Eu possivelmente estava tão cansada que esqueci de fechar as cortinas, permitindo assim que os fechos de luz me cegassem e fizessem minha cabeça doer.

Passei os olhos pelo quarto, notando tudo em seu devido lugar. Minhas roupas estavam limpas também, diferente do que eu havia me lembrado. Levantei rápido e fui até o banheiro: nenhum sinal de sangue.

Não era possível. Foi tudo muito real, eu sentia minha cabeça doer pelo golpe do garoto de óculos, ainda conseguia sentir o cheiro do produto químico que o "cara triste" colocou naquele pano. Que caralhos estava acontecendo comigo?

Decidi não pensar mais nisso, pelo menos até o final do dia. Peguei meu celular e me assustei ao ver que já passava das duas da tarde. Desci as escadas, encontrando meus pais sentados no sofá, assistindo um filme qualquer.

— Bom dia, princesa. — Papai disse, animado.

— Foi dormir tarde ontem, meu bem? — Mamãe questionou, um pouco preocupada.

— Sim, acabei lendo até tarde, perdi completamente a noção do tempo. — Sorri fraco para os dois, tentando ser o mais convincente possível.

— Não tem problema, as férias são para isso mesmo. Agora sente, seu pai e eu temos uma surpresa para você!

Me aconcheguei na poltrona ao lado enquanto Marie se levantava e ia até a cozinha, pegando uma caixa preta com um lindo laço vermelho. A caixa era enorme, o que me me deixou inicialmente aflita por não ter ideia do que se tratava.

— Eu sei que sempre fui relutante com esse seu... gosto peculiar por armas brancas — papai iniciou o que parecia um longo discurso — mas resolvi te dar esse presente de natal adiantado. Espero que goste, fiz pensando na sua amada máscara de gato.

Peguei a caixa com um meio sorriso. Era um pouco pesada, mas nada fora do comum, de fato. Olhei para os dois antes de puxar o laço e retirar a tampa, revelando um pequeno arsenal de lâminas. Primeiro, peguei os anéis. Eles cobriam os meus dedos por completo e possuíam lâminas afiadas nas pontas, como se fossem garras. Sorri alegremente e passei para o próximo objeto, que estava em uma capa de proteção: uma espada ninja e três kunais.

Realmente, ele havia lembrado que guardo uma máscara felina de um festival asiático que fui há muitos anos atrás. Agradeci incessantemente, havia realmente amado aqueles presentes.

Enchi o estômago com qualquer coisa que tinha na geladeira e subi para guardar meu pequeno arsenal. Coloquei os objetos dentro do meu armário, juntamente com a máscara de gato preta que estava pendurada em um cabide.

Fiz meus afazeres domésticos e terminei pouco antes do anoitecer. Mamãe mandou mais uma vez que eu saísse para ir ao mercado, pois a véspera de natal era amanhã e precisávamos de suprimentos para a ceia. Me arrepiei por um instante, o flash da garota ruiva me veio à mente naquele exato momento.

Tentei manter a naturalidade e peguei o dinheiro para as compras, colocando no bolso interno do sobretudo. Pensei por um momento o que faria se esbarrasse com a ruiva misteriosa novamente, então uma ideia tomou conta de minha mente.

— Mãe, posso levar meu presente de natal? Quero passar antes na casa da prima para mostrar a ela.

— Claro, March. Só tome cuidado para não se machucar.

Suspirei aliviada e peguei todas as coisas do meu armário, inclusive a máscara de gato. A escondi por dento do sobretudo, prendendo-a na grossa meia calça que eu vestia. Apertei os cadarços das botas e saí pela porta, com toda a coragem que eu definitivamente não tinha. O que eu faria contra uma garota que possivelmente estava acostumada com aquela situação?

Eu dava meu máximo para não pensar naquela situação durante o trajeto, mas ao ouvir os passos atrás de mim pela mesma rua da última vez, pude sentir o desespero tomar conta de mim por completo. Não hesitei em virar, mas para a minha surpresa, ela não usava as mesmas roupas de antes.

— Sabe, gostei mais dessas roupas. A máscara é interessante. — Eu analisava a máscara de corvo que a moça vestia, juntamente com as vestes pretas.

Ela não me respondeu, veio em minha direção vagarosamente. Eu não ia arriscar fazer qualquer movimento brusco, mas os anéis já estavam prontos em meus dedos.

— A vida é efêmera, Robbie — ela quase cuspiu meu apelido, me questionei como ela tinha conhecimento do mesmo — você está pronta?

— Para o que, exatamente?

— Para tudo.

Virei levemente a cabeça para o lado, demonstrando dúvida. Ela se aproximava cada vez mais, podia jurar que o bico de sua máscara furaria um de meus olhos.

— Ele ficará feliz em ter você conosco.

— Não me interessa saber de quem você está falando, eu não pertenço a ninguém, não vou a lugar nenhum.

— Apego emocional a algo? — Ela sorriu sarcasticamente.

— Por que você e seus amigos estão tão interessados em mim?

— Não estamos, ele está.

— Ele quem?

Não obtive resposta, ela apenas se afastou e pude ouvir mais uma risadinha. Senti que ainda não estava sozinha, confirmei ao olhar para o outro lado da rua e ver a garota ruiva de sempre. Questionei o fato de serem duas e não uma, mas não era hora de pensar nisso.

— O que vocês querem?

Atravessei, indo de encontro a ela. Diferentemente da última vez, a garota não pegou nenhuma lâmina, apenas levantou a cabeça, olhando em meus olhos.

— Cuidado com as chamas, March. Você precisa estar inteira.

Chamas? Do que essa louca estava falando?

Eu não estava longe de casa e meus instintos mandaram que eu corresse até lá. Eu queria estar errada, eu precisava estar errada.

Mas eu não estava.

A última casa da rua estava em chamas. Bombeiros e ambulâncias cercavam o local. Vi retirarem dois corpos de dentro da residência.

Eu cheguei tarde demais, meus pais estavam mortos.

Eu ajoelhei em frente a porta de entrada, vendo as chamas consumirem tudo o que eu amava, tudo o que eu vivi, minhas lembranças felizes e tristes, meus momentos mais marcantes... tudo estava morto.

Eu não conseguia sentir nada naquele momento, apenas a dor da estática tocando meus ouvidos. Como se eu não tivesse controle do meu corpo, olhei para o bosque que ficava na lateral do jardim: as duas ruivas estavam ali paradas, a de preto fez um sinal com a mão para que eu viesse até elas. Minhas pernas se mexiam sozinhas, nada mais me obedecia.

Conforme me aproximava, vi uma figura alta atrás das duas. Um homem esguio que vestia um terno preto, não possuía nenhuma característica facial.

— Será um prazer ter você conosco, Ruddy.

RuddyOnde histórias criam vida. Descubra agora