As vezes entrava uma onda de vento no quarto e refrescava meu corpo. Me mexia na cama inquieto e foi aí que escutei um som vindo do corredor, mais precisamente das escadas. Eu me debrucei na cama e olhei para a janela aberta. Como a lua está bonita! E depois suspirei fundo, passei minha mão pelo meu cabelo molhado de suor e levantei. Coloquei uma camisa que estava largada em uma cadeira e caminhei na ponta do pé minunciosamente e atravessei o meu quarto, as vezes a casa — a noite — se tornava barulhenta, como se tivesse juntas estralando e cada passo era quase ensurdecedor. Lentamente caminhei desci as escadas e me abaixei para espiar a sala, então vi ela. Estava vestindo uma jaqueta jeans e procurando em um chaveiro algo. Então desci mais alguns degraus e perguntei a ela:
— Aonde você vai?
Ela assustada olhou para mim e no primeiro momento seu semblante encheu de surpresa, raiva ou decepção. Depois deu alguns passos se achegando perto, cada um de seus passos eram quase que calculados para serem silenciosos.
— Vou sair... quer ir junto?
Olhei para um relógio velho que ficava na cozinha, nas férias o tempo era quase que desnecessário, assim como o calendário, não me importava de acordar tarde em plena sexta-feira, porque era férias. Eu tinha quase toda certeza que o relógio não funcionava, mas decidi confiar nos ponteiros quase parados que indicavam 02h30.
— Melhor não. Já está tarde.
Eu tinha medo dos bares da cidade. Não sabia que a cidade era linda a noite.
— Bem, eu vou, se você quiser eu posse te deixar vir comigo — então ela estendeu a mão como que se me chamasse, mas eu continuava muito relutante hesitando ir.
— Nós vamos nos ferrar.
Ela levantou uma das sobrancelhas quase que desafiantes.
— Bem, logicamente, se alguém souber.
Eu sorri mesmo evitando que aquilo me fizesse confiar nela, não sentia ainda que deveria confiar nela. Eu meio indeciso fiquei com os dois pés um na frente do outro, um querendo subir, voltar para cama, dormir e pensar se realmente aquilo era um sonho ou era realidade. E o outro queria acompanha-la sem querer pensar muito nas consequências. Enfim, meio desencorajado, mas enfim, caminhei até ela e segurei sua mão. Era um toque macio e delicado, a leveza me causava uma sensação de segurança. Me senti seguro quando vi o sorriso brotando nos lábios dela. Ela pegou a chave e destrancou a porta saindo comigo para o quintal. Na varanda eu me perguntei; aonde ela iria? Faz pouco tempo que chegou na cidade, não deveria conhecer muito bem. Pensei em todas as outras vezes que escutei barulhos e pensei nela. Depois encarei-a segundo um riso covarde enquanto admirava. Era inegável. Ela era bonita.
Eu sem dar explicação fui até a garagem e peguei minha bicicleta, não sem antes derrubar algumas tralhas e me desesperar com o som alto que causou no eco da noite. Algumas corujas estavam ali, empoleiradas nos palanques erguidos, alguns grilos cantavam e os passos no gramado molhado de orvalho eram a nossa sinfonia noturna. Então ela foi ver o que eu estava fazendo. Me encontrou num pequeno galpão atrás da garagem com as mãos engraxadas, com o olhar um tanto curioso encarando a correia da bicicleta. Engatei-a e torci para que ela não soltasse. Limpei as mãos na calça azul escuro e agarrei os guidões levando-a para a luz.
— Certo, nosso transporte — falei.
Então levei a bike até o final da garagem, e subi. Meus pés ainda estavam no chão firmando o peso, mostrei a ela os suportes que havia colocado para levar Marcos comigo — é claro, quando a bike dele estava quebrada, o que era de costume para ele que gostava... digamos... de sentir adrenalina. — Eram dois suportes para pés. Ela se firmou ali, firmou o par de all star nos suportes e as mãos nos meus ombros levemente tensionados. Ela não aparentava estar nervosa como eu, e não só aparentava como realmente estava segura, como na maioria das vezes, mas não em todas. Ouvi o som da sua respiração e senti o cheiro do seu perfume e do cabelo roçando nos ombros. E então pedalei. Peguemos a estrada e percorremos toda aquela avenida, o chão de paralelepípedo e o escuro daquela noite, o que nos iluminavam era os postes e as vezes, quando eram distantes tínhamos alguns segundos de escuridão e incerteza do que nos cruzaria a esquina. Eu estava com medo não vou negar, não costumava sair de casa a noite. Minha mãe era rígida com a regra número dois (que ficava antes de; nomenclatura para os mais velhos como Sr. e Sra. E depois de; se atrasar par o jantar. Essa lei era; dormir antes das 10h00), na verdade eu não me importava muito porque não se haviam muitas coisas para s fazer a noite. Bem, haviam sim, mais todas eu ou não conhecia, não me atraia ou eu não era permitido. Eu gostava muito de quando era criança e ficava na casa de Carlos, seu pai assistia televisão (aliais! Ele tinha uma televisão, o que já era impressionante por si) e deixava-nos jantar primeiro a sobremesa, porque falava que a sobremesa não precisava esperar tanto se no final iremos comer as duas coisas. Às vezes eu queria ter o pai de Carlos. As vezes ele desejava ter o meu. Mas nunca falávamos isso um para o outro.
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Dias Longos
RomanceDias longos, temperatura alta e água do mar. Os verões eram sempre assim, até que ela chegou, mudou completamente a minha vida e me fez sentir coisas que nunca havia experimentado. Ousei ama-la.