Capítulo Treze - Arrepios.

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Você.

Era difícil explicar como estava funcionando a dinâmica Olive-Ian uma semana após a maldita sentença de Franklin. É claro que nós sabíamos que o que nosso chefe havia dito não nós vinculava, não era definitivo e, no fim, nós dois faríamos o que quiséssemos, mas a falta de perspectiva de resolvermos a situação, misturado com as faíscas que nossa proximidade causava, estava deixando nossa convivência ainda mais insuportável, como se (aqui citando o maior clichê de todos os tempos) fôssemos fogo e gasolina.

Uma hora um consumiria o outro ou, bem, haveria uma explosão.

É claro que eu tinha ciência de que Hillary Simmons, sendo o piolho de fórum que era, já tinha orientado Ian a procurar a justiça para processar a mim e o condomínio pelo erro crasso que tinham cometido, então, de certo modo, eu tinha que agradecer a ele por estar dando tempo para que nós dois resolvêssemos a questão de forma amigável, sem as brigas e custas caríssimas de um processo judicial.

Sendo bastante honesta, eu não apenas odiava Ian, como foi durante os anos da infância/adolescência. Eu ainda sentia, é claro, vontade de socar sua cara de pêssego, mas, no fundo, bem no fundo, para além da camada do pré-sal e mais, eu estava começando a não odiar algumas coisas sobre Ian Simmons.

Fora o fato de que ele simplesmente não parecia surtar com higiene (ou a falta dela), eu tinha notado que ele estava se esforçando para cuidar das coisas e não me matar de raiva - embora eu sempre, absolutamente sempre, estivesse com raiva dele.

Mas era divertido vê-lo fazendo abdominais de manhã, ainda que ele sempre acabasse dormindo no chão eu tivesse que acorda-lo aos berros para que ele não ficasse desempregado (mesmo que Franklin jamais fosse demiti-lo de verdade); ele tinha umas pintinhas bonitas no rosto, bem clarinhas, nas bochechas e no nariz - elas também se estendiam pelos ombros e pelo peito dele, como pequenas constelações.

Ian as odiava, é claro, mas elas realmente eram adoráveis.

Eu também gostava da forma como ele cuidava de Jessie, embora ela parecesse estar sempre vagando no limiar entre amar e odiar Ian - não que ele percebesse que sua amiga claramente tinha uma queda por ele, porque ele a via como uma espécie de irmã, o que também era, tipo, fofo.

Mas a parte ruim sobre Ian Simmons, ultimamente, estava sobressaindo de forma muito mais intensa. Nós brigávamos o tempo todo - na firma, em casa, em qualquer lugar onde dividíssemos o mesmo ar (o que inclui o planeta). Talvez nós conseguíssemos parar de brigar se um de nós tivesse uma passagem sem retorno para fora da Via Láctea.

Dessa forma, fazia uma semana da sentença e também uma semana que eu estava lutando contra a minha vontade insana de cometer homicídio doloso, com certeza com alguma qualificadora.

Sentei na cadeira do trabalho que ficava na frente do meu monitor preto e comecei a ler os novos briefings que tinham chegado para o desenvolvimento de propagandas, apenas para organiza-los junto com os outros que já estavam em andamento.

Assim que me distraí lançando os prazos, ouvi os passos apressados e a respiração pesada de Ian, anunciando que ele estava chegando, mais uma vez, em cima da hora. O relógio no canto do monitor marcava 8:03h.

— Bom dia. — Ele disse, arfando, e eu o ignorei solenemente.

Eu não sabia o porquê, mas estava irritada pela sua simples existência, como sempre.

Ian esperou por uns dois segundos após de jogar na própria cadeira.

— Você não morre se me responder. — Disse ele, mal humorado. — Acho até mais provável que você morra engasgada com o seu veneno se ficar, sabe, guardando na sua boca fechada.

Você e Eu (Concluído).Onde histórias criam vida. Descubra agora