Quando abri os olhos foi impossível não fechar logo em seguida e soltar um longo gemido de descontentamento. Como eu pude esquecer de fechar as malditas cortinas antes de me deitar quando chegou em casa?
Bom, não que eu estivesse em condições de fazer muita coisa além de fechar a porta do apartamento e me deitar – ou me jogar – na cama, sem nem mesmo tirar as roupas ou tomar banho.As cenas da noite anterior passavam como um borrão pela minha cabeça. Lembrava apenas de poucos elementos sem sentido: eu chegando com Mark e Chelsea, o gosto de cerveja na boca e depois de estar transando com alguma garota no banheiro masculino (ou feminino? Não me lembrava disso também). Por breves segundos meu coração parou e senti um frio absurdo na barriga. Será que transei com Chelsea? Mas o sentimento passou logo em seguida. Nunca faria isso com meu melhor amigo, nem mesmo bêbado. Ele era a única pessoa que eu tinha na vida, já que não via minha família há anos, depois que minha mãe morreu. Nem lembro ao certo como e quando cheguei a conhecer o Mark, mas desde então nos tornamos inseparáveis, mesmo um sendo o total oposto do outro. Éramos como irmãos, mas sem aquela parte toda do sangue.
Finalmente tomei coragem para abrir os olhos novamente e olhei no relógio digital na mesa de cabeceira ao lado da cama, que marcava 15:44 da tarde. Isso sempre acontecia quando eu passava da conta com a bebida.
Levantei lentamente e tirei minhas roupas, que fediam a suor, bebidas e perfumes misturados – provavelmente o meu e o da garota com quem eu havia transado. Céus. Não lembrava de muita coisa, mas aparentemente uma parte de seu corpo lembrava daquela mulher, já que já estava dando sinal de vida.
Ignorei as reações incômodas do meu corpo e atravessei o corredor em direção à cozinha, sonhando com um grande copo de água gelada para ajudar naquela merda de ressaca. No caminho encontrei Chelsea e Mark deitados seminus no chão e não pude evitar uma risada. Nem ao menos sabia que eles tinham dormido lá. Parei no meio do caminho e fui buscar um lençol no quarto para cobri-los. Não era obrigado a ficar vendo bundas indesejadas àquela hora da "manhã".Mais tarde naquele dia (que já estava no fim), quando estavam todos acordados e bem, nós três decidimos que devíamos sair para comer na feira que acontecia ali perto. E fomos. No caminho até lá eu não consegui parar de falar na garota misteriosa da balada, nunca havia me sentido daquele jeito antes e ela não saía da minha cabeça.
– Eu tô falando pra vocês – eu insistia – ela era perfeita!
– E como você sabe disso se nem lembra da cara dela? – Chelsea perguntava em meio a um olhar irônico.
– Confio no meu taco. – E assim os três caíam na risada, como um bando de idiotas.
A feira tinha um charme todo especial. Haviam vários food trucks dispostos em um círculo com várias mesas no meio e a iluminação era feita com aquelas luzinhas de led que as pessoas costumam pendurar no natal, mas amarelas. Sei lá o nome disso. Paramos na fila de uma banca de hambúrgueres e, enquanto esperávamos para ser atendidos, Mark deu uma ótima ideia:
– Você precisa de alguém pra te fazer esquecer dessa garota, que eu até agora acredito que seja um delírio da sua cabeça.
Eu não quis responder. E nem consegui.
No momento seguinte à declaração de Mark, eu prendi meu olhar na fila ao lado. Mais especificamente a uma garota na fila ao lado. Ela segurava um grande livro roxo nas mãos, com uns símbolos estranhos que pareciam ser de astrologia ou algo assim, nunca entendi muito sobre esse assunto e nem acreditava. Sua pele reluzia na luz do local e seu olhar era penetrante, mesmo que ela estivesse distraída olhando o cardápio. Eu tentou várias vezes falar alguma coisa. Sério. Abria a boca e puxava o ar, mas nenhuma palavra parecia ser digna e adequada para o momento e eu me sentia um adolescente sardento de novo. De repente a garota pareceu sentir o desconforto e olhou para cima, diretamente para mim.
– Oi – ela falou com um sorriso. Ou melhor, o sorriso. – Meu nome é Kate.
– Prazer em te conhecer – foi tudo o que ele consegui responder. Ela deu risada da minha reação e tirou um papel da bolsa e escreveu alguma coisa, em seguida entregou para mim.
– Você não parece estar muito bem agora, me liga e a gente conversa depois.
Ela disse e simplesmente saiu dali com uma amiga ao seu lado – que eu inclusive só tinha percebido a presença naquele momento. Foi amor à primeira vista, sem dúvidas.
– Gostosa – Chelsea falou enquanto pegava os lanches com o atendente.Foi só quando sentaram à mesa que eu consegui dizer algo:
- Isso aconteceu mesmo?
– É. Parece que você encontrou alguém pra te fazer esquecer da garota misteriosa e enquanto isso me fez querer morrer de vergonha alheia. – disse Mark enquanto me abraçava de lado.
Peguei o pedaço de papel, que já estava amassado em minha mão, e li o que estava escrito nele. Era um número de celular e um recado que dizia:Me liga pra gente se divertir.
Senti meu corpo todo se arrepiar com a ideia de me divertir com Kate e, sorrindo, guardei o papel no bolso do casaco.
– Parece que encontrei mesmo. E da próxima vez vai ser diferente.
Depois de comer cada um foi pra sua respectiva casa e eu foi diretamente do banho para a cama, com meu casaco na mão para adicionar o número de Kate à minha lista de contatos e mandar uma mensagem pela manhã. Olhei em um bolso, nada. Olhei no outro bolso, nada. Apreensivo, fui atrás da minha calça, no cesto de roupa suja. Olhei em todos os bolsos, nada. Será que eu tinha sido tão burro assim? Não pode ser. Peguei meu celular e comecei a conversar com Mark.
Cara, você por acaso pegou o papel da Kate?
e pq eu faria isso?
Pra tirar uma com a minha cara.
eu tenho a minha mina agora e não iria fazer isso com vc
oq aconteceu?
Não acho o papel em lugar nenhum.
vc é mt burro pqp
amanhã eu vou aí te ajudar
Bloqueei o celular, bufando. Não acreditava que tinha conseguido aquela proeza. Sempre fui muito organizado e cuidava bem das coisas, e fui perder justamente o número do amor da minha vida. No dia seguinte eu e Mark reviramos a casa e refizemos nossos passos até a feira. Não encontramos o bendito papel. Eu até tentei procurá-la em todas as redes sociais conhecidas por mim e por Chelsea (que estava me ajudando à distância), mas não encontramos nada. Ela tinha evaporado. Era a única explicação possível.
Nas duas semanas que seguiram, eu não conseguia parar de pensar em Kate. Seus cabelos pretos e enrolados, o corpo forte e as maçãs do rosto perfeitamente arredondadas. Estava ficando maluco. Como uma garota podia ter tanto efeito sobre mim com um contato que não durou nem 5 minutos? Nunca acreditara em amor à primeira vista. É bobagem, eu dizia. Mas com certeza era nessa situação que eu me encontrava. A cada segundo do dia, era nela que eu pensava. Sonhava com seu toque e antes de dormir eu sentia sua presença, seu perfume. Estava enfeitiçado e decepcionado comigo mesmo.
No momento mais aleatório possível – estava voltando para o trabalho depois da hora do almoço – foi quando aconteceu o impossível: eu vi Kate. Bom, mais ou menos. Na verdade era a amiga dela que estava junto na fila, no dia da feira. Era um passo mais próximo do meu objetivo.
Sem pensar duas vezes, eu acelerei o passo até chegar na garota de cabelos ruivos.– Oi! Você é amiga da Kate, né?
Revirando os olhos, ela tirou os fones de ouvido para falar comigo.
– Primeiramente: quem é você? – Com certeza ela não era tão doce e simpática quanto Kate.
– É claro, me desculpe. Muito prazer – eu estendi a mão, cumprimentando-a – meu nome é Nathan. Nos conhecemos na feira, duas semanas atrás.
– Ah, sim. Me lembro de você – ela contribuiu o aperto de mão – meu nome é June. O que você quer?
– Eu perdi o número dela. Será que você pode me passar ele de novo? – Perguntei esperançosamente.
– Não – ela respondeu de forma simples e seca. Ai!
– E por que não?
– Olha, eu não quero decepcionar seu ego masculino ou qualquer coisa do tipo. Mas você deveria esquecer a Kate. Eu já vi ela fazer isso com milhares de homens, milhares de vezes. É o que ela gosta de fazer. Conquistar. Qualquer lugar que a Kate vai ela pode carregar uma multidão sem esforço nenhum e é isso. – Esperou alguns segundos pra falar a última parte: – Ela nem deve lembrar quem você é agora.
Pigarreei de leve. Quem essa garota pensava que era?!
– Bom, então é melhor você ficar fora do meu caminho, porque ela não sai da minha cabeça e eu vou dar um jeito de encontrar essa garota com ou sem a sua ajuda.Dito isso, segui meu caminho e terminei meu dia de trabalho em uma paz surpreendente. Agora estava com uma determinação totalmente nova. Fora desafiado e Nathan Turner nunca perde um desafio sem pelo menos lutar até o fim. Kate logo seria minha.
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Above the noise
RomanceA partir de que ponto um amor à primeira vista se torna obsessão? Kate, uma simples dançarina, começa a sentir essa dúvida na pele a partir do dia no qual resolve ir a uma festa com suas amigas e conhece Nathan. De início ela o ignorou, não era de s...