Capítulo 1

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Depois que chegamos do show, Dulce simplesmente desapareceu. Não sei para onde foi. Disse que tinha que resolver algo, e saiu andando do hotel em suas botas de vinil. "Por favor, não me siga." foi o que ela me disse pedindo para que eu a procurasse se ela não tivesse me acordado para dizer que tinha chego. Tentei perguntar o que estava acontecendo, mas não adiantou. Ela antes de sair só segurou minhas mãos, respirou fundo, me olhou nos olhos e disse com lágrimas nos olhos palavras que eu queria que ela dissesse em outra situação. "Eu te amo Chris." Depois disso ela beijou meus lábios, pela primeira vez, não literalmente, já tínhamos nos beijado durante as gravações da novela, e durante alguns shows. Mas dessa vez foi ela. Eu a amava. E ela sabia disso. Nunca disse, mas ela sabia. Assim como eu sabia que ela também me amava.
Mas ela falou. Olhou nos meus olhos e me falou. E quando separou nosso beijo, enquanto meu coração ainda estava acelerado com a ideia de estarmos em contato daquela forma, sem a necessidade de um roteiro, quando fui responder, pedir para que não fosse a lugar nenhum, ela tapou meus lábios com os dedos e repetiu o que já tinha dito. "Não me siga. Me procure se eu não voltar ao amanhecer." e saiu do quarto.
Fiquei completamente atônito. Não sabia o que fazer. Meu cérebro parou quando ela disse aquelas quatro palavras. Quando a porta fechou permaneci parado por alguns instantes, antes de ir atrás dela. Quando cai em mim e abri a porta, ela não estava mais nos corredores escuros do hotel. Andei rápido até a varanda e pude ver ela andando devagar na direção da esquina direita. Desci correndo os degraus da escada do hotel, não podia esperar pelo elevador. Seja lá o que ela estivesse indo fazer, achava que não iria voltar, e me pediu para que a procurasse.
Dulce era, ou melhor, é a minha melhor amiga. A mulher que mais amei, e que nunca admiti por medo de perder nossa amizade. Em um segundo, achei que agora a teria para mim para todo sempre, e a ouvi dizer que me amava, e no próximo, saindo correndo para a recepção do hotel, já não via mais sua sombra. Estávamos em um hotel diante a praia, e eu não sabia se ela tinha ido para a orla, se tinha continuado reto na direção que antes andava, se tinha virado a esquina. Em um instante a tinha para mim, e no seguinte tinha a perdido. Tentei gritar o nome dela, mas foi em vão.
Dulce sempre foi levemente misteriosa, sabia que ela escondia algo, e que não diria isso para ninguém. As vezes sumia, mas sempre durante o dia. E sempre sem avisar. Mas não dessa vez. Ela veio até mim. Quase que em uma despedida. Meu coração apertou enquanto não vi nenhum vulto nas ruas que pudesse seguir na esperança de que fosse ela. Após alguns minutos andando no escuro, me convenci de que não a encontraria, s voltei pra o hotel. E então eu esperei.
Já eram quase meia noite, e não desgrudei o olho do relógio. Não consegui ver TV. Não consegui ler meu livro. Não consegui fazer nada. Só podia encarar o celular, e em seguinte a porta, aguardando que o trinco se mexesse, ela entrasse e me dissesse "te amo e sou tua". Mas isso não aconteceu. O trinco permaneceu parado. Uma hora se passou. No seguinte duas, e depois três. Quatro da manhã, e nada de Dulce.
Sai do meu quarto e fui até o dela, na esperança de que ela tivesse so esquecido de me avisar que chegou. Mas ela não estava deitada na cama, com os cabelos vermelhos jogados por todos os lados, e o rostinho amassado com a boca levemente aberta. A cama estava intacta. A cada segundo meu desespero aumentava. Comecei a imaginar situações horríveis.
Voltei para meu quarto e liguei no jornal local, esperando não ver "corpo de cantora Dulce Maria é encontrado boiando em Puerto Vallarta". Para minha sorte, ou talvez azar, a manchete não apareceu. Continuei esperando. Olhei no relógio mais uma vez, e agora já era quatro e meia da manhã.
Meu celular tocou. Voei para pega-lo, esperando que fosse Dulce, mas não era. Era um número desconhecido. Nunca atendo nessas situações. Fãs descobrem nossos números o tempo todo, e basta atender uma vez, para ter que trocar de chip. Aprendendo com os próprios erros. Mas o número continuou ligando. Duas, três vezes. Desligaria o celular, mas esperava a mensagem de Dulce.
Coloquei o celular no silencioso e tentei ignora-lo. Oito, nove ligações. Peguei o celular, e tentei ver de onde era. Não era um celular pessoal. Parecia um número de orelhão. No terceiro toque, da décima segunda ligação, eu atendi. E a voz que eu mais queria ouvir chamou pelo meu nome em quase um sussurro.
"Chris. igreja. guadalupe." Me desesperei. Comecei a chamar por seu nome tentando entender se estava tudo bem. ouvi um soluço fraco, e sabia que ela estava chorando. gritei por ela mais uma vez. "chris. socorro." ela disse com a voz falhada e ouvi uma batida forte, provavelmente do telefone sendo largado. continuei na linha chamando por ela, mas nada aconteceu. okay. ela me disse um total de 4 palavras, e delas só uma eu realmente queria ouvir saindo de sua boca, o meu nome. mas não no tom em que foi dito.
a última palavra me arrepiava a cada vez que a ouvia. "socorro". com uma falhada de voz no meio. tentei raciocinar o mais rápido que pude. igreja. guadalupe. não conhecia a cidade. meu próximo instinto foi digitar no Google o nome da cidade seguido por essas duas palavras, e logo encontrei o que eu achava que era uma pista de onde ela estava.
A igreja de nossa senhora de guadalupe. Era no centro. Talvez isso explicasse o porque ela demorou tanto para ligar. Mas o que foi fazer lá? E porque estava pedindo socorro de frente a uma igreja as cinco da madrugada? Não tinha tempo para pensar sobre isso. Desci novamente para o saguão do hotel e pedi para alugar um carro. Liguei o gps e dirigi a quase 200km por hora até chegar onde ele me indicava.
Quando estava chegando mais perto, consegui reconhecer o orelhão que provavelmente estava sendo usado para ligar no meu celular. Mas não via Dulce. Estava andando a uma velocidade ridiculamente alta, mas cada segundo demorava uma hora para passar. Então eu vi, aos pés do orelhão, parecendo mais uma boneca de pano do que qualquer outra coisa, Dulce completamente dobrada sob seu próprio corpo.
Parei o carro no meio da rua, e desci correndo até ela. Chamei seu nome mas ela não respondeu. Ela estava suja. Machucada. Não estava mais com a calça jeans que usava, suas pernas estavam nuas no vento gelado da madrugada. Seria esse outro momento, teria analisado cada pedaço de sua pele.
Mas queria apenas saber o que diabos tinha acontecido. Sua camiseta comprida estava tão suja quanto resto de seu corpo. Era minha. Ela roubou essa camiseta meses atrás quando desceu até meu apartamento pedindo pra dormir comigo porque estava com medo. Ela ainda estava com as roupas do show daquele dia, então dormiu com minha camiseta branca com o símbolo da casa Targaryen em vermelho nela. algumas das manchas vermelhas não estavam ali antes. Me abaixei até ela novamente, puxando seu corpo para trás, fazendo com que ela estivesse sentada no chão, seu corpo estava gelado.
"Dul... o que aconteceu?" perguntei sem resposta enquanto pegava seu corpo pequeno no colo e me levantava, tentando levá-la até o carro. ela não estava desmaiada. a coloquei sentada no banco do carona e afivelei seu cinto. Dei a volta rápido me sentando no banco ao lado dela e toquei seu rosto devagar, seus olhos encaravam o nada, e sua boca estava semi-aberta. "Dul...?" tentei mais uma vez e ela negou devagar com a cabeça. "Chris... só me tira daqui." ela disse e eu assenti com a cabeça, tentando livrar minhas cabeças das perguntas, e levá-la de volta ao mais próximo de casa que tínhamos no momento, que era o quarto de hotel.

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