A Garota que Morava nas Estrelas

I

***

EU ESTAVA SALIVANDO olhando para os doces e bolinhos que meu tio, John, tinha acabado de fazer. Eu o invejava por conseguir fazer tamanha coisa sem muito esforço. Na verdade, invejo a minha família inteira. É negra, e conseguiu tudo o que temos lutando todos esses anos, e daqui a pouco serei eu a sustentar uma família, mas isso só se eu for capaz...

— Annie! Tu tiraste nota ruim de novo no treineiro querida? Como é que tu-

— Como você vai conseguir passar em alguma faculdade desse jeito? - A interrompi, cinicamente. - eu sei mãe, mas acho que não depende só de mim, parece que tem alguma força do universo me impedindo disso.

— Para de drama garotinha, eu na sua idade tirava mais nota que você. — revirei os olhos com o comentário do meu tio, que estava se empanturrando de bolinhos, mas não julgo, não é como se eu não estivesse fazendo o mesmo.

— Isto és feitio do Dabi, isto sim! Desde que tu começaste a namorar aquele rapaz tu nem sais mais com a tua família, ora... — minha sobrancelha se ergueu.

— Calma lá né mana, o moleque é gente boa. — meu tio, ao menos, falou algo que eu concordo. Dabi é gente boa, gente linda, gente gostosa, gente tudo.

— Tu que pensas, meu filho, tu piscas e ele ó... — ela fez um gesto de explosão com a mão direita, enquanto segura um copo de Coca com a esquerda — desaparece.

— Mãe! Mais respeito por favor!? Esse ano eu quero mudar, a senhora precisa também! — eu já estava cansada disso.

Nós três fizemos a típica cara de decepção: minha mãe comigo, eu com a minha mãe e meu tio com ambas.

Terminei o café da tarde tão estufada que se eu fosse uma pessoa que engordasse muito rápido, eu não sei o que faria. Mas isso não impede que a deliciosa camada de açúcar dos doces me traga uma tal de diabetes.

Logo tomei um remédio para gases, e fui me arrumar para uma saída com Dabi. Ele é meu namorado, tem cabelos castanhos escurecidos, uma covinha mágica no canto esquerdo da boca e olhos iguais aos cabelos. Nem preciso falar do sorriso né?

E lá ia eu para mais uma jornada, arrumar meu cabelo trabalhoso e ficar pronta em 30 minutos, coisa que não ia acontecer.

* Whatsapp *

7:03: Amor, vô chegar atrasada

7:04: E quando é que vc não atrasa?

7:04: Engraçadinho vc...

7:05: Te vejo lá bobo ❤

7:05: Até bobo❤

* Whatsapp *

Nos chamamos assim, sempre! (Se pronuncia bubu).

O que significa talvez eu nunca vá saber, mas começou quando eu errei a pronúncia da palavra bobo (bobo de sonso, desengonçado), e desde então ele nunca parou de me chamar assim, e eu não ia ficar para trás, né?

Passei o perfume completamente amadeirado e doce ao mesmo tempo e coloquei meu coturno bege que combinava com o look: calça jeans e moletom amarelo alaranjado. Peguei uma bolsinha qualquer que estivesse jogada pela casa e saí correndo de casa para pegar o ônibus.

— Vai com Deus minha filha, se transar apanha! — ri igual uma condenada, isso não vai acontecer antes dos meus 20 mas nem que a vaca tussa!

Ouvi minha mãe falar mais alguma coisa, mas já estava longe e mal consegui ouvir, espero que ela não fique brava. Cheguei a tempo no ponto de ônibus; e quando entrei, ouvi alguns comentários de duas mulheres pelas quais eu passei — elas falavam sobre o quanto eu estava cheirosa. E eu devia estar mesmo, visto que era um perfume importado que Dabi havia me dado, além de que dentro de um ônibus como aquele, fedido que só, qualquer perfume chamaria a atenção.