Marionete

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O dia anterior após estudarmos mais algumas horas foi algo bem rotineiro, voltei para casa como sempre exausta e depois de comer e tomar um banho, capotei na cama.

Quando acordei com um barulho alto de vidros se quebrando, olhei para fora da sacada vendo os motivos de toda aquela gritaria: meu tio havia chegado em um carro junto de um amigo e pelo que entendi, ele havia vindo buscar mais dinheiro para gastar em bebida.

- Seu sem vergonha! Vai lá com esses canalhas que tu chama de amigos e some da minha frente!- Minha tia gritava na janela enquanto o homem em vão tentava abrir a porta trancada- Ou você sai daqui ou vou mandar os cachorros correr atrás de você!

Lembrei brevemente que na chácara havia cachorros, mas que eu quase não os via na região e quando acabávamos nos esbarrando, era totalmente ignorada. Triste.

Me apoiei no parapeito da sacada vendo de camarote os homens virados na bebida tentando voltar para dentro do carro a gritos de ameaças, o barulho estava muito mais alto e irritante que o costume e tocando meu ouvido, notei que estava usando meus abafadores e isso me preocupava.

O restante da manhã somente reforçou o que havia imaginado: estava mais sensível ainda que o comum e isso está me deixando louca. Tirei os protetores auriculares para fazer a limpeza e enquanto não secavam, estava escutando todo aquele barulho e cantoria que minha tia tinha aparentemente costume de fazer enquanto estava fora de casa.

Decidi ligar para minha mãe, fazia um tempo que não mandava mensagem para ela e isso era culpa minha e dos dias agitados que estava tendo.

Peguei meu celular, olhei à hora e liguei para minha mãe que não demorou muito para atender.

- Oi?- Falei com o celular encostado na bochecha- Mãe? Se lembra que ainda tem uma filha?

Alô? Quem tá falando? Não tenho filha nenhuma. Falou a voz feminina do outro lado da linha.

- Ha Ha, que engraçado em, mãe?- Sai para a sacada onde encarei a floresta ao longe.

Ué? Lembrou que tem mãe, foi?

- Desculpa, estava tendo dias muito agitados- Se você soubesse o que eu passei durante esses dias, me internaria em um hospício.

O pai está te mandando um oi.

- Fala pra ele que também estou mandando um oi e que não arrumei nenhum namorado, ainda- Zombei.

Minha mãe gargalhou por um tempo e o som que o celular estava fazendo parecia que ela havia colocado no modo viva-voz.

Seu pai ficou bem vermelho, mas agora falando sério, como anda sua ansiedade e seu problema com ruídos?

- Eu ando muito afastado de humanos, sabe como é, evito comer quando minha tia está comendo também e como passo maior parte do meu dia fazendo altos nada andando sem rumo, não percebi muita coisa... Mas por algum motivo parece que estou um pouco mais sensível que o normal, eu não sei...

Entendo... espero que melhore e tente evitar se isolar muito, ok minha princesa?

- Entendi, vou evitar.

A mãe vai desligar por que deixei o arroz no fogo, mas se cuida e liga mais vezes, estamos morrendo de saudades.

- Também estou e sim, vou ligar mais vezes- Falei antes dela se despedir e encerrar a ligação.

Me mantive um tempo jogada na cama antes de decidir sair e pegar algo para comer. Na cozinha ouvi minha tia cantarolando enquanto comia batatas fritas de uma marca qualquer, corri para pegar tudo o mais rápido possível antes daquilo me irritar e torturar ainda mais.

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