Prólogo: Entre babados, lacinhos e frango com salada

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Era a décima vez que eu passava por aqueles corredores olhando ao redor, me certificando de que não havia ninguém por perto. Não desejava ser visto naquela situação. Seria ainda pior se alguém resolvesse tirar fotos ou chamar a atenção dos seguranças da loja. Sem mencionar a probabilidade de algum conhecido surgir dos confins do inferno e me ver ali, afinal, as pessoas mais indesejadas sempre surgem nas horas mais inoportunas.

Eu estava com medo. Não, medo é o que sinto quando tenho que andar naqueles malditos elevadores panorâmicos, onde colava na porta metálica, observando meu reflexo desfocado, evitando olhar através do vidro, rezando para que meu destino chegasse logo. O que eu sentia no momento era algo mais parecido a pânico mesmo. Não era para menos, eu estava na droga da seção feminina, mais precisamente, a seção de roupas íntimas, muito bem sinalizada pelas diversas placas e imagens de mulheres usando lingeries.

E para todos os efeitos, sou um homem de vinte e dois anos.

Se alguém me visse com alguma daquelas peças em mãos, certamente pensaria que eu era algum tipo de tarado com fetiches estranhos. O que não deixa de ser uma meia verdade, mas nesse caso, essa definição não me pertence. Ok, talvez um pouco, muito pouco mesmo, vale ressaltar. Porém, eu não vim aqui por vontade própria. Melhor dizendo, eu não vim aqui – somente – pela minha própria vontade.

Kim Taehyung. Esse é o nome do responsável por eu estar quase vomitando tteokbokki com salada sobre as calcinhas com estampa de oncinha à minha frente. E que isso não aconteça, pois seria um sacrilégio contra aqueles babadinhos em renda na cor verde piscina que enfeitavam a barra superior delas. E porra, ainda tinha o lacinho preto em veludo. Se eu vomitasse naquele lacinho fofo, eu mesmo me enforcaria com aquela cinta-liga linda à minha esquerda.

Recuperando o foco...

Amanhã, completaremos dois anos de namoro, curiosamente no mesmo dia em que Taehyung nasceu. Duas comemorações e um episódio de loucura. Então, resolvi ceder aos pedidos insistentes do meu namorado e fazer de vez aquela surpresa a ele. Arrependimento é o que sinto por ter confessado a Tae que gostaria de ser mulher por um dia, somente para poder me vestir com roupas femininas sem risco de ser julgado.

Depois disso, ele tem me infernizado constantemente, suplicando para me ver usando uma lingerie. Sim, eu cavei minha própria cova e agora estou comprando meu caixão. Pois bem, já que estou indo ao funeral da minha "masculinidade" – e talvez da minha dignidade, se algo der errado – pelo menos farei questão de escolher um conjunto que faça Tae gozar só de me olhar.

O problema é que, embora meu cérebro esteja fervilhando em excitação, meu corpo está explodindo em vergonha. Eu poderia ter comprado tudo pela internet e isso me pouparia de todo esse sofrimento, porém a possibilidade de ser enganado e receber um produto de péssima qualidade era ainda pior do que ser visto naquele momento pelo meu chefe.

Mas que isso não aconteça, amém.

Sempre me identifiquei como homem, nunca tive problemas sérios com meu próprio corpo e em nenhum instante desejei ser diferente fisicamente. Entretanto, saias, vestidos, babados, calcinhas, rendas, corpetes, cintas-ligas e coisas do gênero, pareciam sussurrar docemente no meu ouvido um "me use" bastante sedutor.

Consegui segurar esse desejo por longos anos e me sinto orgulhoso por nunca ter assaltado o guarda-roupas da minha mãe. Mesmo que ela nunca tenha me dado motivos para isso, já que a maioria das suas roupas parecia inspirada em alguma coleção de moda para agricultores. Uma coisa realmente pavorosa e fora da tendência de qualquer parte do planeta, com exceção das fazendas, é claro.

Na verdade, as vestes femininas do dia a dia não eram uma tentação tão grande. Eu até sentia vontade de usá-las, mas não era nada comparado ao pecado maior. As benditas – ou malditas, dependendo da interpretação – peças íntimas. Não sei se era culpa das rendas, das estampas fofas ou dos majestosos lacinhos, ou se simplesmente era a junção de tudo aquilo. O fato é que, desde do início da minha adolescência, tenho uma fascinação por elas.

A cinta-liga nos uniuWhere stories live. Discover now