utopia

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O quarto era branco.

Da janela, a luz do sol invadia o quarto, deixando tudo extremamente claro. Desacostumada a tanta luz, fechei os olhos com força e rolei sobre o colchão macio em busca de calor. 

Surpreendentemente, o outro lado da cama não estava só aquecido, mas também ocupado. 

Ele estava deitado de bruços, as costas nuas. A luminosidade não parecia incomodar seu descanso, pelo contrário, parecia que estava ali só pra ele. O cabelo escuro, que há algum tempo não via corte, estava bagunçado, se derramando por seu rosto.

Me aproximei mais um pouco e, com delicadeza, as pontas dos meus dedos tocaram seu rosto. Primeiro as bochechas, então seguiram a linha do maxilar até o queixo. A boca estava entreaberta e, com o polegar, toquei seus lábios macios.

Passado algum tempo, seu rosto se contorceu levemente em uma careta. Enquanto abria os olhos e observava o ambiente ao redor, recolhi minha mão para longe de seu rosto. Parecendo despertar sua atenção, seus olhos me encararam.

O rosto inchado não deixava de ser belo, angelical até. Traços finos. Pele sem manchas. Como se esculpido pelo melhor dos artistas.

Meus olhos encontraram os seus e, mesmo que eu quisesse, não conseguiria desviar. Mesmo que seu rosto estivesse inexpressivo, os olhos sempre transmitiam coisas demais e não estavam diferentes agora. Eles sempre me diriam a verdade. E também sempre me deixariam confusa. Eles sempre pediam alguma coisa, mas eu nunca conseguia entender.

Tentando juntar coragem pra falar, inspirei fundo como se fosse falar muitas palavras de uma vez só, mas o ar entrou e saiu e nenhuma palavra se foi com ele. Sorri envergonhada e pude ouvir uma pequena risada vindo dele. 

Seus olhos sorriam pra mim. Era a coisa mais linda que eu já tinha visto.

Repetindo meus movimentos, ele afastou meu cabelo dos olhos e tocou meu rosto. Sua boca se abriu e ele disse alguma coisa. Alguma coisa que foi abafada pelo barulho do meu despertador. 

Me levantei para desligar o dispositivo que berrava sobre a mesa e, enquanto fazia esse percusso, tardiamente percebi que tudo tinha se desfeito, ido embora como poeira ao vento e eu fora arrastada de volta a realidade do meu quarto pouco iluminado pela luz que vinha de fora. Agora eu estava atrasada pros compromissos do dia.

Mesmo sabendo das possíveis consequências, tentei inutilmente voltar àquele lugar.

O despertador tocou de novo e eu me levantei frustrada me perguntando se eu não poderia apenas fechar os olhos e voltar à minha utopia. 

sunset • sonhos de verãoOnde histórias criam vida. Descubra agora