O reino das águias

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Helena estaria mentindo se dissesse que não sentia falta de casa. Aquela área do Império Búlgaro era estranha... Já havia passado pelo litoral, onde o clima era quase quente demais – e onde, agora, se arrependia de não ter passado mais tempo explorando as praias e indo atrás das sereias que os locais diziam existir naquelas águas -, mas onde estava agora era frio, apesar de longe de ser o frio da Escócia no meio do inverno. E ela sentia falta daquele frio, daquela umidade e daquele cheiro de terra e mato.

Mas não podia voltar agora. Depois de quase seis meses – ou havia sido mais? -, não podia voltar para Hogwarts, mesmo já tendo muito material coletado em suas pesquisas, material suficiente para pelo um livro sobre tradições e práticas mágicas dos lugares por onde passara. Depois do Império Búlgaro, seu destino seria o Principado de Kiev, afinal, não iria viajar por todo o continente e não ir ver as florestas de bétulas sobre as quais seu pai falava ou os homens que dançavam com as espadas sem que estas nunca os tocassem.

Agora, no entanto, tinha aquele lugar. Que estava longe de ser as paisagens tão conhecidas de Alba, mas ainda continuavam belas, como a enorme montanha que avistava das margens da cidade onde estava se hospedando no momento.

"É o lar de um gigante," disse a mulher do estalajadeiro na segunda manhã que passava ali, enquanto olhava pela janela do lugar e observava a paisagem. "Ele protege a cidade."

"Um gigante?" Helena arqueou uma sobrancelha, mordendo o lábio inferior para não sorrir mais do que o necessário. Ainda não vira gigantes na sua viagem.

"Sim. O velho En," a mulher – Blerina, se não estivesse enganada – explicou, apontando para a montanha. "Ele é casado com a Terra. Durante o dia, ela fica com a sua irmã, o Mar, mas a noite os ventos a levam de volta à casa de En. Do outro lado da cidade, é possível ver o Monte Shpirag. Lá mora outro gigante, Shpirag."

"Muitos gigantes para uma cidade só, não?" A garota riu fraco. "Ele é casado com quem, esse Shpirag?"

"Com ninguém. Ele vive sozinho na sua montanha. Uma vez ele tentou tomar a cidade, mas En ficou sabendo e o enfrentou. Os dois ficaram terrivelmente feridos e a Terra levou En para a sua casa. O Rio Osum nasceu das lágrimas que ela derramou ao ver o marido tão machucado," a mulher continuou, antes de suspirar. "Desde então, ele continua nos protegendo."

"É uma bela história," disse Helena. Uma bela história que, de certo, tinha algum fundo de verdade. Muitas das histórias que ouvira ao longo de sua viagem eram baseadas em seres ou pessoas mágicas, mas que, aos olhos trouxas, se tornavam figuras míticas.

"Com certeza, mas acho que uma moça como você não veio até Berat apenas para ouvir histórias de gigantes." Blerina riu, recolhendo os pratos nos quais havia servido o café da manhã. "É difícil vermos gente de fora por aqui, mas aí você aparece, uma mocinha de... Nem sei da onde você veio, querida."

"Alba," ela falou, inconscientemente se encolhendo um pouco contra o batente da janela. Sabia que aquela mulher não era bruxa e nunca conheceria Rowena Ravenclaw, mas ainda era automático ficar com medo de dizer a sua origem e alguém a reconhecer.

"Alba... Isso é longe?"

"Muito. Do outro lado do continente, além do mar."

"E o que você veio fazer nesse lado do mundo?" a mulher perguntou, rindo outra vez.

"Quero conhecer lugares novos, pessoas novas," ela explicou.

"Uma menina bonita como você se arranjaria bem por aqui," disse Blerina, voltando a se aproximar e arrumando melhor o xale ao redor da cabeça. "Rinor, o rapaz que a trouxe até aqui ontem, não tinha olhos para outra coisa a não ser você."

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