Duas semanas. Este era aproximadamente o tempo que havia se passado desde a fuga de Bernard para participar do evento planejado pelo misterioso Don Cavalier. Dezesseis dias em auto mar, cento e doze horas mal dormidas, e duzentos e trinta mil e quatrocentos segundos de amargas reflexões sobre a imprudente e egoísta escolha que o músico havia feito.
Com a imensa saudade de casa, e um grande nó na garganta, o jovem só podia agora olhar para o futuro, esperando que um dia fosse perdoado por sua decisão.
Enquanto tentava distrair a sua mente e também a fraca náusea que sentia com o cruzeiro, Bernard teve muito tempo para notar cada simples detalhe usado pelos organizadores a fim de transformar aquele imenso navio em uma rústica caravela. Mas mesmo com a estética inesperada, o navio funcionava exatamente como um cruzeiro comum: enormes e múltiplas áreas de lazer, e atividades durante o dia todo! Sim, o navio parou algumas vezes, mas após apanhar os novos passageiros, continuava a se dirigir para a misteriosa ilha no meio do Oceano Pacífico.
Aquele dia estava em seu entardecer, com o sol alaranjado se refletindo no horizonte oceânico. Bernard agora — e como na maioria dos dias — se encontrava em sua cabine que, apesar de pequena, era muito confortável.
— Não!! — ele vociferou com a folha em sua mão, amassando-a e jogando no chão, próxima a pilha de bolinhas que se acumulavam nos pés da lixeira. — Isso não está certo! Por que é tão...! — fez uma pausa gesticulando suas mãos, parecia não encontrar a palavra que buscava. — Difícil...! — clamou aliviado. — Escrever uma música?!
Ele se levantou da cama frustrado e olhou pela janela de sua cabine, quase sendo cegado pelo reflexo do mar, ainda mais com suas pupilas já acostumadas com o quarto de luzes apagadas, afinal, passara o dia todo tentando compor a parte lírica de uma de suas músicas.
— O crepúsculo... — pensou alto, num tom mais ameno. — Talvez eu deva dar uma volta pelo deque.
Ele calçou seus sapatos ao lado da cama, e dirigiu-se para a porta, virando a chave uma vez pela fechadura e a retirando. Então a trancou com cautela pelo lado de fora — com duas voltas — e caminhou entre os corredores do navio de carpete vermelho, até que finalmente avistou o seu destino. O deque, repleto de decorações que haviam sido colocadas durante o período de sua absência.
De um dos grandes mastros de madeira, vários charmosos varais com bulbos de lâmpadas laranja partiam, dispostas paralelamente, e se cruzando ao tocar um outro pilar de suporte nos cantos do deque. Algumas pessoas já começavam a se reunir, e o clima era deveras romântico, especialmente para os casais que se formaram ali em tão pouco tempo... Parecia que todos haviam esquecido da ilha e estavam tirando férias.
Além disso, enfeitavam o local as várias flores tropicais, como palmeiras, hibiscos, plumérias e estrelícias, que davam um toque estival e caloroso. Fora Bernard avisado de algum evento e esquecera?
Ele dirigiu-se à beira do navio com o rosto sereno, seus óculos refletiam as luzes recém acesas — ainda que o sol não havia se posto completamente —. Então, de costas para o mar, apoiou os cotovelos na grade de aço frio — cuja aparência imitava a madeira —, para apreciar a vista.
— ...Será que a Abby recebeu minha carta...? — novamente pensou em voz alta. — Espero que ela não me odeie por tê-la abandonado desse jeito...
— Preocupado com a vida que deixou para trás? — uma voz calma e masculina, embora não corpulenta, o tirou de seus pensamentos.
Bernard se virou calmamente, lançando um olhar amigável de soslaio, era um esbelto rapaz de blusa roxa, um pouco maior que ele, cuja altura era de um e setenta e três metros. Seus compridos cabelos, que batiam em sua cintura, eram escuros com um forte tom azul marinho.
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Trickster: A Ilha Caballa
FanfictionQue Don Cavalier era um homem excêntrico e amante de jogos, todos sabiam! Mas quem imaginaria ele planejar - antes de falecer - uma caça ao tesouro, que premiaria o vencedor com sua fortuna e presidência da extravagante Megalo Company? O palco de su...