- Talvez você deva saber que ela não está mais na cidade, Gil. – pousou o copo de café na mesa de mogno escura. – Sinto que está preso nesta situação e isso me aborrece. – levantou-se e pôs-se de frente para o amigo, que o fitava com neutralidade. – Vamos, Gil... – insistiu, tocando gentilmente o ombro do mesmo.
- Chega dessa conversa fiada, Sean. Eu já disse que estou bem, me deixe em paz! – levou a mão até o bolso do casaco, puxou suas chaves e jogou-as para Sean. Esboçou um sorriso introvertido em seguida. – Pegue o carro, ficarei aqui mais uma semana. Se precisar, me envie uma mensagem.
23 de novembro de 2061
A manhã parecia distinta naquele lugar, por incrível que pareça há muito tempo Gil não via uma cidade como aquela. Era engraçado pensar que ainda existissem cidades com tão pouca tecnologia, aliás, o ser humano fazia questão de modificar cada centímetro de seu espaço para algo mais confortável e conveniente. Era cansativo, mas todos estavam tão acostumados que não se imaginavam sem aquilo. Você não precisava mais levantar o pulso para checar as horas, não precisava de um Smartphone para ler as notícias, receber ligações e muito menos perder seu tempo pesquisando alguma receita nova. Tudo estava ali em realidade aumentada.
- Androides em Cudahy? – riu sem humor, após responder a colega que servia a mesa ao lado. – Eu jamais pensei que chegariam aqui. – colocou o prato com almondegas na frente de Gilbert e sorriu. – Senhor, logo traremos sua bebida, nos desculpe pela demora, estamos cheios hoje!
- Não se preocupe... – havia tensão em seu tom de voz. – Aonde ouviu sobre os androides? – fitou a garçonete de cabelos desarrumados e sorriso amarelo.
- Viajantes, sempre conversam muito alto aqui. Dana... – acenou para a colega que imediatamente correu até ela. – Ela quem os ouviu.
- Sim, Emma, é isso mesmo! Eu os ouvi dizendo que logo estarão trabalhando aqui também. Tenho receio de perder meu emprego como nas grandes cidades, li muito sobre isso. Cudahy não está pronta para a evolução. – seu olhar demonstrava preocupação. – Preciso trabalhar agora, espero que goste das almondegas, por enquanto são humanos que as temperam!
- O senhor deseja mais alguma coisa? – Emma aguardava alguma resposta enquanto notificações de pedidos apareciam na tela de seu dispositivo fabricado pela Steadfast - um modelo de Smartphone ultrapassado feito de vidro e que ficava totalmente transparente quando as moléculas de cristal líquido se alinhavam.
- Não, obrigada. – acenou com a cabeça e a viu saindo até outra mesa. Gil parecia surpreso, mas ao mesmo tempo aquele assunto o deixava irritado. – Não tenho um único minuto de paz... – murmurou.
15 anos atrás
- Eu não vou implantar essa droga de chip em mim, Sean. Esqueça! – arremessou a caixa para fora da mesa. – Eu não aceito ser controlado, ser pontuado e ter que passar o resto da minha vida declarando cada passo nesse maldito programa. – sua feição passou de neutra para impaciente.
- Gil, você não tem escolha, infelizmente não tem. – apanhou a caixa do chão colocando-a sobre o sofá. – Você se acostuma, esquece que ele está aqui. – abriu a palma da mão no ar e sorriu. – Não pode nem vê-lo.
- Que porra, Sean. – Gilbert inalou um pouco de ar, aproximou-se do sofá e analisou a caixa com os olhos. – Eu só faço por você, mas queria mandar tudo à merda. – estendeu o braço até alcançar a caixa e a pegou com apatia. – Que saco! – suspirou.
- Todos já estão usando, é fácil. – disse Sean, otimista. – O estado usa apenas informações importantes sobre nós. Não tem com o quê se preocupar, amigo. - sentou-se na poltrona que ficava ao seu lado esperando alguma reação de Gil.
- Claro, você é tão ingênuo. – encarou o amigo. – Você devia abrir os olhos. – pressionou o botão em LED azul no topo da caixa e instantaneamente a viu abrindo, o micro chip elevou-se do fundo da mesma e uma voz feminina surgiu no ambiente:
"Bem vindo ao programa N300 do governo dos Estados Unidos, temos o prazer de apresentá-lo a sua mais nova aquisição tecnológica, seu micro chip de controle - criado exclusivamente pela RealTech em parceria com o país.
A partir de agora todos os seus dados estarão armazenados neste micro dispositivo. Para inseri-lo, basta abrir a mão direita e pressionar o micro chip no centro da mesma. Não se preocupe, você não sentirá nenhum tipo de dor ou incômodo, nós prezamos pelo seu bem estar."
- Isto é sério? – riu sem ânimo. – Então vamos colocar esta droga de chip antes que meu melhor amigo me renuncie. - abriu a mão e fitou Sean, que parecia inquieto.
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Ann-Droid
RomanceA sociedade não é mais a mesma desde que startups de tecnologia se uniram com o intuito de trazer conforto e qualidade de vida aos seus usuários. A evolução que se iniciou em 2047 se tornou tão excêntrica que androides já estavam em quase todas as...