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Uma semana se passou desde o pequeno encontro com o rapaz do telhado. Eu sei quem ele é, mas prefiro ignorar. Por isso, apelidei-o de "o rapaz do telhado". Nunca mais o vi, mas sei bem que ele ainda cá está. E não há-de abandonar tão cedo, espero eu. 

O casamento da rainha foi confirmado. Ninguém sabe ao certo como, nem por quem. Mas todos sabemos que vai acontecer. A data ainda está por divulgar. No entanto, circula por aí que deverá ser daqui a duas semanas. Continuo a questionar se ela estará feliz com esta decisão. Eu sei que os casamentos entre famílias reais nunca foram consensuais, mas não consigo deixar de achar que nada fará sentir sentido, se não fizer a rainha feliz. Isso é o mais importante!

Estou neste momento na baixa. Vim até uma mercearia para comprar algumas coisas que estão em falta em casa. O ambiente na cidade é de esperança, mas não deixa de haver uma certa curiosidade em relação à vida no castelo.

- Como é que estão as coisas por lá? Já os viste juntos? - perguntam-me.

- Não sei! - respondo, com toda a sinceridade.

- Como é que não sabes? Vives literalmente colada ao castelo. Tens que saber de alguma coisa!

E sei. Já o conheci. Porém, essa memória pertence-me apenas a mim e pretendo mantê-la em segredo.

- Não é por viver lá ao lado, que a rainha me bate à porta. Ainda não vi ninguém!

- Já ouvi dizer que o príncipe é um sonho de homem! - oiço, enquanto escolho quais as peças de fruta que quero levar comigo. 

- Não me parece que ele seja para a tua faixa etária! - digo, a rir.

- E como é que tu sabes? Pensei que ainda não tinhas visto ninguém! - apercebo-me do meu erro.

- E não vi. Mas ouvi dizer que ele era novinho! - suspiro de alívio. Acho que consegui disfarçar bem.

Pago o que tenho a pagar e retorno a casa. Arrumo o que comprei e preparo-me para gravar mais um vídeo para o meu canal no youtube. Faço vídeos sobre histórias, essencialmente. Conto histórias que já experienciei, falo de livros que já li e adorei, apresento pesquisas sobre momentos históricos. Sou apaixonada pela monarquia, porém estou grata por não fazer parte da família real. Se há coisa que eu aprendi ao viver tão perto desta, é que é uma vida muito solitária. 

Acabo de gravar, arrumo todo o equipamento e vou até à cozinha. Faço um café e levo-o comigo até ao telhado. Admito que passo demasiado tempo aqui. É agradável e, secretamente, continuo com a esperança de poder vê-la. Porém, isso nunca aconteceu. Já cá estou há 1 ano e nunca a vi, mesmo vivendo tão perto dela. De vez em quando, cruzo-me com alguns guardas, mas até esses parecem fantasmas, saídos de uma história quase esquecida. Nunca me atrevi a dizer seja o que for, ou a perguntar por ela. Para isso, já basta toda a população. 

Numa noite, há uns meses atrás, pareceu-me ver uma sombra numa das janelas da torre mais alta. Foi algo rápido e não consegui perceber se era, de facto, uma figura humana. No entanto, algo me diz que era ela. Senti arrepios por todo o meu corpo e imaginei o seu choro a ser trazido até mim pelo vento. Por vezes, ainda oiço esse choro e, posso jurar que, sei que é dela. 

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