Mantive os meus braços ainda apertados ao redor de sua cintura. Eu estava sonhando.
Nunca havia me sentido tão vivo como agora ao receber de bom grado o beijo que correspondi com todo meu amor.
Rodopiei seu corpo no ar, estava me sentido bobo por ter um sorriso tão amplo na minha boca como o que tinha naquele momento. Ela sorria de forma tão iluminada para mim e tentava esconder seu rosto entre os vincos do meu pescoço de forma tímida.
Mas o baque da verdade que teria de ser enfrentada me faz paralisar.
- Meu senhor, o que houve? - Ágata me questionou visivelmente preocupada. Colocou suas mãos ao redor dos meus ombros como se o meu olhar a fizesse amolecer a pernas. - Você voltou atrás com o que havia dito agora à pouco? É isso? - sua aflição era visível pela voz falha ao falar.
Eu não consegui deixar de sorrir. Então era isso que a preocupava? Eu não amá-la, afinal?
Toquei as suas duas mãos e as beijei com ternura. O seu olhar era atento, procurando por algum sinal em minhas ações.
- Receio que terei de abandoná-la por um tempo. Preciso deixar claro a todos os senhores importantes na sala de reuniões que irei burlar umas das maiores leis de todos os reinos desse mundo por amar você. Espero que eu não seja destituído. Me deseje sorte, meu amor. - falei com um tom de brincadeira mesmo sendo verdade. Dirigir um meu amor para a mulher que a tanto tempo desejei me deu ainda mais forças para correr até eles e gritar que a amava. Mas infelizmente não poderia ser assim.
Ela não pareceu achar graça pois o seu corpo ficou ainda mais tenso e me olhava com um pânico crescente no olhar. - Você tem certeza disso. - questionou-me. - Digo, faria tudo isso para ficar comigo? - as palavras saíram lentas e frouxas por sua voz relutante. Parecia até mesmo que ela tivesse medo da resposta. Toquei o seu queixo e levantei seu rosto, precisava deixar claro o que sentia.
- Faria até mais se fosse necessário. Por você iria até para o inferno. - ela não conseguiu conter o sorriso ao ouvir a última parte. Essa última parte nem precisaríamos sair de casa.
Depositei um último beijo em sua testa e parti em direção a sala de reunião.
Ainda dava para ouvir o barulho incessante da festa se expandindo pelos corredores do castelo. Servos iam em correria servir os meus convidados, como se aquilo fizesse depender as suas vidas, mas na verdade não dependia. Não mesmo.
Odiava tudo que envolvesse festas barulhentas e ter que lidar com pessoas que ao fim do dia antes de dormir praguejava meu nome desejando a minha morte. Um verdadeiro baile de hipocrisia dando tapas de luva na minha cara, lembrando-me de quem eu era, era assim que idealizava aquelas festas. E no final, ainda jovem, achava que dando festas, a casa se preencheria e assim a sensação de solidão pudesse diminuir. Mas não diminuiria; na verdade apertava mais a ferida que nunca cicatrizou na minha alma. A ferida do abandono involuntário, do abandono forçado por quem amamos. Essa até hoje ainda dói de forma crua, porém aos poucos aprendi a preencher a ferida com esperança pelo futuro que me aguardava com alguém; ou com ela.
A maçaneta pareceu repentinamente pesada. Teria um longo debate com os nossos representantes do reino e com alguém que me aguardava a muito tempo.
Não ponderei mais e entrei de súbito. Todos voltaram os seus olhares para mim e acenei cumprimentando-os; pareciam cansados de esperar.
Um garota de cabelos ruivos e boca escarlate aproximou-se altiva e sem qualquer pudor cumprimentou-me com uma aperto no pulso. Como por impulso, afastei meu braço da sua proximidade e suspirei pesadamente. Estava muito ferrado.
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Contos de Guardiões Elementares
AventuraO homem que conhecemos não era o que virou. Dentro de um reino solitário e hipócrita, Lucca se vê completamente apaixonado por alguém que vive em seu palácio. Mas como lidar com o amor quando ele é bruto e ingênuo?