-Parte I-

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                          -Parte I-
                   
                           -Donn-

A neve caia lentamente a medida que o vento diminuía, mas o frio era denso, quase palpável.

- Odeio patrulhar nesta região!- queixou-se Donn Winterfox.

Eu odeio o frio, pensou com rancor enquanto via sua respiração se tornando pequenas nuvens de fumaça, E esse lugar é frio demais. Odeio esse Norte!

  - E acha que eu adoro me assentar no lombo de um animal tão deprimente e cavalgar durante cinco horas neste maldito frio, que consome os meus ossos até eles se tornarem pingentes de gelo, Donn?- perguntou Ybion Graylock com puro escárnio e zombaria, o que irritou consideravelmente seu companheiro que lhe partilhava o tormento- Irão nos pagar em ouro e prata, em uma quantidade abundante, e para que isso aconteça, infelizmente, temos que patrulhar até o condado de Stonevale, e se você continuar assim irei te deixar aqui para morrer de frio e vou pegar sua parte para mim!

Eu também poderia, pensou ele, Poderia te matar e dizer que fomos atacados por lobos e você não sobreviveu, e eles acreditariam. Que o frio roa seus ossos, maldito Graylock!.
Donn odiava Ybion, odiava ter que repartir sua recompensa, odiava outros mercenários, mas odiava mais ainda o fato de ter sido mandado como mensageiro. Os dois cavalgavam durante horas por morros e colinas pálidas pela neve com o objetivo de patrulhar a região próxima e enviar uma carta para o condado vizinho, Stonevale.

  - O que ele acha que nós somos, malditos Representantes?- Donn perguntou, então começou a imitar a voz do conde de Ironvale- "Patrulhem pela região, colocando os seus pescoços em risco de serem cortados por saqueadores e seus corpos de serem jogados em uma sarjeta qualquer ao lado da estrada... Ah, é mesmo, quase me esqueci, poderiam levar está carta até Stonevale por mim? Seu ouro será dado na vossa chegada, e será dividido em três partes, um terço para vocês que terão que dividir entre si e dois terços para mim, mas disso vocês não precisam saber. E se tentarem me trair caçarei vocês até o fim do mundo e os farei pagar com a vida. Agora vão! Não gosto de ter mercenários malditos em meu castelo, isso mancha minha reputaçã..."

  - Os malditos Winterfox não sabem se calar!?- Ybion gritou virando-se para Donn- Cale-se!

  - Maldito Graylock! Cale-se você, antes que prove de minha lâmina- Donn levou a mão ao cabo da sua espada.

Ybion era uma figura esguia com feições cadavéricas, a falta de alimento devido a uma regra religiosa estúpida auxiliava nessa característica, calvo, e tinha uma horrível barba hirsuta e emaranhada; vestia vários mantos de pele de animais e um tabardo grosseiro, todos cinzentos e negros. Estampado neles havia o brasão de sua família: uma chave prateada num fundo cinza, o brasão de uma casa de bastardos. Não ostentava músculos e, aparentemente, não tinha aptidão com esgrima, seria fácil para Donn o ferir. Então Ybion virou-se para a estada a qual seguiam até Stonevale.

  - É mesmo um tolo!- afirmou com frieza- Nesse momento precisamos um do outro, se eu morrer você morre, e ainda assim você quer me matar? Pois saiba, não será fácil tal tarefa para ti, jovem Winterfox.

Donn não era mais um jovem, já estava no seu quadragésimo primeiro verão-vivido do seu nome. Tinha feições robustas, a pele cheia de pequenas cicatrizes e manchada pelo sol devido aos seus anos velejando no mar, uma barba por fazer e olhos escuros semelhantes ao seu cabelo liso e oleoso. Vestia mantos, uma camisa de tecido grosseiro, um gibão de couro desgastado e cota de malha parcialmente enferrujada, e uma capa grosseira feita de pele de lobo, a qual ele havia ganhado em um jogo de dados em uma vila qualquer a margem da estrada. Não havia brasão algum estampado em nenhuma das parte de suas vestimentas, mas ele sabia qual era: Uma raposa das montanhas-pálidas, em um fundo branco. Mas nela não havia nobreza nenhuma, já que era o brasão de todos os bastardos do Lorde Frost de Uruk e das Ilhas-Pálidas.

Seus alforjes estavam vazios, exceto pelas ferramentas que utilizariam para acender uma fogueira e outros instrumentos básicos para a sobrevivência na mata. Deveriam ter pegado mais mantimentos em Ironvale, não esperavam uma viagem tão longa. Ybion havia reparado que seus cavalos eram magros e desnutridos, então ordenou para cavalariço encilhar três cavalos, prevendo que um iria morrer no caminho... e realmente morreu. Comeram a escassa carne do animal e guardaram a pele para vender em alguma vila se encontrassem uma no caminho. Não encontraram nenhuma vila.
Um corvo solitário gritou e voou entre as galhos nus das árvores, quebrando aquele gélido silêncio. O silêncio do Norte.
Penas negras, momentos sombrios, Donn se recordou do ditado em pensamento e de todo o dano causado por aquela ave negra na propagação da Praga Corvina que abalou o mundo durante anos, abalo esse que Donn apenas soube em histórias, pois a peste já tinha seido exterminada ainda na juventude de Donn, mesmo ele escutando histórias de marinheiros que contavam que esse praga ainda existia no Sul, se isso era verdade, Donn não sabia dizer. Esses malditos carniceiros nunca foram bom sinal para nada, se não para guerra e sangue, concluiu ele.

  - Devemos ter cuidado por essa região, ainda mais na estrada, visíveis e indefesos para os ladrões e foras da lei, ou algo pior- Ybion alertou, sabendo qual era sua posição naquele situação- Somos alvos fáceis, Winterfox!

  - Teme que Nativos venham-lhe pegar, Graylock?- Donn conseguiu imaginar a carranca de desgosto de Ybion se formando na fácie dele- Já tinha ouvido grandes histórias sobre o homem que trouxesse honra para o seu nome bastardo, Sir Morgryth Graylock, o Cavaleiro de Prata, que lutou bravamente na Segunda Guerra dos Três Nobres de Prata e a terminou em um tratado, cujo mesmo não me lembro o nome. Mas você, tendo o igualmente nome Graylock, molha as calças por um mito?- Donn soltou uma longa gargalhada. Ybion nada disse.
                         
O vento frio uivava, lembrando Donn de seu antigo lar. As ilhas ao leste são em sua maioria tropicais, como as Ilhas-do-Sol das enormes baías de Agjnmonth, mas as Ilhas-Pálidas eram a exceção: um arquipélago rochoso, úmido, mortal e frio. Pelos deuses, como eram frios aqueles malditos dias, refletiu ele, sendo tomado por lembranças indesejadas. Ele as afastou, e apenas continuou a galopar. Foi então que, por cima das copas das árvores, ele avistou uma fumaça, negra e densa, subindo lentamente ao céu palido e então sendo levada pelo vento. Ybion e Donn se entreolharam, sabiam de onde vinha aquela fumaça, a estreita estrada na qual estavam levava até lá. Então aumentaram o galope, indo de encontro às muralhas de Stonevale.

A Revolução do NorteOnde histórias criam vida. Descubra agora