-Parte II-

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-Parte II-

-Renfield-

O ancoradouro surgiu no litoral, erguendo-se sobre a praia de seixos e areias claras e alvas. Senhora-Lily, esguia e soturna, flutuou lentamente até o cais. Renfield, deitado na cama da sua cabine, escutou o capitão gritar uma ordem, que foi abafada pelo som dos marujos andando pelo convés acima dele, cada passo era um rangido na madeira. Ren sentiu que o navio diminuia a velocidade, então fechou ruidosamente o livro no qual havia se perdido em páginas amarelecidas desde que deixara Agjnmonth em Vila-Porto, um livro grosso sobre as viagens marítimas de Lars Marshel e suas descobertas na imensidão do Ultramar, em uma busca desesperada e ilógica de encontrar dragões ou Nativos que ainda estivessem vivos, onde, para seus olhos, apenas encontrou decepção nessa busca. "As maravilhosas descobertas geográficas no Ultramar" estava escrito em letras que outrora foram douradas na capa de couro desgastada e surrada com o tempo que passou na biblioteca da Catedral de Edron, nos dominos da Ordem em Castelo-Negro. Ren pegou o colar de prata que levava ao pescoço, na ponta haviam três triângulos conectados e entrelaçados, com um quarto triângulo no centro, o símbolo da Ordem dos Três, que representava os três deuses que eles adoravam, Del' Araton, Del' Tjofir e Del' Cahethal, as Três fácies da Ordem, que de acordo com algumas teorias teológicas dos clérigos e sacerdotes, foram criados por uma entidade maior, Kel' Erathaol, a ordem em si. Renfield beijou o símbolo e fez uma prece silenciosa, pedindo a Del' Araton por proteção, a Del' Tjofir por justiça e a Del' Cahethal por sabedoria, pediu principalmente por sabedoria, iria precisar da sua constante companhia ali. Ele se levantou, tendo cuidado para não bater a cabeça no teto. Ren não era um homem alto, diriasse até que era de estatura mediana em Agjnmonth, mesmo assim teve que andar encurvado pelo seu aposento, devido ao teto baixo. Apagou a pequena vela que queimava na cômoda de madeira áspera e rústica, ela que tinha sido sua maior companheira aquela viagem, lhe dando luz para ler e afastando os ratos de sua cabine. Sentiu o navio balançar de um lado para o outro, ele perdeu o equilíbrio, bateu a cabeça no teto e quase caiu. Quando o navio parou de balançar, um homem abriu bruscamente a porta da sua cabine.
- Chegamos em Nova-Vastapor, senhor... digo, mestre- ele anunciou com seu forte sotaque das Ilhas-de-Sal.
Ele não sabe como me chamar, ele pensou, Nunca viu nada além de um sacerdote da Ordem, eu creio.
- Agradeço-lhe, Jhan, mas pode me chamar apenas de Ren, se preferir- ele disse de modo pacífico e amigável.
- Como desejar, senhor Mestre Ren- ele acentiu e saiu da cabine.
Ren ficou ali, massageando sua cabeça na parte que havia batido no teto com uma das mãos, enquanto arrumava suas coisas com a outra mão. Não demorou muito para arrumar suas coisas e colocá-las em um alforje vermelho de couro-fervido de boa qualidade que recebera de um velho nobre em uma taverna em Vila-Porto após lhe dar alguns conselhos de administração governamental; o vinho entorpecia seus sentidos não sua inteligência ou mesmo sua língua aconselhadora de mestre, e o velho estava de ouvidos atentos para uns bons conselhos, e parecia estar cansado de procura-los no fundo das garrafas. Os conselhos pareciam ter cidos bem recebidos e o nobre decidiu retribuir com um presente, "Um alforje digno para os livros aconselhandores de um grande mestre", ele disse de forma desajeitada, Ren não poderia recusar um presente tão belo e com tantas lisonjas vindas do nobre. O alforje lhe foi muito útil, ajudando-o a transportar seus pertences e seus livros com bastante leveza, até parecia que tudo que entrava no alforje perdia instantaneamente uma parte do seu peso original, como se fosse mágica, mas Ren sabia que não era, era apenas um ótimo trabalho de um grande artesão. Com todos os seus pertences guardados ele saiu de sua cabine indo em direção do convés.

Ele desceu cuidadosamente do naviu através de uma estreita rampa de madeira que estava conectada ao cais.
- Bem, como vê, nós chegamos- o capitão afirmou sem hesitar- Bem, o senhor pode ser um homem honrado, mas mesmo se fosse Ealdrick Winterlord reencarnado teria que pagar a passagem.
- Eu creio que sim- Renfield tirou uma pequena bolsa de couro de um dos bolsos escondidos nas mangas de seu manto púrpura- Quanto lhe devo, capitão?
- Quinze meios-nobres de prata- ele disse, enquanto mascava um pedaço de erva-sol. Renfield não estava familiarizado com as moedas do leste, e o atarracado capitão percebeu logo a sua dificuldade em achar as moedas- São essas moedas retangulares aqui... Sim, essa mesmo, agora só falta quatorze iguais a essa!- Renfield lhe pagou cada moeda, e percebeu que sua bolsa afinal ficado bastante leve, Não terei que me preocupar com alguns nobres de prata quando estiver do lado do Rei, ele pensou, percebendo que o preço daquela passagem estava acima do preço normal, Mas eu não vou fingir ingenuidade novamente, quis dizer para o carrancudo capitão, mas perdeu o interesse de dizer e continuou seu caminho. O cais era ligeiramente estreito e tortuosos, com os camaroeiros e caranguejeiros se locomovendo com naturalidade pelo cais, Ren teve certa dificuldade para passar, tendo que andar cuidadosamente para não topar violentamente contra um dos pescadores.
"Não fui feito para o mar", lembrou-se de ter comentado para um dos marujos, apoiado no talabardão do convés sentindo seu estomago revirar, "Engraçado, pensava que os agjndoneses eram descendentes dos antigos homens-de-sal, não estou certo? Sendo assim, o sal do Ultramar corre nas suas veias, mestre", o marujo zarolho afirmou, de fato era verdade, os primeiros a se dizerem agjndoneses eram descendentes de algumas tribos dos homens-de-sal, que eram pequenos clãs que tinham sido banidos de Uruk pelos grandes clãs conquistadores, após serem derrotados e suas terras tomadas. Os banidos tinham apenas duas opções: a extinção completa de seu clã, ou pegar alguns veleiros e zarpar mar adentro, que para eles, em suma, tinha o mesmo destino: os braços frios da Morte. Incrivelmente, alguns clãs começaram a se encontrar e a se juntar em mar aberto, criando pequenas vilas flutuantes com seus barcos conectados, forjando uma aliança de sobrevivência. Logo, eles conseguiram aperfeiçoar as suas habilidades náuticas e através disso navegaram para lugares que até os cleros da Ordem desconhecem. Logo, começaram a descobrir novas terras, e como tinham o sangue dos homens-de-ferro correndo nas suas veias, começaram a conquistar essas terras. A maioria voltava para o mar após pegar alguns suprimentos, madeia para consertar seus navios e talvez até novos filhos para ensinar a navegar. Alguns poucos decidirão ficar em terra firme, como o clã Greymond, o primeiro clã a dominar Agjnmonth, ancestrais da casa Blackcastle, a casa dos primeiros reis, que foi a dinastia mais poderosa de todo o território dos quatro continentes. Isso até a Revolução do Ultramar com a cabeça do último rei de Agjnmonth, Fjorden Blackcastle IV, sendo cortada e seu governo monarco substituído por uma república democrática, enquanto Hyordan Graycastle conquistava o governo de K'rath e se tornava o primeiro Rei de K'rath, na Batalha do Castelo-Alvo, que após a batalha se tornou a capital de seu reino e teve o nome mudado para Castelo-Rubro.
Sim, de fato Renfield tinha nem que um pingo do antigo sangue de sal, mas o seu estomago dizia o contrário e não demorou muito para que ele vomitasse o almoço do dia pelo talabardão.

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