me afogo em você sem pensar duas vezes.

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catei as conchinhas dos fios  bagunçados do seu cabelo que se assemelhavam ao mar arredio e me dei conta de que nunca quis taças de ouro ou anéis de prata de navios naufragados. esses tesouros oriundos de pessoas com tantas riquezas nunca despertaram meu interesse, já que sempre fui colecionadora de conchas bem mais interessantes do que ametistas pertencentes a moribundos sucumbidos pelo oceano. repudio a ganância na mesma medida em que amo mares selvagens.

meus olhos eram como piscinas vazias antes de serem agitados pela maré rebelde que preencheu minhas pupilas com sua força colossal. alguém já te alertou sobre a profundidade do seu olhar penetrante? quem sabe se eu tivesse apenas estirado a minha toalha sobre a areia e aproveitado o dia ensolarado enquanto sentia minha pele arder graças ao calor transmitido pelos raios solares, eu nem teria feito questão de sentir que estava sendo encarada por alguém. devo confiar mesmo em garotos fofos que elogiam meu biquíni azul de listras brancas, por mais que meus amigos tenham feito questão de dizer que era brega? bom, agora tanto faz, porque naquele dia em que o sol havia me presenteado com ondas bravias e raios escaldantes, eu acabei caindo nas palavras sutis de alguém que possuía olhos ternos e calorosos.

eu sabia que iria me apaixonar no exato momento em que você me chamou para sair e eu jurei por tudo que existia no mundo que estava indo apenas para não lhe decepcionar, quando na verdade, escolhia o melhor vestido do meu guarda-roupa para te ver. teimosia minha acreditar que oceanos pacíficos e inofensivos sempre foram a minha praia, quando na realidade meu navio só atraca em portos distantes e navega por águas desconhecidas. era irônico ver que nossas mãos sequer mantinham espaços entre os dedos e insistiam em se entrelaçarem e nem é como se eu fosse morrer se isso acontecesse, mas a consequência era o frio na barriga que me deixava desconsertada. não posso, nem pensar, por que eu faria isso de novo? não vou me render, é impossível, nunca mais!  quem você pensa que é para deixar minha cabeça cheia de dúvidas?

você desvenda a minha praia até de cabeça pra baixo. desbrava desde os pequeninos sinais por toda a minha costa marítima até as curvas oceânicas que se formavam em meu rosto quando eu tentava disfarçar um sorriso, já que eu não queria de jeito nenhum que você o visse escapando. todos os seus "eu te amo" carregados de sinceridade transpassavam os limites da minha orla marinha e não pude me conter quando você deixou resvalar um beijinho salgado nos meus lábios. a tempestade em alto mar me deixava petrificada e já tinha perdido todo o controle. minhas pernas fraquejavam e eu estava com medo dos trovões!

por mais que eu tenha tentado a todo custo me livrar do fatídico naufrágio, cá estou afundando, sentindo o tilintar das ondas possuir cada pedacinho do meu corpo. quando meu oxigênio se tornar escasso, ainda vou poder te tocar ou você não vai estar mais aqui? porque as minhas esperanças estão alinhadas ao seu coração, então por favor, não fuja para uma ilha distante e não me deixe aqui esperando como se ainda fosse aquele dia de sol em que nos conhecemos! seria tortura ver que suas promessas podem se desfazer como palavras escritas na areia que as ondas apagam em um sopro. já fui chacoalhada tantas vezes que não seria novidade alguma ver você escapulindo como grãozinhos de areia pelos meus dedos finos e gélidos.

todavia, não tenho mais força alguma para lutar contra. me permito ser afogada no oceano inquieto até que palavras nunca proferidas por mim comecem a sair lentamente, nem que sejam as juras de amor mais exageradas que você já ouviu. minhas mãos seguram com força as conchas que retirei dos seus fios castanhos para que elas não se dispersem mar afora. 

por causa do seu amor, estou submersa. mas ainda assim, atlântida nunca foi tão bonita aos meus olhos.

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