Fome De Viver

10-Deixa a gente em paz

Boa leitura
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Daniela narrando

-Dany meu amor - escuto uma voz conhecida logo de seguida também vindo da sala

- É a Tia Martha? - olho para o Ben que também parece não saber o que fazer

-Vai lá Dany - ele me incentiva

- Fica aqui, por favor, não faça nenhum barulho - aconselho antes de descer

Paro um instante na porta do meu quarto criando coragem. Tia Martha aqui? Ela foi embora há pouco tempo...será que aconteceu alguma coisa? Enfim a coragem vem, não foi nem a metade do que eu precisava, mas é melhor aproveitar o pouco do que ir desprovida. Desci os degrau sentindo meu coração palpitar cada vez mais rápido. O que vou falar para ela? Com certeza ela vai estranhar o cabelo...como vou contar que estou grávida do seu melhor amigo que abusa de mim há anos na sua própria casa?

Os olhares de espanto que encontro ao levantar o meu rosto, foi de dar arrepio na espinha, tia Martha parece preocupada, o seu olhar transmitia uma profunda agonia, já Jorge está visivelmente furioso, com certeza eu ia apanhar se minha tia não estivesse entre nós.

-Daniela, meu amor, o que houve com você... o seu cabelo - ela se aproxima e me abraça

- Ficas um instante sozinha e achas que é certo fazer isso? Está na hora de crescer Daniela, melhor explicar o que significa isso agora! - Ele revela sua furia tentando parecer realmente um responsável que cuida de mim

- Calma Jorge! Não precisa ser assim, ela vai falar...mas antes precisamos conversar sobre outro assunto - Tia Martha se afasta de mim e vai em direção ao sofá - venham! - ela pede educadamente

Meu rosto não tem expressão alguma, não estava pronta para encarar a minha tia...eu não estava pronta para carregar todos esses acontecimentos...eu não estava pronta para me afastar da minha mãe...a vida é cruel, ou eu fui uma bobona por deixar tudo isso acontecer durante esse tempo todo.

Sigo minha tia até o sofá e tento escutar o que ela tem a falar, minha mente está tão confusa que parece ter viajado para bem longe, até que algo que ela conta me tira daquele mundo distante.

- É a sua mãe Dany - ela faz uma longa pausa parecendo em busca de coragem o que me deixa mais aflita

- O que aconteceu com ela? - minha mente já supõe milhares de coisas ruins

- Ela está em um sítio, não está sozinha, tem empregados lá cuidando dela, sempre que possível eu entro em contacto para saber como ela está e para falar de você a ela...mas há mais de uma semana que eu ligo e ninguém atende nem retorna as ligações, sabes que não posso envolver polícia nesse assunto - ela coloca tudo para fora com cautela para não me deixar mais aflita do que já aparento estar

Foi ele, ele pegou minha mãe, só pode ser isso. Sinto meu rosto queimando de ódio, meu corpo se move involuntariamente em direção ao outro sofá que Jorge está sentado e sorrindo disfarçadamente, quando dou por mim estou apertando seu pescoço o deixando sem ar e tia Martha tentando me afastar dele. Jorge aparenta estar gritando, tia Martha está completamente desesperada e me deparo com o Benjamin ao meu lado tentando tirar a minha mão do pescoço do Jorge.

Não, eu não escuto absolutamente nada além da minha respiração descontrolada, segura de que hoje eu mato esse desgraçado. Mas Ben e tia Martha conseguem me afastar dele antes que eu consiga atingir o meu objetivo. Cambaleio para trás caindo no chão logo de seguida, Ben avança no mesmo instante para me amparar. Tia Martha não sabe quem apoiar, não sabe o que pensar muito menos o que dizer.

Agora vendo para o rosto de Jorge, percebo que dei motivo para ele se fazer de vítima, com certeza ele tiraria minhas mãos do seu pescoço sem problemas se tivéssemos sozinhos...cretino, covarde, filho da...que merda.

Depois daquele momento que me pareceu interminável, finalmente escuto as vozes.

- Martha, podemos conversar a sós? - Jorge pergunta ainda segurando seu próprio pescoço incrédulo do que eu acabei de fazer, belo teatro, não existe ator melhor  

- Vamos para meu quarto - ela solta um suspiro longo e assente com a cabeça

- O que você fez com ela Jorge? - deixo finalmente sair com a voz fraca - Deixa a gente em paz, não fizemos nada a você - lágrimas escorrem pelo meu rosto

- Já voltamos - tia Martha sube em direção ao seu quarto e Jorge a segue

Seus olhos deixam transparecer o mal que ele é capaz de fazer. Como que a Tia não vê isso? Não acho boa idéia eles ficarem a sós, ele pode fazer alguma coisa com ela.

- É a sua oportunidade - é a primeira vez que escuto o Ben desde que o vi ao meu lado, agora me tirando dos pensamentos horrorosos

- Ele...ele matou...ele matou a minha mãe -os soluços cortam a minha frase em pedaços

- Não pensa negativo, isso vai se resolver, sua mãe vai aparecer - ele tenta me confortar como sempre

Depois disso, o único som que rompia aquele silêncio que reinou entre nós, era o dos meus soluços. Não faço a mínima idéia do que eles podem estar conversando lá em cima, a tia Martha pode estar correndo perigo, ou pode estar sendo manipulada mais uma vez. Queria que o chão abrisse debaixo de mim, de uma vez por todas. Sinto os braços de Ben me envolvendo num abraço apertado, me transmitindo tudo de bom que eu não estava encontrando em mim...coragem, força, garra.

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Até a próxima