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    A noite estava fria e chuvosa. O pequeno garoto olhava pela janela, observando a água que caia e as folhas que voam com o vento forte. Ele apoiava sua cabeça em seus cotovelos, com as palmas em suas bochechas, enquanto tampava seus ouvidos com os indicadores por conta do assovio do vento que soprava pela janela.

_ Já está na hora de dormir. - Disse seu pai tranquilamente enquanto segurava uma caneca de chocolate quente.

_ Estou sem sono. Não posso ficar aqui mais um pouco? - Disse o garoto calmamente sem se mover.

_ Imaginei. Você sempre fica assim quando chove. - Disse sorrindo. - Aqui está seu chocolate quente, tome antes que esfrie.

    O pai deixou uma caneca na janela, ao lado do filho e seguiu para o seu quarto deixando a luz da sala e das escadas acesas. O tempo não melhorava do lado de fora e o garoto agora mudava seu foco para a água que escorria na valeta da calçada; então ouve-se o estrondo de um trovão e as luzes se apagam. O garoto permanece imóvel, como se nada tivesse acontecido, e uma presença anormal faz os cabelos de sua nuca arrepiarem.

_ Pelo visto você estava me esperando. - Disse uma voz misteriosa que não era possível discernir se era homem ou mulher.

_ É meu aniversário de doze anos. Você mesmo disse que viria hoje. - Disse o garoto ainda imóvel.

_ Sim, eu disse, mas não imaginava que você se lembraria. - Ouve-se uma leve risada. - Vocês nunca lembram.

_ Imagine que eu não era o primeiro.

_ Até que você é esperto para sua idade.

    O silêncio paira sobre a sala de tal forma que parece que a chuva e o vento cessou e só é quebrado por passos que seguem em direção a escada.

_ Espere. - Disse o garoto sem desespero.

_ Diga. - Disse a voz tranquilamente.

_ O que você vai fazer?

_ O que deve ser feito.

_ Não tem como deixá-los em paz?

_ Não sou eu quem faz as regras, garoto.

_ Então você é só mais um mandado. Achei que isso só funcionava com criaturas da Terra.

_ E quem disse que não sou desse planeta?

_ Alguém fazendo o que você faz, não deveria ser.

_ Há muito mais nesse planeta do que você imagina, garoto. Até as coisas que você conhece podem não ser como você acha que é.

_ Por exemplo?

_ Não tenho tempo para isso, tenho que terminar o que vim fazer antes da meia-noite.

_ Não tem nada que eu possa fazer para impedir?

_ O que você tem em mente? - Disse a voz com empolgação.

_ Algum tipo de troca.

_ Uma troca? - A voz ri alto. - E o que um garotinho poderia me dar em troca da vida de seus pais?

_ O que você quer em troca?

    A voz gargalha, mas ninguém acorda. Os passos se afastam da escada e seguem em direção ao garoto, que continua imóvel. Algo pontiagudo arranha lentamente o braço direito do garoto, abrindo um  leve corte da altura do pulso ao cotovelo e o sangue começa a escorrer sem pressa, mas o garoto permanece imóvel.

_ Eu gosto de você, garoto, você é divertido. Pois bem, abrirei uma exceção. Eu deixo seus pais em paz, mas quero que você olhe em meus olhos.

    O garoto treme ao ouvir a proposta e começa a suar frio. Ele vira lentamente para voz e, quando seus olhos a encontram, ouve-se novamente o estrondo de um trovão e a luz volta para a casa.

_ Filho! Você está bem? - Disse o pai descendo desesperadamente a escada. - Filho?

    O pai olha pela a sala e não encontra seu filho, mas percebe um detalhe, a caneca de chocolate quente, que parecia fria, no batente da janela. Ele se aproxima e vê o chocolate completamente duro e com bolor e uma grande rachadura na caneca. Ele para sem entender, olha para a valeta onde a água da chuva corre e sua nuca se arrepia com uma estranha presença.

Contos de um homem comumOnde histórias criam vida. Descubra agora