Capítulo II

60 32 4
                                    

Hector sentia a cabeça latejar, abriu os olhos que ainda estavam muito sensíveis a luz do dia e com um certo esforço, ficou a fitar o extravagante lustre de cristal que enfeitava o teto do quarto forrado de madeira. Lembrou-se dos sonhos perturbadores que teve enquanto dormia, murmurou alguns palavrões e mexeu-se bruscamente na cama fazendo com que o belo corpo nu que estava ao seu lado também acordasse.

A moça, por sua vez o desejou um bom dia, mas Hector não a respondeu, odiava esse tipo de cumprimento por fazê-lo lembrar que há bastante tempo não tinha um dia, uma tarde ou uma noite boa. Mas não fez muita diferença para ela ter ficado sem uma resposta, já que a mesma se aninhou ao corpo também nu do rapaz, passeou os seus dedos finos e delicados pelas cicatrizes no peito dele e reparou que aquele homem, nem jovem, nem velho, talvez tivesse passado por vários maus bocados. Mas esse momento não durou muito, Hector sentiu-se desconfortável, se remontou e foi ao banheiro. Gritou lá de dentro que quando saísse queria estar sozinho. Ficou bastante tempo ali. Até que alguém bateu à porta do quarto e deu um recado do Capitão, o velho queria o ver.

Já era meio tarde, mas Boorman ainda tomava seu desjejum acompanhado da Cicely quando Hector foi ao seu encontro:

– Madre Superiora, Senhor Capitão! - Disse ele cumprimentando os dois.

– Sente-se conosco, Hector! – Cicely o convidou. – Você deve estar faminto!

Hector não sentia fome, na verdade, sentia um mal-estar, sua cabeça ainda doía um pouco e seu estômago ardia, mas ele se sentou a mesa e tomou um copo de água.

– Tive uma boa noite e me sinto mais vivo do que nunca! – Boorman desatou a falar e essa frase que ele proferiu acabou gerando um clima descontraído ali, até porque os três sabiam que na noite anterior o velho poderia ter partido dessa pra uma melhor. – Mas aqui estou, ao lado das pessoas que eu mais gosto e confio nesse mundo, desfrutando um café da manhã farto e prestes a ir atrás do miserável que mandou um patife pra me matar. Acho que o meu dia vai ser muito bom!

– Provavelmente será melhor que o meu. – Disse Cicely enquanto mordia uma vermelhíssima maçã.

A mesa do café da manhã estava cheia de coisas apetitosas. Hector vasculhava tudo com os olhos a procura de alguma coisa para beliscar e enganar seu estômago que queimava, mas só de ver aquele monte de comida o seu mau estar aumentava de um jeito angustioso. As coisas ficaram muito sérias quando o cheirinho de café que invadia toda a sala de jantar penetrou pelas suas narinas. Cicely e Boorman perceberam na hora que o rapaz não estava nenhum pouco bem:

– Ressaca, não é, Hector? - Ela perguntou e Hector apenas fez que sim com a cabeça. Boorman, no entanto, não perdeu a oportunidade e sacando seu cantil dourado de dentro do seu bolso falou:

– Sabe o que cura ressaca, Rapaz? Álcool! – Deu um gole e jogou o cantil para Hector.

– Boorman, seu bebum miserável! – Ele reclamou, deu um pequeno gole e fez uma careta quando sentiu a bebida descer queimando seu peito.

Cicely e Boorman riram muito.

– Ontem, quando te vi entrar na taverna você parecia um pouco atônito, Hector! – Comentou a mulher. – Posso saber o porquê?

– Não foi nada! – Era só o que ele falaria, mas os olhos de Cicely não desviavam dos olhos dele. Ela estava com um semblante sério e sua sobrancelha arqueada acusava de que aquela curta resposta não a tinha satisfeito. Ele respirou fundo e continuou – Você fez um bom negócio em ter matado Downing e assumido o lugar dele. Agora a taverna está sofisticada e agradável. Não é mais aquele amontoado de sujeira e bêbados como era da última vez que estive aqui.

O zepelim do Sr. RaynottOnde histórias criam vida. Descubra agora