LIA
Deixei o Fred embaixo da Matilda sem vontade de sair dali e subi até meu quarto para pegar meu violino e acompanhar meu pai na cantoria.
Desde o início, quando demonstrei meu interesse pela música, dois anos depois de minha mãe nos deixar, ele sempre me incentivou, tornando uma tradição tocarmos juntos na varanda aos finais de tarde. Mesmo quando eu ainda era uma iniciante, que apenas arranhava os nossos ouvidos sem conseguir acertar uma única nota no violino, lá estava o velho Joseph me colocando para cima todas as vezes que sentia minha motivação sair correndo.
Aproveitei para prender meu cabelo num coque abacaxi e retocar o batom, já que sempre filmavam nossas apresentações e queria estar bonita.
Quando desci, todos já se aglomeravam em volta da fogueira, pois a noite estava ficando realmente gélida. Vi Noah e Kate cochichando animados, bem de frente para o pequeno palco improvisado por meu pai, que já estava sentado com o violão no colo.
— Vem, filha! Que tal começar com aquela que o pai gosta de ouvir você cantar? – assenti com a cabeça e apoiei meu case no banco ao seu lado.
Peguei o violino de dentro da maleta de veludo preto, encaixei a espaleira, do mesmo tom de verde brilhante do meu instrumento de estimação, e o posicionei no ombro para verificar sua afinação. Sustentei meu instrumento com o queixo para segurar o arco e passar pelo breu algumas vezes, até a crina estar completamente branca. Bati levemente no dorso da minha mão para tirar o excesso e posicionei o instrumento no lugar correto novamente.
Passei o arco nas cordas algumas vezes, para me certificar que o som estava perfeito, antes de começar as primeiras notas de Tocando Em Frente, a música preferida do meu pai.
"Ando devagar
Porque já tive pressa
E levo esse sorriso
Porque já chorei demais
Hoje me sinto mais forte
Mais feliz, quem sabe
Só levo a certeza
De que muito pouco sei
Ou nada sei
Conhecer as manhas
E as manhãs
O sabor das massas
E das maçãs
É preciso amor
Pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir
Penso que cumprir a vida
Seja simplesmente
Compreender a marcha
E ir tocando em frente
Como um velho boiadeiro
Levando a boiada
Eu vou tocando os dias
Pela longa estrada, eu vou
Estrada eu sou"
Senti uma emoção a mais na segunda parte da canção e fechei os olhos por um momento, me focando apenas nas notas que precisava executar.
Ao abri-los, encontrei com os de Fred fixos em mim, me fazendo falhar no começo da estrofe e deixei a pequena plateia continuar, até que eu pudesse me recompor do nó que se formava em minha garganta.
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AMOR NAS ALTURAS
RomanceA doce Lia é uma violinista nascida no interior de São Paulo e criada pelo pai após a morte precoce de sua mãe. Com o coração cheio de histórias românticas e a cabeça nos estudos musicais a vida toda, ela nunca sentiu o estômago cheio de borboletas...