NA PRÁTICA, QUAL É A FUNÇÃO DA ESCOLA E DO PROFESSOR?

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– Antes de começar a aula, peço que se levantem para uma oração – rogavam algumas professoras do primário.

E assim rezávamos um "Pai Nosso" e uma "Ave Maria".

Havia um aluno que permanecia sentado e em silêncio nesses momentos de fé; eu achava estranho e um dia decidi perguntar-lhe por que não participava.

– Eu não sou cristão – esclareceu-me o menino.

– Como alguém pode não ser cristão? – perguntei aos meus pais, quando cheguei à minha casa.

– As pessoas têm diferentes religiões, meu filho; a propósito, se você encontrar alguma mais interessante que a nossa, sinta-se livre e despreocupado para mudar – foi a resposta que recebi.

Alguns anos depois, no ginásio, tive uma disciplina chamada "Ensino religioso", um título autoexplicativo para uma matéria cuja função era nos apresentar religiões, no plural; uma pena que a docente responsável por ministrar as aulas, católica assídua, ensinou religião no singular.

Voltando ao primário, na quarta série, participei, obrigatoriamente, de um programa de resistência às drogas e à violência. Foram dezessete semanas assistindo às aulas de um policial que nos orientou a:

·      Falar quando for a nossa vez e ouvir quando outra pessoa estiver falando;

·      Dizer "não" quando alguém nos pede para fazer algo errado, perigoso ou que, simplesmente, não concordamos;

·      Não tocar em outra pessoa de modo que ela não goste;

·      Não rir ou ferir os sentimentos de outra pessoa pelo fato de ela ter uma ideia, opinião, hábito, cultura ou aparência diferente;

·      Não agredir pessoas com palavras, muito menos agredir fisicamente...

"Já vi isso antes!", pensava eu, porque obediência, respeito e religião, assim como etiqueta, moralidade, sexualidade etc. meus pais haviam me ensinado em casa. Nas instituições de ensino, eu esperava aprender o clássico, todavia:

– Como assim vocês não conseguem ler e escrever? Vocês têm todos os sentidos, comeram papinha e tomaram leite materno na infância; acordem para a vida; vocês não estão mais na barriga de suas mães! – diziam as professoras da pré-escola...

– Como assim vocês têm dificuldades para interpretar o enunciado do exercício? Vocês foram alfabetizados antes de chegarem aqui; usem o cérebro para alguma coisa; vocês não estão mais na pré-escola! – afirmavam as docentes do primário e do ginásio...

– Como assim o vestibular está exigindo assuntos que vocês nunca viram? No edital, vocês tinham acesso ao conteúdo cobrado; se não lhes ensinaram na escola, peguem os livros e aprendam sozinhos; vocês não estão mais no ensino fundamental! – declaravam os professores do colegial...

– Como assim não dei esta matéria antes de cobrá-la na prova? É conteúdo de vestibular e vocês foram aprovados; se não têm a base necessária para o curso, corram atrás do prejuízo; vocês não estão mais no ensino médio! – asseveravam os docentes da graduação...

Enquanto isso:

– O professor não ensina – proclamavam os especialistas –, apenas facilita o aprendizado do aluno.

Sei...

Memórias póstumas de um aluno qualquerOnde histórias criam vida. Descubra agora