VICTOR
Eu não queria ir a aula, estava cansado, a noite tinha sido tão longa, e o mais engraçado é que meu sono foi tão curto como em quase todas as noites, e não é falta de tentar dormir, viro de um lado para o outro, aperto os olhos para abrir apenas no outro dia, mas em menos de 10 minutos estão abertos de novo e minha insatisfação é imensa. Consegui dormir apenas às 5h00 para escutar a porra do despertador tocar 6h00. Quase quebrei meu celular, mas me contive, não teria outro para me divertir um tempo e escutar minhas músicas o dia todo.
Me levantei cansado, lavei meu rosto e escovei meus dentes, coloquei aquele uniforme mais uma milésima vez, já estava enjoado de vê-lo todos os dias, aquela cor, aquele emblema estampado já me dava raiva. Verifiquei meus materiais na mochila, a coloquei nas costas e segui rumo à escola. Meus pais provavelmente já haviam saído para trabalhar, então ficava na minha responsabilidade trancar a porta assim que saísse e também limpar a casa era meu dever, afinal apenas eu ficava em casa o dia inteiro.
– Victor, quanto tempo!!! – Aquela ironia eu já conhecia de longe.
– Aah não David não aguento mais te ver, qualquer dia desses irei vomitar só de tê-lo na minha frente. – Disse no mesmo tom de ironia que ele.
– Até parece, você adora me ver, ainda mais hoje, você deveria me agradecer, só eu posso te salvar nas aulas de inglês, você é péssimo nisso, precisa da minha ajuda hahaha.
Desta vez David estava totalmente certo, odeio inglês e o professor também, isso dificulta muito meu aprendizado, é melhor estudar em casa do que tentar entender as aulas incrivelmente chatas do professor Renato.
Entramos e logo as aulas começaram, este era o pior horário, porque eu começava a sentir um sono intenso, mas não podia dormir e mesmo sabendo disso ainda cochilava e acordava com os gritos dos professores.
Na hora do intervalo estava sozinho, David tinha ido ao dentista e infelizmente só voltaria na última aula que seria a de inglês. Então aproveitei esse minúsculo tempo para observar tudo ao meu redor. Todos pareciam estar muito alegres, eu queria tanto ser como eles, porém estava o tempo todo triste e totalmente vazio, apenas fingia todo aquele positivismo e sorriso no rosto. Minha atenção neste momento, aliás quase o tempo todo era naquela garota, ela era tão linda, tinha um estilo que eu adorava, até seu cheiro era maravilhoso. Helena conversava com sua amiga tão empolgada, acho que se chamava Maria, ou Mariana, talvez Milena, não me lembro, na verdade não me traz interesse saber também. Passei tanto tempo a observando que o sinal tocou e ela lançou o olhar em minha direção, pois era uma das poucas pessoas que ainda estava no corredor, na mesma hora senti meu rosto queimar, abaixei o olhar e voltei a realidade quando aquela mulher chata da secretaria que não faz nem seu trabalho direito me mandou para a sala como se fosse a dona da escola, mas mesmo assim obedeci para não ter mais reclamações.
A aula se passou e logo vi David entrando na sala com uma cara de quem não tinha nenhum dente mais. Sendo sincero ele havia ido tirar uma cárie que o incomodava há algum tempo, não era tanto assim.
– Meu Deus do céu Victor, estou me sentindo desdentado, se eu pudesse não voltaria mais lá, infelizmente necessito ir neh, preciso do meu sorriso impecável.
– Aaah você é tão dramático as vezes. Vamos fazer logo isso para irmos para casa.
Ao final da aula o pai de David havia ido buscá-lo e estava muito enfurecido, e raramente isso acontecia. Olhei para o meu lado e o rosto do meu amigo demonstrava medo, chegou a ficar até amarelo. Despediu-se tão rápido que nem minha resposta foi capaz de esperar.
David passava por muitas dificuldades com o pai, ele era preconceituoso, traficante e sempre descontava seus dias ruins no garoto.
– Oi preguicinha sentiu saudades ? – Disse com voz dengosa para Bob, o nosso cachorrinho, que havia me recebido com os pêlos para o alto.
Arrumei a casa, almocei e me deitei, coloquei uma playlist de músicas aleatórias e resolvi ligar o computador. Desmoronei na cadeira e comecei a chorar do nada, comecei a lembrar de coisas do passado em seguida e então não consegui parar mais. Tirei meu moletom e meus cortes ficaram à mostra, não queria mais marcar meus braços com uma maldita lâmina, nem chorar como um bebê quase todos os dias, me sentindo um inútil como sempre e mesmo assim não procurar ajuda.
30 de julho de 2014
– Dayane não corre, mamãe pediu para ficarmos perto, não podemos ir para longe, você sabe. – Disse meio aflita com minha irmã.
– Cala a boca Clara, você é um bebê chorão, por isso odeio sair com você, precisa ser tão chata assim todas as vezes ? Estamos bem, ficaremos bem. Só me segue. – Ela saiu correndo, fui atrás, mas estava com tanto medo.
Estávamos perto de um rio e logo a frente havia uma ponte, não estava totalmente quebrada, mas estava velha, então poderia ceder muitas partes suas. Eu não queria passar por ali, e Dayane insistiu que fossemos naquela direção.
Ela saiu correndo e naquela hora meu coração apertou como nunca antes e a pior cena se passou na minha frente, Dayane errou o pé, a ponte cedeu e quase metade dela caiu junto com a minha irmã que desapareceu no imenso rio. A única coisa que fiz foi gritar e gritar muito, logo várias pessoas apareceram desesperadas, eu estava em choque, não conseguia respirar, o SAMU foi chamado e fui parar no hospital em estado grave de asma. Meus pais foram localizados, me encontraram no hospital e tiveram que esperar pelo corpo de Bombeiros para resgatar o corpo de Dayane que foi encontrado 3 dias depois em um estado deplorável, faltavam vários membros. De acordo com a autópsia, seus órgãos vitais foram massacrados, pois as partes que caíram da ponte cedeu em cima de seu corpo.
Eu não pude salvá-la, vi a pessoa que mais amava morrer, e meu mundo desmoronou.
Eram lembranças perturbadoras, que me deixavam louco, ela tinha apenas 15 anos, eu deveria ter a impedido de ir lá, não queria vê-la morrer, queria tanto ter Dayane ao meu lado agora. Só ela sabia me deixar bem, tinha os melhores abraços, sempre estava pronta para me proteger e eu fui tão inútil que não fui capaz de protege-la, de evitar aquela tragédia.
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No Labirinto da Escuridão
Mystery / ThrillerTudo começou quando minha vida acabou. Parece ironia, mas estava vivo enquanto o meu corpo e coração se dilacerava e eu morria. O ar não era suficiente para me manter vivo, faltava algo, faltava essência e todos os dias um novo ciclo vicioso de fant...