Cap. 1

113 5 0
                                    

Saí do castelo assim que começou a nevar. A neve cai em pequenos flocos, tão leves quanto o ar dessa manhã.
Saí porque precisava respirar ar fresco, me distanciar um pouco do meu pai e da minha irmã mais nova, Emily. Distanciar-me dos empregados e cozinheiros, mas principalmente distanciar-me de Ivan, meu futuro noivo. Estou prometida a ele desde que nasci, temos dois anos de diferença. Não o amo. Na verdade, nunca amei ninguém de verdade, então não posso dizer o que é o amor ou como ele pode ser ou até mesmo como é senti-lo. Mas definitivamente não amo Ivan. Quando era pequena, o máximo de afeto que senti por alguém não era da minha família, foram algumas paixonites e trocas de olhares, mas não muitas, nada mais que isso.
Essa é uma das coisas com que não concordo com o reino em que vivo. Nós, membros da família real, simplesmente não temos o direito de escolher com quem iremos casar, a não ser que tenhamos um candidato à altura até os dezesseis anos, até aí, somos livres para escolher com quem casar, essa escolha deverá durar, no máximo, até os vinte anos da mulher escolhida. Se não casarmos até o dia do nosso vigésimo aniversário, não teremos mais o direito de escolhermos ninguém e então teremos de assumir o trono sozinhas e nos tornar a ovelha negra da família, sem ninguém para dividir o trono.
Para tal importuno ser evitado, nossos pai escolhem pretendentes no dia de nosso nascimento, para que tenhamos com quem casar quando chegar a hora. Para o povo, ainda assim podemos negar o casamento arranjado, mas, cá entre nós, isso não é, de fato, verdade. Outra regra, é que o casamento só é permitido se os dois cônjuges forem da família real, sejam eles Reis ou Condes.
Meu pai é o rei de Nerínea, eu e Emily somos as princesas.

***

Caminho em meio à neve, me distanciando cada vez mais do castelo, tropeçando, às vezes, em minha capa. Saí com ela porque estava frio e também porque não queria ser reconhecida. Me perco em pensamentos enquanto ando, tenho muita facilidade em fazer isso. Não presto muita atenção para onde vou, mas sei que é para algum lugar perto da vilas. As coisas tem andado meio confusas lá. Não sei porque mas não nos fornecem muita informação dentro do castelo. Só meu pai as recebe e ele tem tentado ao máximo nos proteger. De que eu não sei. Gostaria que meu pai fosse mais aberto conosco, se não com Emily pelo menos comigo, não sei se ele sabe que pode contar comigo.
Em meio aos pensamentos desacelero meus passos, quero demorar um pouco mais do lado de fora. Caminho com calma por um lugar deserto. Esse é o caminho mais longo para chegar às vilas, por isso o escolhi. Quando viro a esquina de um beco há um grupo de homens no final da rua. Sinto o medo emanando de mim como sono, que chega derrepente e te domina por completo. Dou meia volta e me apresso a chegar no começo da rua de novo. Ouço passos atrás de mim e tenho certeza de que estou sendo seguida. Abaixo a cabeça para que não me reconheçam por baixo do capuz e começo a correr. Alcanço o final da rua e vou em direção ao caminho mais curto para chegar às vilas. Estarei mais protegida lá do que se os levar para o castelo. Sou surpreendida por outro grupo vindo em minha direção e paro por dois segundos, sem saber pra onde correr. É o suficiente para que os outros homens, os que me seguiram do beco, me alcancem. Um deles agarra meus pulsos, me impedindo de correr. Mãos grandes e pesadas seguram firmemente meus braços próximo às minhas costas. Me debato tentando soltar-me de quem quer que esteja me segurando.
Uma dor lancinante invade primeiro a minha cabeça, minha nuca, e depois todo o meu corpo, deixando-me leve e pesada ao mesmo tempo. Vejo pequenos pontos pretos em frente aos meus olhos se misturando em meio à paisagem. Pisco algumas vezes para tentar afastá-los, mas recebo outra pancada e tudo fica escuro.

Sem VoltaOnde histórias criam vida. Descubra agora