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-Extra extra!! Compre agora seu jornal!
Uma rua em Londres, 1912. Típico cenário de histórias de mistério policial e detetives, então não preciso detalhar muito o cenário enevoado e nublado com casas de madeira e tijolos. Poucas pessoas passavam na calçada, a maioria homens de blazer e terno, poucos pobres e esfarrapados.
Uma menina, de prováveis dez anos, me viu sentada em um banco em frente a uma cafeteria, comendo um salgado e descansando numa tarde chata, e me encarou disfarçadamente.
Fiquei incomodada por ela estar me defrontando, mesmo não olhando para ela, mas ao notá-la, vi o rosto de uma pobre com fome.
-...
Eu estava comendo uma bela esfirra, bastante recheada com queijo prato, e com uma certa pena dela, a chamei acenando.
-Alicce.
A garota estremeceu, estranhando eu saber o seu nome. Mostrei a esfirra e a chamei.
-Pode ficar -ofereci.
-...
Alicce, tímida, se aproximou encarando o recheio deslumbrante, visível por conta da minha única mordida e pegou de minha mão. Sorriu, e eu sorri de volta, e se lembrando do que sua mãe sempre falava para ela fazer quando conseguia uma esmola, exclamou:
-Muito obrigada moça!
-De nada -respondi alegre.
Saiu andando na direção de onde veio, indo para o lugar onde trabalhava. Uma sapataria a três quadras dali. O dono, velho carrancudo, não gostava de comprar comida para ela, e exigia para que a criança fosse buscar algo para comer na rua, sem nenhum tostão. Um triste caso de trabalho infantil, comum no começo do século XX.
Alicce tinha cabelos escuros, compridos, vestia um macacão por cima de uma blusa e usava uma tiara para segurar o cabelo na frente dos olhos. Tinha duas sapatilhas diferentes em cada pé, uma azul, e outra preta. Mesmo pobre era gentil e sorridente.
Voltei a me concentrar na rua, observando os pedestres. Mal sabem que daqui a alguns anos uma bela guerra vem aí. Depois de 1912 a humanidade se provaria o monstro que é.
-Extra Extra!! Traição na família real! -gritava um pequeno com vários papéis na mão.
Olhei por um tempo o jovem no outro lado da rua, vendendo jornal. Estava triste pois ninguém dava atenção aos gritos de oferta dele, que balançava o rolo de jornais na mão. Os pedestres desviavam dele sem nem o olhar, eram raros os que pegavam o papel.
Deu um pouco de dó.
-...
Uma pessoa vestida de preto, com um chapéu na cabeça, se sentou à minha direita, lendo o jornal comprado na banca em uma esquina. Folheou por algum tempo e depois olhou para o garoto meio escadaloso, e carrancudo, resmungou.
-Tsk. Baderna desnecessária.
A criança era ruiva flamejante, e usava uma boina, e parecia ter só dez ou onze anos.
-Ele não vê que está em um lugar péssimo para se vender jornal? Há uma banca a apenas duas quadras daqui -comentou a pessoa ao meu lado.
-Bom, ele pelo menos é persistente.
Alicce, a simpática menina que conheci agora pouco, foi até o garoto e dividiu a esfiha para ele, e em seguida o ajudou a atrair pessoas para vender o jornal. Eram amigos.
-E olha só: Pelo menos ele tem uma bela ajuda certo?
-Aquela menina se parece com você -disse a pessoa.

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Lullaby: Dark
Science FictionA realidade não foi fácil para Beatricce; família quebrada, problemas na escola... Ela cresceu bastante fechada e melancólica, sempre procurando por uma verdadeira amizade, mas pelo menos, sempre foi alguém que entendeu muito bem de videogames e pro...