Capítulo II

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Depois de uma longa discussão com meu pai, eu fui levada até meu quarto com minha mãe me acompanhando, ela prometeu me vigiar de perto e não deixar que eu fugisse de novo, e garantiu que assumiria toda a responsabilidade caso algo acontecesse.

Quando entramos no quarto percebi que tudo estava exatamente do jeito que eu havia deixado, ninguém havia entrado lá pelo menos. Fui até a janela e observei o reino vazio, enquanto isso minha mãe fechou a porta e veio falar comigo.

— Serena, onde você esteve durante esse tempo? — ela perguntou me direcionando um olhar de paciência, eu notei que seus olhos pareciam mais inchados, provavelmente porque ela havia sofrido demais com minha ausência. Abaixei minha cabeça sem saber o que dizer, eu precisava cumprir a promessa que havia feito ao meu pai, mas não podia mentir pra minha mãe.

— Me desculpe, mãe. — falei, já sentindo uma grande vontade de chorar. — Eu não posso lhe contar, mas fique sabendo que onde eu estava, eu estava bem. — completei, ainda cabisbaixa. Senti minha mãe tocar meu rosto e suavemente levantar minha cabeça.

— Está tudo bem, querida. — ela disse com sua voz doce. — Tem algo que você queira me contar, algo que você possa me contar? — ela perguntou e eu dei um longo suspiro que fez várias bolhas surgirem na água. Eu não queria conversar, nem queria ser incomodada, eu só queria ficar sozinha pra organizar meus pensamentos e talvez descansar um pouco.

— Será que seria pedir muito pra ficar um pouco só? Estou cansada demais pra conversar, desculpa mãe. — eu disse e ela apenas balançou a cabeça positivamente e se afastou, saindo do meu quarto logo em seguida.

Durante toda a confusão eu acabei esquecendo da morte das duas pessoas que eu mais amava, Marta e Magda, meu coração apertou, e foi uma dor tão forte que eu achei que me juntaria à elas. Comecei a chorar desesperadamente, parece que só sentimos a dor de verdade quando estamos sozinhos, e eu estava completamente só.

Se Benjamin estivesse aqui comigo tudo seria bem mais fácil de suportar, mas ele não pertencia ao meu mundo, e eu jamais voltaria a vê-lo, não sentiria seus braços quentes me envolvendo em um abraço apertado, nem veria mais seu sorriso largo toda vez que eu dizia algo engraçado ou fazia cara feia ao comer um hambúrguer. Eu não conseguia entender como em tão pouco tempo uma pessoa conseguiu me captar totalmente, e nem como eu pude me apaixonar tão rápido. Mas eu sabia que o que eu sentia era real e eu ia guardar esses sentimentos pra sempre no meu coração.

★★★

— Acorde, querida! — ouvi a voz da minha mãe me chamar suavemente, eu ainda não conseguia distinguir se isso era sonho ou realidade. Resmunguei alguma coisa que eu não consegui entender e abri meus olhos, e mal pude acreditar no que eu estava olhando, com certeza isso era um sonho, não podia ser real.

— Magda? — perguntei esfregando os olhos e completamente incrédula. — Estou sonhando? — perguntei ainda me sentindo confusa.

— Não, isso não é um sonho, sou eu mesma! — ela disse com um tom de animação que quase me fez fugir novamente, eu ainda não enetendia o que estava acontecendo ali. — Assim que soube que você estava aqui, vim o mais rápido que pude, porém o seu pai não sabe disso. — ela completou com um tom melancólico na voz, imaginei que meu pai estivesse tão aborrecido com ela como estava comigo, e eu sabia que, pelo fato de não conhecer seu próprio pai, ela sempre tivera um carinho paterno muito grande por meu pai, que também demonstrava o mesmo por ela.

— Mas... — foi tudo que consegui dizer, eu não conseguia pensar direito, já que Magda supostamente deveria estar morta, assim como sua mãe.

— Será que poderíamos conversar a sós por um minuto? — ela perguntou a minha mãe, como se pudesse ler meus pensamentos. Minha mãe relutou um pouco, mas depois avisou que estaria na porta, caso fosse necessário sua presença, e obviamente, para que eu não fugisse novamente.

Assim que a porta se fechou, Magda sentou-se ao meu lado e me olhou fundo nos olhos, percebi que ela sabia de tudo, inclusive o motivo da minha confusão ao vê-la.

— É, estou viva. — ela começou a falar, o que me deixou bastante surpresa. — E minha mãe também está, não se preocupe. — ela continuou com um tom de voz suave, como se isso não significasse muita coisa.

— Mas como isso é possível? Eu vi, vi vocês duas mortas, as visões de uma sereia nunca mentem. — falei indignada, e Magda me lançou um olhar de incompreensão. Não era que eu não estivesse feliz pela visão ter sido falsa, eu estava feliz em saber que elas estavam vivas, mas eu tive que largar tudo pra voltar até Aquorus por causa delas.

— A não ser que sejam alteradas por uma grande feiticeira. — ela disse. — Olha, Serena, minha mãe precisou fazer isso pra que você voltasse, seu lugar é aqui e foi um erro deixar você andar no mundo dos humanos. — ela disse com um tom de culpa, como se tivesse matado alguém ou ajudado a matar.

As palavras de Magda me atingiram em cheio, olhei pra ela com raiva e indignação, como ela podia julgar que andar no mundo dos humanos fora um erro? O que ela sabia, afinal? Ela não sabia de absolutamente nada que havia acontecido por lá, e não podia fazer uma especulação dessas, já que eu pude me sentir viva pela primeira vez, e eu senti isso no meio dos humanos, daquelas criaturas que as Sereias e Tritões tanto desprezavam, mas que tinham um modo de viver único.

— Você não sabe se foi um erro, e vocês não tinham o direito de fazer isso comigo. — retruquei enfurecida.

— Minha amiga, existem muitas coisas que você ainda não compreende, e sequer teria como compreender, apenas acredite que o que fizemos, foi o melhor pra você. — Magda disse em um tom suave e delicado, na tentativa de me acalmar, porém sem êxito.

— Vá embora Magda! — gritei, sem me importar se alguém estava escutando. — Vá embora daqui, já! — gritei em meio aos prantos. — Você não sabe o que tive que deixar pra trás, não sabe as experiências que vivi, e agora terei que me casar com um Tritão que sequer conheço. — continuei gritando, quando minha mãe entrou em disparada no quarto e me segurou por trás, tentando me acalmar. Magda em choque, apenas saiu do quarto, sentindo-se abalada por cada palavra minha, mas eu não me importei, ela tirara de mim tudo o que eu mais havia desejado, e agora eu estava sem rumo, sem chão e com medo.

Me encolhi no abraço aconchegante de minha mãe, lembrando de tudo o que eu tinha vivido em Nova York, lembrando de todas as cores vibrantes, das comidas diferentes e principalmente das pessoas incríveis que conheci, me deixei ser levada por essa tristeza profunda, pela sensação de medo com relação a incerteza do meu futuro, e percebi que na verdade,  tudo que eu tinha vivido não passava de um sonho, ou teria sido mesmo real?

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⏰ Last updated: Sep 09, 2020 ⏰

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Serena - Livro II Where stories live. Discover now