❤ Prólogo

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André

7 anos

Vrum, vrum, vrum.

Movimento o carrinho de fórmula 1 no sofá, sem deixar de segurar minha bexiga amarela com a outra mão. Amei meu presente de aniversário! Com esse, minha coleção acaba de completar dez carrinhos. Dá para fazer uma corrida legal.

Eu tinha pedido um mini game igual do Jorginho lá da escola, mas papai explicou que é muito caro e que ainda não deu para comprar. Quem sabe no Natal, né? Vou torcer para arrumar um novo emprego logo, mamãe disse que ele está tentando muito dar um futuro melhor para nós.

Olho para baixo e sorrio para o papai. Eu sei que vai conseguir, ele é o meu herói! Recebo um sorriso de volta enquanto termina de amarrar meu tênis.

Viemos para a casa da vovó de manhã. Teve a macarronada com carninha que eu adoro no almoço e, de tarde, a mamãe fez um bolo de chocolate com aqueles negócios coloridos em cima. Vovô Jeremias também encheu umas bexigas para colocar na parede e estourou pipoca na panela.

Hummm... estava uma delícia! Só faltou tio Deco e meus priminhos. Eles não puderam vir porque foram viajar para a casa nova da mãe da tia Rosana, no Rio de Janeiro.

— Gostou do aniversário, filhão? — papai pergunta e se levanta, limpando a calça.

— Amei, obrigado papai!

— Ano que vem, se Deus quiser, vamos conseguir fazer a festinha com seus amigos como você sempre quis.

— Oba! — Salto em um pulo do sofá, já querendo que chegue logo o próximo aniversário.

Será que demora muito? Um dia mamãe contou que é uma vez por ano. Parece que não é tão rápido. Será que tem como passar os dias mais depressa?

Sigo papai até a cozinha e vejo mamãe dando um abraço na vovó. Ela está com cara de brava, como faz quando eu apronto. Xiiii! Acho que a mamãe fez arte.

— Vou dar só uma passadinha, não chegaremos tarde em casa.

Vovó não responde para a mamãe, estica o braço e eu corro para seu colo. Abraço-a sem soltar meu carrinho nem minha bexiga. Ela deixa um beijo demorado na minha bochecha e passa a mão no meu cabelo.

Despeço-me do vovô da mesma forma e saímos juntos até a varanda. O sol já está indo embora, começou a ficar escuro.

— Vai com Deus, nha minino. Te amo!

— Te amo, vovô. — Olho para a vovó e mando um beijo, a cara feia dá lugar a um lindo sorriso para mim. — Também amo a senhora.

Ele sempre me chama de "nha minino". Significa "meu garoto" em crioulo, que é a língua nativa do seu povo. O bisavô dele veio lá da África para morar no Brasil.

A família do papai também veio desse lugar. Papai me mostrou no mapa e fica muito, muito longe. Segundo ele, ainda vamos viajar para conhecer pessoalmente o continente. Quase todo dia aprendo histórias novas sobre minhas origens, inclusive, a língua crioula. Já sei algumas palavras.

Mamãe explicou que eu nunca posso ter vergonha de quem sou e que devo repassar minhas raízes para meus filhos.

Seguimos em direção ao ponto de ônibus que fica na esquina. Não demora muito para ele chegar e a gente voltar para nosso bairro. Moramos na casa que era dos pais do papai. Infelizmente, não cheguei a conhecê-los. Viraram estrelinha no céu.

Estranho descermos na praça ao invés do lugar de sempre, mas estou tão entretido brincando com meu carrinho que nem faço perguntas. Há uma multidão de gente por todo lado. As pessoas estão falando alto, não dá para escutar nada do que mamãe diz.

Será que vai ter teatro de novo?

Sorrio, animado, e começo a observar para ver se encontro o palco. Semana passada aconteceu uma festinha aqui na praça e teve apresentação de fantoches. Foi muito legal! Ganhei até uma maça do amor da barraquinha do senhor Zé Milico.

Eu queria ficar até acabar, só que mamãe disse que é perigoso. Parece que alguns adultos bebem muito e podem arrumar briga.

Papai me pega no colo pela cintura e me coloca sentado em um banco. Fica parado ao meu lado, abraçando a mamãe. Os dois olham a multidão e eu continuo tentando encontrar onde está o palco.

De repente, tudo acontece muito rápido.

As pessoas começam a empurrar as outras e o falatório se transforma em gritaria. Alguém bate no meu braço e sem querer eu solto o balão que estava segurando. Olho para cima com os olhos marejados, acompanhando o amarelo se perder no céu escuro.

— André! André! Meu filho!

Viro a cabeça para a frente e mamãe já não está mais do meu lado. Nem ela nem o papai. Tento achá-los e só consigo ver a mão da mamãe para o alto. Ela está gritando meu nome e sendo empurrada para cada vez mais longe.

Papai me ensinou que se acontecer alguma coisa eu não devo sair do meu lugar enquanto não for seguro.

— Mamãe! — grito de volta, não conseguindo controlar o choro. — Papai!

Não o encontro em lugar nenhum. A gritaria ao redor aumenta, tem fumaça agora atrapalhando enxergar direito. Escuto barulho de tiro. Dessa vez não está longe como costumo ouvir lá de casa.

Está perto, perto demais. Vovô sempre diz que tiro é perigoso. Papai do céu, me ajuda, por favor!

Assustado, levanto no banco para tentar ver melhor. Mal estico meu corpo, alguém acaba me empurrando e, desequilibrado, caio de costas na grama. Sorte que é baixinho, não dói muito. Esfrego a mão na cabeça e noto que o carrinho não está mais comigo.

No mesmo instante que o enxergo, alguns centímetros à frente, uma menina passa correndo e o esmaga em vários pedaços. Choro ainda mais. Estou com medo, muito medo. Meu coração está acelerado no peito, parece que vai saltar para fora.

Sinto um gosto ruim de sangue na minha boca. Passo o dedo e vejo a mancha vermelha na pele. Quero sair correndo para a mamãe dar um beijinho e sarar, mas a voz suave do meu herói continua na minha cabeça me lembrando que não devo fazer nada enquanto não for seguro.

Quero que ele tenha orgulho de mim, que saiba que eu aprendi direitinho o que me ensinou. Arrasto na grama e me apoio atrás do banco. Se não posso ir atrás deles, tenho que ajudá-los a me achar de novo.

— Mamãe! — grito com toda a força dos meus pulmões. — Papai!

Continuo gritando, e secando as lágrimas que não param de descer, até perder a voz.

Até meu coração ficar fraco e não ter mais energia para bater tão rápido. 

Aêeeeee começamos! O que acharam deste prólogo? Me contem tudo! 

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Aêeeeee começamos! O que acharam deste prólogo? Me contem tudo! 

Hoje ainda, mais tarde, eu apareço com o capítulo 1. Depois, as postagens serão duas vezes por semana, na segunda e na quinta, como nos outros livros. 

Se você não leu a nota da autora, o dreamcast ou a epígrafe, volte alguns capítulos para ficar por dentro de tudo.

Estou muito feliz por começar mais uma obra emocionante da Série Sentidos. Espero que vocês gostem! 

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