9. Memórias

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Zoe era a serva pessoal de Athena e tinha muito orgulho disso. Fora levada para o Templo no dia seguinte à chegada da jovem deusa para tomar conta dela e de lá praticamente não saia, exceto para ir ao mercado da vila de Rodorio. Amava ser a responsável pelo bem-estar de Athena e deixava aquilo explícito para quem quisesse ouvir. E era muito difícil não ouvir Zoe.

A jovem mulher tinha a pele morena, cabelos negros, lisos e usava um lenço preso no cabelo, sempre mudando as cores, nos tons que Athena mais gostava. Ela tinha uma voz rouca e costumava dizer que fora de uma enfermidade na garganta que quase a matara na infância, mas os demais servos diziam que a era porque ela simplesmente não calava a boca. Se tinha alguém que gostava de falar, esse alguém era Zoe. Ela falava sobre tudo: sobre o tempo, sobre os outros servos, sobre o Grande Mestre, sobre os cavaleiros de Ouro e, claro, sobre Athena. Não havia nada que passasse despercebido para a serva e ela sempre sabia das últimas fofocas. As más-línguas diziam que ela era a fonte de todas as fofocas. Talvez a própria Zoe atribuíra-se aquilo, pois afirmava que não fazia fofoca; ela mantinha as pessoas informadas. No momento, seu assunto favorito era Sophia e o quanto estava satisfeita porque sua menina, era como costumava chamar Athena, estava mais feliz que nunca.

- Essa menina tem a alma de um antigo cavaleiro, tenho certeza. - dizia pela milésima vez à infeliz cozinheira, que apenas assentia, calada – Talvez até um antigo cavaleiro de Escorpião, veja bem, ela tá sendo treinada por mestre Lucius, não é? - ela deu uma pausa e estremeceu – Ele me dá calafrios, o cavaleiro de Escorpião... Sabe o que ouvi lá na vila mais cedo? Que ele obriga a pobre discípula dele a dormir com escorpiões, acredita? Dentro de um caixão! - ela não esperou a outra falar e já foi dizendo – Espero que Athena não saiba disso ou vai ficar muito preocupada.

- É só você não contar para ela, Zoe. - falou finalmente a cozinheira, que arrumava uma bandeja com bolo e chá.

- Eu não vou preocupar minha menina com isso! - exclamou Zoe ofendida, sua voz ficando mais rouca – Mas, sabe, isso pode chegar aos ouvidos dela, as pessoas são muito fofoqueiras...

A cozinheira apenas suspirou.

- Pronto, pode levar o lanche para a senhorita Athena. - disse empurrando a bandeja para Zoe.

- Claro. - assentiu a outra – Esse bolo foi o cavaleiro de Câncer que trouxe, não foi? Ah, deve ser, não é? Parece coisa dele. Ele me deu um pedaço de bolo da última vez, mas ele me dá medo, sabe? Esse negócio de falar com mortos... - ela estremeceu e, baixando um pouco a voz, perguntou – Sabia que ele não arruma namorada por causa disso? As mulheres têm medo por causa dos espíritos que ficam rodeando ele.... Pobre coitado, a mãe dele é doida por um neto... Quando ele vem aqui eu não tenho nem coragem de falar, veja só, fico bem longe, com medo. Mas os bolos dele são deliciosos!

- Zoe, o chá vai esfriar.... - murmurou a outra.

- Tem razão! Até daqui a pouco!

Pegou a bandeja e saiu cantarolando da cozinha. A cozinheira suspirou. Ela nunca ficaria com a garganta boa porque quando não estava falando, estava cantando. Como ela conseguia falar tanto?! Voltou aos seus afazeres, ainda ouvindo ao longe a voz de Zoe, até que ela parou de cantar abrutadamente. Será que tinha mordido a língua?, pensou a cozinheira rindo. Até que um grito alto e agudo, o grito de Zoe, encheu todo o templo de Athena junto com o barulho da bandeja caindo e o bule quebrando. A cozinheira se assustou e correu na direção da voz. Diversos guardas fizeram o mesmo. Quando chegaram lá, Zoe ainda gritava e apontava para o chão onde jazia Athena, desacordada.

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Sophia verificou mais uma vez a lista de compras. Não era muita coisa, então não precisava se apressar. Guardou novamente a lista do bolso e foi na direção das barracas de comida, na vila de Rodorio.

A Égide de AthenaOnde histórias criam vida. Descubra agora