Capítulo 5 - Nada parece absurdo

4 1 0
                                    

– Lily... Lily? – Estão me chamando, e começo a despedaçar de novo á medida que sou tirada para fora da lembrança. – Lily! Ah, você está aí! Eu disse pra Aaron não lhe deixar só. Eu pensei que... – Trudy corre até mim e se abaixa na escuridão para me abraçar. Eu sinto que todo esse carinho devia manter ao menos alguns pedaços juntos... Mas não acontece.

– O que você pensou, Trudy? Que eu havia me jogado na fonte e deixado a água encharcar meu pulmões? – Sinto-a menear a cabeça, acariciando meu cabelo com veemência e fazendo sinal pra que eu pare de falar. As "bobagens" ao menos. A não ser pelo fato de que não são bobagens... mergulhar de vez nas lembranças e deixá-las me levar.

– Deixe de tolice minha jovem. A vida...

– Não, Trudy. Não diga que a vida continua... Por favor. – Ela consente e me solta aos poucos, limpando meu rosto com a barra da blusa.

– Vamos? Precisamos arrumar umas coisas. – A voz dela está tensa.

– O que houve? Aconteceu alguma coisa?

– Kyle. Aquele cabeça de vento pegou um dos carros e saiu sozinho, sabe Deus para onde, em busca de uma garota! Jeb acha muito arriscado esperarmos passivamente. Vamos começar a organizar as coisas e os grupos pra evadir a qualquer sinal de ameaça.

"O'Shea arrogante. Será possível que já não bastava uma vida sem sentido nessas cavernas? Precisava por a perder a tranqüilidade de todos os outros?"

– Vamos, Lily.

– Eu... Vá na frente. Vou logo em seguida. – Ela quis rejeitar, então eu esbocei o sorriso mais seguro que pude. Ela sorriu um pouquinho e saiu.

Encostei-me na fonte e nada vi. O ar, a água, tudo estava negro, até mesmo o murmúrio era sombrio. Abaixei-me até os dedos tocarem a água morna, peguei uma porção com a mão em concha e lavei o rosto. Caso Kyle se metesse em confusão e nós tivéssemos de partir, nem mesmo a lembrança do aroma e do som eu teria. Respiro fundo, tentando registrar tudo.

Na verdade, não estou preocupada em organizar as coisas e evacuar... por mim ficaria aqui. Mas tenho que, ao menos, ajudar os demais, eles merecem uma chance. Talvez nem todos, bem que Lacey merecia ser capturada e eliminada como hospedeira problemática.

Há muita agitação nos corredores, pessoas decidindo o que realmente é necessário para o caso de termos que sair. Jeb está preocupado, sentado a uma bancada da cozinha rascunhando em papéis, organizando os grupos e tentando pensar em uma forma de reunir e acomodar todos em um outro possível lugar minúsculo.

– Jared deveria estar aqui... – Ele murmura. Então me dou conta que talvez não haja como esperar até que ele, Peg e Ian retornem. Qual teria sido a reação de Ian?

Continuamos os preparativos e eu dou o melhor de mim para ignorar a presença da gárgula miúda com sua voz estridente, gritando mil e uma exigências sem fazer nada de útil. Cada vez mais parece que a paz se cansou do nosso reduto e resolveu partir sem dar satisfações. A noite chega e traz consigo um alívio: Peg, Ian e Jared estão de volta. Ouço as vozes perto da entrada, mas não me aproximo muito, sinto que ver os olhos de Peregrina possa me tirar a sanidade. No fim das contas eu sinto culpa de pensar assim da minha amiga.

Jeb dispensa a multidão e, de soslaio, vejo que eles trouxeram mais cobaias para extração. Há um momento de indecisão: fazer logo o que tem que ser feito ou continuar os planos de evasão? Acho que optaram pela primeira opção, porque os quatro somem por um bom tempo. Estou indo para o meu quarto no final da noite quando esbarro em Ian.

– E aí garota? Está tudo bem? – Ele me dá um abraço de urso e bagunça meu cabelo. Mesmo que eu seja mais velha que Ian, ainda sou menor e acho que isso inverte os papéis protetores.

Ecos CaleidoscópicosOnde histórias criam vida. Descubra agora