Chovia durante a madrugada. Nosso quarto estava muito escuro, mas ainda enxergava a silhueta rechonchuda do meu irmão deitado em sua cama. Continuávamos nossa conversa já que, por causa da chuva, nosso pai não nos ouvia.
— Você erguendo as águas do mar — repeti o que ele disse sem mudar minha expressão, fingindo que concordava, mas em seguida desmenti: — Impossível! Imagino uma onda te levando enquanto grita por socorro! — ergui os braços para interpretar a cômica e trágica cena enquanto ria.
As pessoas que me conheciam, consideravam-me um rapaz sério, de uma maturidade elevada. Isso só acontecia porque não me viam importunando meu irmão caçula. Eram apenas dois anos de diferença entre nós, mas por ele ser tão introspectivo e geralmente o mais sério entre nós dois, eu sentia a necessidade de azucriná-lo constantemente. Era dessa forma que eu recuperava minha confiança de primogênito.
— Imagine o que preferir. Continuo acreditando que é possível, sim! — Tommy afirmou novamente com a cara amarrada. — Continua rindo apenas por ser um tolo. — Ele se sentou na cama, arregalou os olhos e sorriu de uma forma que me assustou ao falar lentamente cada palavra: — Eu li que dominar um elemento é como treinar um músculo. Quanto mais você exercita a dominação, maior é o seu potencial! Tenho feito alguns exercícios de dominação e tenho percebido resultado.
— Exercícios? — estranhei. — Treinar um músculo? — sorri de canto enquanto arqueava minhas sobrancelhas. — Logo você me dizendo isso? O único músculo que você exercita é o do estômago — caí na gargalhada.
— Pare de zombar de mim, Nathan! — Ele chacoalhou com rigidez uma das mãos. — Preste atenção. Estou falando sério. Isso é muito interessante! Imagine que é você então. Não acha que seria capaz? Não faz sentido? — ao notar minha indiferença ele mudou sua expressão, parecendo querer se vingar. — Por que acha que existem guerreiros agaterianos que dominam um bom volume de água com facilidade, enquanto a dominação máxima de outros é um mísero jato líquido chamado urina?
— Está zombando de mim? — com certeza estava, pois eu era péssimo com dominação de água. Precisei revidar. — Seu porco roliço... Não sabe nem segurar uma arma sem tremer! — encenei uma tremedeira nas mãos, assim como a que Tommy manifestou quando meu pai o obrigou a entrar para o exército.
Tommy lamentou minha resistência quanto ao assunto, esfregou as mãos nas coxas, como fazia quando algo o incomodava e então se deitou novamente virando para o lado da parede.
— Não me importo se não estou dentro da fôrma de nosso pai — respondeu covardemente, escondendo-se atrás de suas costas redondas. — Ao contrário de você, farei o que eu gosto ao invés do que agrada os outros.
Aquela provocação me irritou profundamente, estava eu, Nathan Finddler, soldado do reino de Ágater e primogênito do general Glaustar Finddler tendo minha vida sendo diminuída a palavras proferidas por um comilão inútil, que não fazia ideia do quanto atrapalhava nossas vidas. Perdi qualquer respeito que havia tentado demonstrar ao rapaz desagradecido.
— Você é muito ingrato, Tommy! Fala de nosso pai com tanto descaso. Esquece de tudo o que ele já fez por nós! Acha que é fácil criar dois filhos sem uma mãe? Parece que não se importa nem um pouco com o que ele pensa ou espera de você. Isso é preocupante...
Teria parado por ali se Tommy não fosse tão atrevido:
— Não me importo mesmo — ele retrucou com a voz recheada de rancor. — Enquanto isso você é o fantoche dele.
Inspirei tanto ar para o fundo dos pulmões que os senti arder, mas foi necessário. Se não respirasse fundo, não daria uma resposta à Tommy, daria-lhe um murro em suas bochechas salientes.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Elementos da Guerra - A Maldição dos Kadronis
ФэнтезиNo continente de Bellavarth existiam oito reinos. Cada um havia sido abençoado com a dominação de um elemento, de acordo com seus ancestrais. Apesar desses presentes divinos, esses povos eram assolados, já há muitos séculos, por uma maldição. O ans...