letter two.

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23 de dezembro

Eu passei por aquele portão de embarque com o coração quase saindo pelo boca, na verdade acho que era vontade de vomitar mesmo.

Você sabe o quanto eu odeio aviões, e o nervosismo nem era muito por que estaria embarcando em um vôo que me levaria até você, mas sim porque eu teria que voar para isso. Eu tinha a opção de ir de trem, mas encarar 33 horas de viagem sozinha num negócio que literalmente me faz vomitar não era uma alternativa muito boa, então preferi encarar um vôo curto em que eu poderia controlar meu nervosismo por algumas horas.

Acenei para Ally que ainda me olhava do outro lado do portão e virei a esquerda. Você não deve se lembrar dela, não é? A garota loira e simpática que apareceu uma única vez nos vídeos chamadas que a gente fez nas primeiras semanas na faculdade, consequentemente nas últimas do nosso relacionamento. Com a sua memória curta, sei que dificilmente gravou o rosto dela. Talvez não se lembre ao menos de mim, que dirá de uma pessoa que viu apenas uma vez, de relance.

Esse é o meu maior medo, sabia? Aqui, sentada nesse avião de merda, na segunda classe, com todas essas velhotas me encarando com um ponto de exclamação no rosto pelas minhas lágrimas de ansiedade, o meu maior medo é de você nem mesmo se lembrar de mim. Escrevendo desengonçadamente, com essa letra horrível, e com as lágrimas salgadas me impedindo de visualizar se alguma palavra está errada, meu medo é de que tenha encontrado em qualquer outra coisa o alívio que eu não encontrei sem ter você por perto.

Não sei se está claro o quanto eu amo você, Dinah, e o quanto eu queria que tudo tivesse sido diferente. Mas não foi, e sei que nada sai como planejado. Por isso estou improvisando, eu sou ótima nisso, admito.

Falta pouco mais de duas horas para pousarmos e só consigo pensar em qual vai ser a sua reação ao me ver depois de tantos anos, se será como nos seus filmes idiotas e românticos, e você correrá até mim demonstrando tamanha saudade, ou se a surpresa virá junta com a decepção estampada em sua face. Não sei ao certo, só espero que não seja nada perto da segunda opção.

Lauren e Vero apostaram qual será sua reação quando me ver, na verdade, quando liguei pra elas em chamada de vídeo ontem de noite. Eu precisava avisar alguém além dos meus pais de que estava voltando, e nossas antigas amigas em comum pareceu a opção certa. Vero se surpreendeu quando eu revelei meu principal motivo para manter está viagem de última hora, já Laur riu desengonçadamente enquanto gritava ao ventos que esperou anos pelo dia em que uma de nós acordasse pra vida. No fim, elas me atualizaram de algumas coisas, e eu já sei que você comprou um apartamento novo do outro lado de Nova York, porque fica mais perto da editora onde trabalha atualmente, sei também que está prestes a lançar o seu primeiro romance e admito que fiquei tão curiosa para saber mais sobre sua carreira editorial, quanto a de escritora.

Academicamente falando, sempre tive a certeza que você chegaria a ascensão. E estou torcendo tanto por você, pois sei de todo o seu potencial literário.

Todo esse negócio de carreira me fez lembrar que eu acho até engraçado que pessoas tão opostas quanto nós duas tenham combinado tanto, sabia?! Definitivamente exatas e humanas postas juntas as vezes forma o caos, mas nós duas somamos positividade. Aqui, comparando a diversidade que formamos, fico imaginando o que seria dos nossos filhos se herdassem a sua filosofia de vida e as minhas somas de ideais. A fórmula perfeita do caos e da estabilidade complementando-os. Perfeitamente em ordem.

Hum, se bem que acho que filhos não são uma boa opção por agora. Tem uma garotinha mostrando a língua entre os dentes para mim nesse exato momento, enquanto descasca um chiclete e me desafia a ficar com vontade de come-lo. Patética. Deixei este caderno de lado por alguns instantes, abrindo minha bolsa de mão posta no banco vago ao meu lado e cerrando os dentes para ela, tirando um pacote de balas de goma da mesma e abrindo-o com certa agilidade, enquanto desafiava a pequena menina a ficar com vontade das minhas próprias guloseimas. Ela estreitou os olhos em minha direção, enquanto eu levava uma bala fini até a minha boca e a mesma começou a cutucar a mulher ao seu lado, que eu suponho ser a sua mãe, e apontar em minha direção. Enfiei mais uma bala na boca e guardei o pacote antes que a mulher conseguisse ver que a criança apontava pra mim e dei de ombros, voltando a escrever estás palavras de merda que te farão duvidar da minha maturidade.

Okay, okay, diante do sermão que você provavelmente me daria agora, estou disposta a doar o que restou das minhas balas para a garotinha chata quando o vôo chegar ao seu fim, mas você ao menos tem de prometer que filhos não estão nos seus planos agora, por favor, ainda não estou pronta para ceder a minha imaturidade para dar bons exemplos a uma criança que você provavelmente mimará demais.

Deixando esse assunto que me dá calafrios de lado, tenho que me despedir agora DJ, acho que estamos perto de pousar. Não é possível que eu mal me dei conta que estou a horas tentando escrever algo que preste para ti, rascunhando as incontáveis palavras de merda que não estão mais neste papel. Mas enfim, nos vemos na próxima carta, ou se não na minha próxima visita. Afinal, sendo totalmente honesta, não sei se sou tão corajosa a ponto de chegar ao final dessa jornada, essas cartas me parece tão mais cômodo, confortável e confiável do que qualquer outra coisa, que estou quase desistindo de nos colocar cara a cara!

Bom, sendo ou não o nosso reencontro em carne e osso, espero que você me aceite de volta, ou que pelo menos tenha uma boa vida.

Merry Christmas, Dinah.
Com amor, Normani.

Merry Christmas, Dinah! [CONCLUÍDA]Onde histórias criam vida. Descubra agora