letter three.

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24 e 25 de dezembro

Eu gosto do frio. A neve formando um véu branco sob o chão novaiorquino, o vento gélido batendo contra minha pele e congelando meu rosto descoberto. Minhas botas de inverno afundando na neve profunda. Oh, como eu amo Nova York.

Quer dizer, não tanto naquele momento, enquanto arrastava a mala de rodinhas até o lado de fora do aeroporto, tentando avistar na noite fria de véspera natalina algum táxi desocupado. Para minha sorte, ou má sorte, chame como quiser, encontrei um taxista disposto a me deixar na avenida, visto que era quase noite de natal e quase todos os taxistas haviam optado por não ir trabalhar naquela véspera. O senhorzinho simpático me salvou de dormir por ali mesmo ou ligar para Lauren ir me buscar, importunando-a de passar a ceia tranquila com sua esposa Lucy e suas famílias.

Minha família também estava reunida naquele momento, e apesar de lamentar muito não poder estar com eles agora, eu também não conseguia me sentir culpada por estar correndo atrás de tudo que eu precisava no momento.

Saltei do táxi perto de uma bombonière e perdi alguns minutos olhando os bolos pela vitrine. Tempo demais Dinah, tanto tempo que enfim eu encontrei o que tanto almejava... Você.

Lá estava, com seu amado coturno surrado, a jaqueta de couro que parecia nunca se distanciar da sua pele, e os cabelos desgrenhados, como se houvesse acabado de acordar. Fazia tanto tempo... Tanto tempo que apenas a sua miragem me causou um sorriso instantâneo e um frio bom cruzou com a minha espinha. Pisquei algumas vezes, sem acreditar.

Carregando algumas caixas com a logo da loja de doces, uma feição meio cansada estampava seu rosto, enquanto afirmava algo com a cabeça para... Uma garota. Não qualquer uma, era Zendaya, uma garota da época do colegial, alguém que vivia tentando roubar você para si.

Eu ainda me lembro do olhar de cobiça que ela lançava a você pelos corredores da escola. Eu não me importava, na verdade, porque sabia que independente de qualquer coisa você me amava, e estaria ao meu lado pelo tempo que quisesse, e não era um olhar de desejo que lhe arrastaria para longe. Mas ali, na frente daquela bombonière, vendo ela ao seu lado, meu coração errou algumas batidas e a sensação ruim que me bombardeou me fez girar nos calcanhares e arrastar as malas rapidamente na direção contrária.

Eu senti meu coração se comprimir em cada passo que eu dava, Dinah. Era como se uma avalanche de desespero e ansiedade me corrompesse por inteiro, e sem me dar conta, eu já estava me debulhando em lágrimas. Senti minha garganta secar e o ar me faltar e nada mais focava em meu campo de visão. E tudo o que eu desejava era ter você ali, ao meu lado, como em todas as minhas crises de pânico no passado, para me dizer que tudo ia ficar bem, para me acolher em um abraço carinhoso e me proteger do mundo. Mas não havia ninguém ali por mim, na noite fria de dezembro, só existia o vazio em meio as lojas iluminadas e o caos nova-iorquino, que não parava ao menos para receber o natal em calmaria. Por ali tudo era agitado, infelizmente, meu coração também.

Só me dei conta de que estava sentada, encolhida perto de algumas latas de lixo, quando um estranho com olhar maldoso me jogou 5 dólares. Não consegui me mexer por um tempo, ainda perdida em lágrimas que me sufocavam e em pensamentos que me levavam as lágrimas. Até que algo me fez levantar e agir mecanicamente, sem destino. Faltava pouco para meia-noite, e eu já sentia o espírito natalino que me moveu até aquele solo se afastar de mim.

Eu sempre amei o natal, mas uma chama havia morrido dentro de mim e eu precisava preencher.

Torcendo para encontrar algum táxi disponível, me sentei em um banco perto de um ponto. Olhei as horas no celular e comecei a pensar novamente em como estaríamos naquele momento se não tivéssemos terminado. Oh, Dinah, o que o amor faz com a gente... Nos prende em um passado inevitável e em um futuro superficial. Nos cega da verdade e nos sufoca com os nossos desejos mais profundos e inférteis. Amaldiçoados sejam os que nos criaram para amar de tal forma, e nos desfazermos em pó a cada soco levado no estômago.

Ao fim de toda a imaginação púbere, chego a conclusão de que estou afogando-me em um mar de expectativas espinhentas, que me furarão por inteiro até o final dos meus dias. E estou começando a considerar, Dih... Que não teremos um final digno como nos seus filmes românticos. Talvez não chegue nem perto disso.

Meu coração se comprime a cada vez que eu penso nisso, e mais lágrimas insistem em cair, mas eu acho que já me machuquei tanto que o peso de mais um não ao vivo não vale um coração mais quebrado do que já está. Sei que no fundo sempre haverá uma parte faltando em mim, mas se você já aprendeu a conviver com ela, creio que também sou capaz de me reconstruir sozinha.

Consegui um uber vinte minutos mais tarde, disposto a fazer uma corrida por 200 fucking dólares por um trajeto de 40 minutos. Aceitei por não ter muitas opções.

Agora estou aqui, finalizando mais uma carta que provavelmente vou guardar em uma caixa junto com as outras. Com a garganta seca novamente, bebendo um vinho ruim e em um pranto ardiloso que não consigo conter, encolhida em meio a cobertas que não tem o seu cheiro, escrevo-te está última carta. Como Eu Era Antes de Você está rodando na televisão, e alguém está batendo na porta, é a mamãe, acho que já é meia noite... Todos estão gritando na sala: merry christmas, merry christmas...

No fim, Dinah, a minha noite de natal começou sem você, com um filme triste me afundando ainda mais em dor e com os ecos da felicidade sufocando meus pensamentos. Não é o natal mágico como eu imaginava, mas acho que nem tudo sai como planejado.

E como eu já disse, eu sou ótima em improvisar.

Tenha uma boa vida, e...

Merry Christmas, Dinah.
Com amor – e lágrimas –, Normani.

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😔😔
e não viveram felizes para sempre.

Merry Christmas, Dinah! [CONCLUÍDA]Onde histórias criam vida. Descubra agora