CAPÍTULO 16

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VANESSA
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A primeira semana de trabalho depois do término da minha relação com Elton foi pura tortura. Mas prometi a mim mesma que choraria tudo no domingo e depois seguia em frente. Ele tinha tomado sua decisão , então o mínimo que podia fazer era manter minha dignidade.
Em teoria era fácil , mas no instante que senti o aroma daquele perfume no corredor e soube que ele estava perto, senti meu coração se contrair em meu peito.

“ Vanessa ?!  Está tudo bem?” Neila perguntou vendo meu estado.

Não fiquei nem para lhe responder , saí apressada e entrei em minha sala que felizmente estava vazia. As lágrimas ameaçavam cair e respirei fundo para engolir o choro. A porta abriu atrás de mim e Neila entrou na sala.

“ Vanessa o que se passa?”
“ Nada.” Respondi num sussurro.
“ Não sou distraída. Eu vi como desapareceste ligo que as portas do elevador abriram. Tu e Elton…o que posso fazer para ajudar-te?” Neila perguntou aflita.

Estava a sofrer horrores mas , a  frente do Elton me manteria firme. Eu sobrevivi a um cancro, sobreviveria também a um coração partido.

Toda esta tristeza trouxe de volta as lembranças da batalha que travei . O dia em que senti o nódulo pela primeira vez e a dor que passei a sentir depois que descobri a anomalia em meu seio. Ouvia falar de cancro da mama, mas nunca imaginei que fosse acontecer comigo.
O pânico instalou-se depois que tive os resultados dos exames e a médica disse-me que eram cinco nódulos. Ela tentou tranquilizar-me dizendo que eram benignos e que fui a tempo de evitar que me retirassem todo o seio. Mas eu não conseguia parar de pensar na palavra cancro.
Perdi peso, entrei em depressão e isso só atrasou mais o tratamento.
Quando finalmente a cirurgia foi marcada eu estava debilitada, tive que receber uma transfusão de sangue.  Venci a batalha mas ficaram sequelas, não era mais a mesma depois de passar por aquela experiência amarga.
E quando eu começava a redescobrir a felicidade, tudo foi me arrancado sem dó nem piedade. O destino estava a ser cruel comigo.
Dias passaram e evitava ao máximo andar pelos corredores e felizmente Elton também não fez questão de ver-me. Ficava fechada em minha sala a maior parte do tempo.

“ Vanessa, peço que vás a sala do Elton e tragas os documentos que deixei mais cedo com ele para assinar.” A voz de Luísa me devolveu ao presente.
“  Eu vou.” Neila falou antes que eu pudesse responder.

Luísa estranhou mas não disse uma palavra. Neila saiu apressada e foi a sala do Elton. Ela era a única que sabia do nosso segredo e depois do dia que encontrou-me em lágrimas ela sabia que entre eu e Elton não havia mais nada, só o sabir amargo da separação . Acabei contando para ela tudo que havia acontecido dias depois e ela fazia o possível para minimizar os meus encontros com Elton. Confesso que não estava a espera que ela o fizesse, mas estava grata por isso.
Mas eu sabia que chegaria o dia que nem Neila iria poder salvar-me. Teria que ser forte e fazer de contas que entre nós nunca houve nada além de uma relação profissional.
Felizmente esse dia demorou a chegar , dando mais tempo para preparar meu coração para o reencontro.

O fluxo de trabalho aumentava a cada dia e Elton andava mais insuportável que o seu habitual estado. Começava a sentir pena da Neila que trabalhava mais tempo com ele pois tinha que me substituir sempre que eu tinha que trabalhar com Elton.

“ Vanessa prepare-se. Irás substituir a Ruth na reunião esta tarde. Ela teve uma emergência familiar.” Luísa ordenou enquanto entrava na sala.

Eu e Neila trocamos olhares em silêncio. Respirei fundo e me preparei o melhor que pude.
Entramos na sala de reuniões e organizamos todos os lugares, com canetas, blocos de notas e os documentos que seriam analisados.
Pouco a pouco a sala foi sendo povoada e , quando Elton entrou na sala, senti como se o ar tivesse abandonado meus pulmões.
Vê-lo de longe pelos corredores era diferente de tê-lo há poucos passos. Achei que estivesse a ficar curada, que logo iria esquece-lo, mas estava enganada.  Nada havia mudado, continuava a sentir-me do mesmo jeito, e percebi o quanto tinha saudades dele.
Todos ocuparam os lugares e a reunião começou.  Tentei concentrar-me no meu trabalho, mas por mais de duas vezes nossos olhares cruzaram-se.
Foram duas longas horas fechada naquela sala a lutar contra a vontade de olhar para ele.  A reunião terminou e aos poucos a sala foi sendo desocupada. Eu e Neila arrumávamos o lugar quando ouvimos aquela voz que eu conhecia tão bem.

“ Neila, podes dar-nos um minuto?”

Neila olhou pra mim como se procurasse em meu rosto autorização para deixar-nos a sós.

“ Claro, já ia levar isto para a minha sala.” Neila falou e carregou uma caixa saindo da sala em seguida.

Elton fechou a porta e nos encaramos por alguns segundos.

“ Eu sei que me tens evitado e não te censuro. Acho que faria o mesmo. Mas esta situação não pode se arrastar por mais tempo. Temos que ser profissionais.”

Era fácil para ele ser profissional. Ele decidiu terminar a relação, saiu quando quis , deixando-me sozinha para curar meu coração.

“ Eu sinto muito, Vanessa. “
“ É tudo?” perguntei irritada.
“ Vanessa…” ele falou aproximando-se e eu dei dois passos para trás aumentando a distancia entre nós.

“ O senhor acaba de dizer que temos que ser profissionais. Há mais alguma coisa que queira dizer ou posso continuar com meu trabalho?”
“ Não, é tudo. Só quero acabar com o desconforto entre nós . És uma excelente profissional e eu gostaria de poder trabalhar contigo a vontade.”
“ Claro, é para isso que aqui estou.” Respondi evitando olhar em seus olhos.
“ Vou deixar-te terminar seu trabalho. “ Ele falou e em seguida deu meia volta e saiu da sala.

Mas o aroma do seu perfume já havia inundado a sala e ficou a torturar-me por todo o tempo que fiquei fechada naquele lugar.
Voltei pra minha sala e Neila sorriu ao ver-me entrar.

“ Farei a acta da reunião, não precisas te preocupar.”
“ Obrigada.” Respondi em seguida.
“ É impressão minha ou viraste uma Santa?” Ruth falou olhando para Neila.
“ Santa?? “ Neila perguntou espantada.
“ Sim. Já perdi a conta das vezes que te ofereces para fazer o trabalho da Vanessa. Começo a achar que há algo que eu não saiba.”
“ É mesmo impressão sua.” Neila respondeu sem pestanejar.
“  Hum… “ ela murmurou e levantou caminhando até a minha mesa.
“ Que segredinho as duas partilham? E por que me deixaram de fora?” Ruth sussurrou pra mim olhando fixamente em meus olhos, seu rosto próximo ao meu.

No instante seguinte eu sentia uma náusea forte, como se o almoço estivesse prestes a sair pela boca. Não sei se era do aroma florar do seu perfume, ou do hálito forte de alho que saiu pela sua boca. A verdade é que levantei correndo , com a mão na boca na esperança de chegar aos lavabos antes que o pior acontecesse.

UMA SEGUNDA CHANCEOnde histórias criam vida. Descubra agora