Cena 10

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Personagens: Dora

Dora entra em cena, senta-se na cadeira narrando.

Dora: Na clínica foi tudo muito dificil, a falta das drogas era grande. Lá eu conheci o Edmundo, ele tinha pego AlIDS, usava muita agulha. Percebi como tive sorte, sem tomar nenhuma precaução, não peguei nenhuma doença nem engravidei. Tinha raiva da clínica. O psicólogo de lá falava que sair das drogas era como subir uma escada e que o primeiro passo era admitir que era doente, e que tudo dependia de mim, cada dia era uma vitória. Ele estava certo, mas eu, como sempre, ignorava isso. Quando sai da clínica não sentia falta de fumar ou cheirar, mas sentia falta do Edmundo. Fiquei triste ao ver que a vida de todo mundo tomou rumo e a minha não. Minha mãe me mandou pra passar um tempo na Amazônia com meu pai e a nova mulher, acabei brigando com eles e voltando pra casa alguns dias depois. Procurei Ed, sentia falta dele. Pouco depois de nos encontrarmos ele tirou um pacotinho da meia. Percebi que, no fundo, procurei ele por isso. Eu não tinha drogas em casa, achei que não ia cair numa pior de novo. Em uma semana já tinha voltado ao crack. Tudo foi tão rápido que nem me senti dona de mim mesma.
Voltei ao apartamento de Naldo, me assustei ao ver ele, tão magro, parecia triste. Ed me explicou que Naldo fazia programa, saia com todo tipo de gente. Fiquei com pena dele, mas não disse nada, afinal, eu já tinha feito aquilo, não tinha o direito de julgar. Ed se tornou como um irmão pra mim.
Eu voltei às drogas com mais força que nunca, um dia fui pega usando em casa, foi maior briga, ataquei Paulo com uma tesoura, fui expulsa de casa. Não tinha mais pra onde ir, fui procurar Naldo, descobri que ele tinha sofrido outra overdose. Me vi na rua. Não tinha dinheiro pras pedras e não queria mais sair com caras pra descolar grana.
Mais uma vez, algo mudou o rumo da minha vida. Encontrei Magda. Ela vagava pelas ruas como um zumbi, olhos vagos; nunca vi olhos assim antes. Tive tanta pena, cuidava dela, arrumava o dinheiro, bagulho, comida, decidi que a levaria de volta pra casa, eu salvaria ela, ela ia sair dessa, voltaria para sua vida perfeita de antes. De alguma forma pensar nela me fazia pensar em mim, o que eu faria da minha vida depois disso? Até que um dia ela desapareceu, sem aviso, ouvi dizer que ela entrou num carro com dois caras. Tive medo por ela; nunca mais a vi.
Mais uma vez eu me vi sem ninguém. Pela primeira vez percebi que não queria mais aquela vida, que não suportava mais viver assim. Busquei ajuda: alguém que já tinha me oferecido uma mão amiga um dia, agora eu estava disposta a aceitar.

Vida de Droga - CompletoOnde histórias criam vida. Descubra agora