Capítulo 4 A viagem

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A tempestade talvez tivesse abrandado sobre as águas do mar, mas Camila não viu abrandamento algum em terra firme. Ficou encharcada só de caminhar da casa ao carro, apoiada nas muletas.

Transferir sua enorme mochila à caminhonete de Justin não foi grande trabalho porque Justin ajudou-a.

Depois ele voltou à casa a fim de apanhar as caixas com mantimentos que também foram colocadas na caminhonete. Lauren cuidou de sua própria bagagem.

Rangendo os dentes por causa da dor, ela entrou no carro. Quando todos se acomodaram, Justin grande e Lauren de maneira folgada apertaram-na entre ambos. A viagem até o porto foi um suplício.

Uma vez a bordo no barco de Justin, Camila tinha o corpo todo dolorido. Com os tênis encharcados, a jaqueta e a calça bem molhadas, tremia de frio.

O pesadelo continuava, ela refletia, mas o fim estava próximo. Chegaria na ilha de Dinah ao cair da tarde, e lá ficaria sozinha e em paz. Só a idéia do sossego a mantinha viva.

Com alguma dificuldade o motor do barco começou a funcionar. Camila permaneceu olhando para trás,vendo Spruce Head desaparecer aos poucos, até su- mir sob o nevoeiro.

Ela sonhava com a ilha coberta de pinheirais, acarpetada de musgo, com o aroma de terra úmida, c beijada pelo sol. Enxergava-se ganhando forças nesse paraíso, se recuperando, sentindo seu espírito renascer. Encontraria enfim a serenidade tão procurada?

Lauren também pensava o mesmo. Serenidade... Paz... Solidão voluntária. Logo, dizia a si mesmo, logo. Ela se encolhera num canto do barco para evitar qualquer contato com a passageira. Tivera um longo dia e uma longa noite antes. Afinal, muitas vezes sofrerá de insônias na vida, mas nunca os efeitos haviam sido tão devastadores.

Embora sua fadiga fosse mais física, havia um elemento emocional também. Estava longe do escritório, sem obrigações a cumprir, distante de sua profissão. Mas não eram férias, apenas uma suspensão forçada das atividades. Suspensão breve, talvez, mas não deixava de ser uma decepção. E super deprimente.

A voz da consciência a acusava de estar fugindo. Sua partida súbita de Miami seria vista por todos como deserção, como derrota. Mas talvez... Talvez...

Ela tinha o pulso acelerado como sempre acontecia quando tinha um problema. Estaria com a pressão arterial alta? Não se surpreenderia, dada à tensão nervosa, sua companheira inseparável nos últimos dias. Precisava de uma válvula de escape.

Fitou a mulher ao seu lado.

— Não acha uma loucura viajar desse jeito? — disse ela, olhando para a perna engessada que Camila colocara em cima do banco duro.

Ela estava apreensiva com o sacolejar do barco, pior agora após terem saído do porto.

— Perdão? — Camila fitou-a, atônita.

— Perguntei se não achava loucura viajar nesse estado — Lauren repetiu.

— Foi o que entendi, mas não podia imaginar que você fosse tão rude. Sua mãe não lhe ensinou boas maneiras?

— Oh, sim. Mas ela não está aqui agora, por isso posso dizer o que me vier na cabeça. — De certo modo, Lauren sentiu que podia falar o que quisesse, não tinha mais compromissos e nem emprego.

— Mas você não respondeu à minha pergunta.

— Sua pergunta não merece resposta. — Camila virou o rosto e ficou olhando para Justin que controlava o leme, atento.

Ela balançava o corpo com naturalidade, acompanhando o balanço do barco. Camila gostaria de poder fazer o mesmo, mas não conseguia. Ficou contente por não ter comido recentemente.

Naquela IlhaWhere stories live. Discover now