Um Estranho Encontro

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Os raios do sol de fim de tarde refletiam nos vidros dos modernos prédios, transformando-os em espelhos multicoloridos. Os ruídos dos carros misturavam-se às conversas dos pedestres que cruzavam  a movimentada avenida.

Movendo a câmera de um lado ao outro, eu fotografava incansavelmente, tentando capturar o Instante. A menor fração do tempo era tudo para um fotógrafo; um momento que jamais se repetiria no Universo. Não haveria outro como aquele e, por isso mesmo, era raro e precioso; nele quase podíamos ver a eternidade.

— Cuidado, rapaz! Você está no meio do caminho! — De súbito, alguém gritou.

A voz irada me fez baixar a câmera e olhar para o homem que por pouco não me derrubara com um tranco. Era um senhor idoso, de grossas sobrancelhas brancas e um vinco profundo entre as sobrancelhas. 

Minha primeira reação foi protestar. No entanto, percebi que as pessoas passavam muito rápido ao meu redor, em direção aos pontos de ônibus ou às escadas do metrô. O expediente de trabalho acabara. Todos queriam chegar logo em suas casas, como se fugissem do monstro estranho que eram as tarefas cotidianas. E eu, parado em meio à calçada, era um incômodo obstáculo.

Eu já me afastava, quando notei que o homem de sobrancelhas grossas ainda me observava. O olhar dele, antes irritado, agora era curioso.

Com um meio sorriso, mostrei-lhe a câmera.

— Sou fotógrafo. Frederick é meu nome. Estou fazendo um ensaio para a mostra de fotos de uma galeria de arte  — disse, justificando o fato de que eu era o único na multidão que não estava com pressa.

Ele torceu os lábios com um certo desprezo.

— Fotografia? Prefiro quadros...

— Posso fotografar tudo com minhas lentes. Pessoas, paisagens, a  cidade... E até mesmo emoções.

— Emoções? — O senhor idoso duvidou.

Fiz sinal para que ele me seguisse. Caminhamos até um banco de madeira que ficava ao lado da calçada e nos sentamos.

Mostrei-lhe as fotos que havia tirado. Primeiro as da cidade; fotos de prédios modernos, mas cinzentos. Depois, das pessoas que passavam. Um jovem corria e seus olhos estavam sombreados. Talvez fosse encontrar-se com a namorada, esperando ouvir uma dispensa. Outro tinha a testa cerrada e mordia os lábios. Parecia aflito. Uma briga no trabalho, talvez? Ou não teria ninguém para esperá-lo quando chegasse em casa? Admito, minhas fotos eram meio tristes... O filtro que eu usava era branco e preto. 

O senhor observou as imagens no visor da câmera por um tempo. Por fim, erguendo os olhos, fitou-me muito sério, com as grossas sobrancelhas contraídas.

— São bonitas, mas um tanto melancólicas...

— Acho que espelham como me sinto. Solitário... Um anônimo em meio à cidade grande — admiti.

— Um jovem solitário! — Ele meneou a cabeça como se aquilo fosse lamentável, o que realmente era. — Então, aposto que não conseguirá fotografar o que há de mais importante e bonito no mundo. O Amor.

Eu lhe devolvi um olhar irado e cerrei o cenho. Mostrara meu trabalho e em troca recebia uma crítica disfarçada em desafio.

— O Amor? Como alguém poderia fotografá-lo?— indaguei, sentindo-me ansioso. Descobrira que havia uma enorme falha em minha arte.

O senhor apenas deu de ombros. Eu podia perceber o desprezo no rosto dele.

— Aposto que nunca se apaixonou antes e por isso não pode reconhecer o Amor . Sem ele, a arte não vale de nada.

Levantei-me com um pulo. O que ele dizia era verdade... E por isso mesmo eu estava ainda mais indignado.

— Amanhã cedo nos encontraremos aqui de novo! Então, vou lhe mostrar uma foto do Amor.

O homem sorriu.

— Isso é uma aposta?

— Aposto qualquer coisa! — Eu estava encolerizado.

Ele cravou os olhos nos meus e  ergueu uma sobrancelha branca.

— Até mesmo sua alma, Frederick?

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